Por Raquel Paradela Faustino, Jurista e membro da direção nacional do CDS-PP
Ninguém devia sentir condições para se manter num cargo público nas circunstâncias em que Miguel Alves, braço direito de António Costa, se encontrou durante estas semanas. Por um lado, todos nós sabemos que não existe uma acusação quanto ao caso da construção do pavilhão de exposições. Mas por outro lado, não é qualquer pessoa que se coloca sob indícios como estes, tão manifestos, da prática de um crime de corrupção, tal é a aberração dos termos e condições do negócio celebrado pelo Município de Caminha, a que acresce agora a acusação deduzida pela prática do crime de prevaricação no âmbito de outro processo. Como a ex-ministra socialista Alexandra Leitão admite, é «incompreensível» a instabilidade que esta questão ocasionou e nos sujeitou a todos nós, cidadãos portugueses, ao sermos regidos por um Governo que se compadece e tolera este tipo de comportamentos, com uma óbvia quebra de confiança e de autoridade. Mas todos nós sabemos que sim, que é mais do que óbvia a tolerância socialista a este tipo de condutas e que apresenta, inclusivamente, uma certa tendência.
Dizer que situações como estas são do foro pessoal, apresentando-as como justificação para não se colocar em causa os seus mandatos, é, no mínimo, caricato. Face aos contornos concretos do negócio, às partes envolvidas no mesmo e à posição em que Miguel Alves colocou o Município de Caminha, vir dizer que se trata de uma questão de discriminação por ser uma pessoa de uma determinada localidade, é absolutamente anedótico. Não obstante, foi esta a ‘explicação’ dada, sem que o primeiro-ministro tivesse retirado quaisquer consequências, fossem elas quais fossem.
É evidente que se qualquer representante legal de uma empresa privada aprovasse e pagasse um montante tão elevado (recordo que foram €300.000), a título de rendas futuras, sem qualquer garantia para a sociedade sua representada e sem que o objeto contratual se encontrasse, sequer, na esfera da suposta senhoria, seria, de imediato, destituído e responsabilizado.
Quem é que consegue defender que, neste negócio, à luz da informação conhecida, o autarca aparentemente defendeu, com zelo e diligência, o interesse público da sua autarquia? Ninguém consegue. Por isso mesmo, pela responsabilidade inerente às funções que desempenhava, decorrente do mandato que lhe foi conferido pelos munícipes de Caminha, exigia-se uma diligência e uma prudência diferentes, que Miguel Alves, em momento algum, apresentou. Todos os dias em que se manteve e aqueles em que se tivesse mantido no cargo, qualquer decisão que tomou e que viesse a tomar no exercício das suas funções governamentais, suscitaria, sempre, as maiores dúvidas junto de todos nós.
A nossa tolerância zero para este tipo de condutas tem de ser constante, inequívoca e ensurdecedora, para que, mais não seja, quem aceita um cargo público se sinta na obrigação permanente de colocar o interesse do Estado na intenção de cada decisão e esteja sempre ciente da sua sujeição ao escrutínio público.
Deixo uma palavra de admiração aos jornalistas que superam as suas limitações em termos de investigação, dando-nos a conhecer este tipo de expedientes, que se vão multiplicando, e o destino dado aos recursos públicos.