Já há fumo branco na Jornada Mundial da Juventude (JMS), pois o Papa foi o primeiro a inscrever-se, dando vários sinais com essa posição. Primeiro, vai continuar no Vaticano, apesar das insistentes notícias de que poderia abdicar devido a problemas de saúde. Depois, confirma a continuação de D. Manuel Clemente como cardeal-patriarca de Lisboa, que deverá anunciar a sua renúncia após a JMS, que termina a 6 de agosto, embora os meios eclesiásticos estejam convencidos que D. Manuel Clemente deverá ficar ainda mais um ano no cargo, por forma a tratar da sua sucessão sem sobressaltos.
«Abrem-se hoje as inscrições para a 37.ª Jornada Mundial da Juventude, que terá lugar em Lisboa em agosto de 2023. Convidei dois jovens portugueses para estarem aqui comigo enquanto também me inscrevo como peregrino. Eu inscrevi-me! Queridos jovens, convido-vos a participar neste encontro no qual, depois de um longo período de distanciamento e isolamento, redescobriremos a alegria do abraço fraterno entre os povos e entre as gerações, do qual temos tanta necessidade», disse o Papa Francisco no passado domingo, na janela do Palácio Apostólico, no Vaticano.
No mesmo dia, o cardeal-patriarca de Lisboa regozijava-se com a inscrição do chefe máximo da Igreja. «O meu apelo é que na sequência desta inscrição que o Papa Francisco acaba de fazer, as pessoas não se atrasem a fazer a sua. A inscrição do Papa Francisco é muito importante, porque agora as jornadas são cada vez mais uma atualidade, e dá início solene à fase de inscrições, que é preciso que corra bem e com uma certa urgência», disse D. Manuel Clemente numa declaração áudio enviada às redações. Como se vê, está tudo na paz do senhor, isto depois da tempestade que levou o cardeal-patriarca ao Vaticano a apresentar a sua renúncia do cargo, após acusações de que teria encoberto padres pedófilos.
Problemas de segurança
Outro pormenor a ter em conta é que o bispo auxiliar de Lisboa, Américo Aguiar – apontado como o provável sucessor de D. Manuel Clemente –, esteve em Roma nos últimos dias, tendo recebido a boa nova do próprio Papa. A JMJ que começa a 1 de agosto e termina a 6 de agosto de 2023, deverá trazer a Portugal cerca de um milhão de jovens e é aqui que começam algumas das preocupações logísticas. O espaço, separado pelo rio Trancão, preocupa as autoridades policiais devido à sua situação geográfica. Encostado ao rio Tejo e ladeado pelas linhas de caminho-de-ferro, além da IC2, não «tem pontos de evacuação em caso de algum alarmismo», como explica um especialista em assuntos de segurança. Já uma fonte policial contactada pelo Nascer do SOL confirma o receio, embora realce que até ao momento «não há, para já, sinais de alerta em relação ao Papa». «O que todos tememos são manifestações de ambientalistas e de grupos contrários que possam provocar algum pânico entre os participantes, dificultando a evacuação do espaço, em caso necessário, que só pode ser feita pelo rio, pela linha de caminhos de ferro ou atravessando a IC2», diz.
«É óbvio que não é o melhor local para se fazer a segurança a um_Papa, pois há zonas elevadas do IC2 que terão se ser controlados, além de que a ponte militar que unirá as duas margens do rio Trancão é um alvo fácil para o caso do Papa ter de ser evacuado», acrescenta.
A enorme operação de segurança que já está em marcha será liderada por Paulo Vizeu Pinheiro, secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, um homem que já foi diretor-geral do Serviço de Informações Estratégicas, de Defesa e Militares (SIEDM) que deu lugar ao Serviço de Informações estratégicas de Defesa (SIED) – caindo os militares na designação –, sendo depois o primeiro civil a liderar a direção-geral de Política de Defesa Nacional, tendo também trabalhado com Durão Barroso. Embaixador de carreira, Vizeu Pinheiro foi dos poucos embaixadores que fez duas ‘comissões’ na Rússia de Putin, como ,lembrava há um ano o DN.
Aquando da sua audição na Parlamento, antes de tomar posse como secretário-geral do SSI, Vizeu Pinheiro foi parco em palavras, mas deixou algumas pistas da sua personalidade. «De olhos bem abertos e ouvidos aguçados para ver, ouvir e depois sugerir e produzir alterações e mudanças», disse na altura, acrescentando: «Depois das informações e da defesa, só me faltava mesmo o terceiro pilar, que é a segurança».
Vizeu Pinheiro sabe perfeitamente que grandes acontecimentos atraem ‘figuras’ indesejáveis, e se na última visita do Papa a Portugal, em maio de 2017, os serviços secretos conseguiram apanhar marroquinos que estavam referenciados como potenciais terroristas que queriam matar Francisco – o SOL chegou mesmo a noticiar ‘Marroquino planeou atentado contra o_Papa em Fátima’, noticiando que «secretas e Polícia identificaram e expulsaram magrebino casada com bombeira de Ourém. Operação de sucesso foi mantida em segredo» – por agora, segundo fonte das secretas, não «há sinais de ameaça evidentes», reforçando a informação de fonte policial.
O mês de todas as festividades
A questão que se coloca a Vizeu Pinheiro e a todas as chefias policiais envolvidas na Jornada Mundial da Juventude é como se vai garantir a segurança do Papa e do mais de um milhão de jovens, sem descurar o resto do país, já que os efetivos policiais não são elásticos. Segundo fonte das secretas, a PSP, responsável pela segurança do encontro, está a ser pressionada para não deixar nenhum operacional tirar folgas ou férias nessa altura. «Nesse mês, há espetáculos musicais, há feiras, há romarias e o Corpo de Intervenção não vai conseguir ir a todos os lados. Certo é que o destacamento de Lisboa não vai sair da capital, e mesmo os GOE terão de estar de prevenção para o grande encontro».
Políticos e sacerdotes unidos
Com a previsível chegada de mais de um milhão de jovens para o evento – há quem fale em um milhão e meio – a organização do encontro já fez várias reuniões, sendo de destacar a do Comité Organizador Local e do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida que aconteceu em Fátima, e onde estiveram presentes, além das entidades eclesiásticas, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, e o presidente da Câmara Municipal de Loures, Ricardo Leão. «Esta sintonia com o poder político é muito favorável à Igreja, pois nos tempos que se vivem é sempre bom constatar que os políticos não fogem dos sacerdotes», ironiza fonte do Patriarcado.
Além das questões religiosas e de segurança, há também o problema urbanístico, embora José Sá Fernandes, o coordenador do grupo de projeto, esteja bastante otimista. «Vão ser as primeiras jornadas que deixarão um legado físico para sempre. São 100 hectares novos para o concelho de Loures e de Lisboa. Vão estar unidos e vai ser muito bom. Vamos servir cento e tal mil pessoas que vivem em Loures e que não têm acesso ao rio e que no futuro poderão ter», disse à Lusa em agosto último. O evento «deixará um legado imbatível», disse ainda.
25 anos depois da Expo-98, a obra ficará completa com as jornadas católicas e abençoadas pelo Papa. É obra.