Enquanto mísseis russos caíam por toda a Ucrânia, mais uma vez, matando pelo menos sete pessoas esta quarta-feira, o Governo de Volodymyr Zelensky prometia apostar em mais de quatro mil “centros de invencibilidade” para enfrentar o duro inverno que aí vem. A ideia é criar locais onde a população se possa reunir em segurança, sendo assegurado acesso constante e gratuito a eletricidade, aquecimento, água, wifi e cuidados médicos, mesmo perante sucessivos apagões, que parecem inevitáveis.
A situação da rede energética ucraniana é cada vez mais dramática, tendo sido destruída mais de metade da sua capacidade, explicou o primeiro-ministro Denys Shmyhal. Isto apesar de equipas de reparação estarem a trabalhar febrilmente por todo o país, dado os russos terem atingido praticamente todas as centrais hidroelétricas ou térmicas, assim como boa parte das subestações de transmissão. Obrigando a desligar duas outras centrais nucleares – além da de Zaporínjia, tomada por russos no início da invasão e que tem sido recorrentemente bombardeada – da rede elétrica nacional.
Não foi só a Ucrânia que sofreu apagões devido aos bombardeamentos russos desta quarta-feira, que fizeram soar as sirenes de ataque aéreo de Kharkiv, a Kiev, Odessa ou Lviv. A vizinha Moldávia não foi diretamente atingida mas a sua rede elétrica está ligada à ucraniana, ficando sem luz em metade do país.
No entanto, o Governo de Chisinau não tem grande margem para se queixar ou retaliar perante os abusos do regime de Vladimir Putin. Afinal, os russos contam com cerca de duas mil tropas numa missão de “manutenção da paz” em território moldavo, na região separatista da Transnístria. Além disso, a Gazprom, o gigante estatal que domina as reservas de gás natural russas, já ameaçou cortar o abastecimento à Moldávia, que sempre teve uma profunda dependência energética da Rússia, esta terça-feira.
Talvez ainda mais crucial, ao cortar o gás natural que vai para a Moldávia, a Gazprom também estaria a sugerir que pode fechar os gasodutos que atravessam a Ucrânia. São a principal rota que resta ao gás natural russo para chegar a consumidores europeu – sobra ainda o TurkStream, que, como o nome indica, passa pela Turquia até à Bulgária – e uma das grandes fontes de receita do Governo de Kiev.
Pequenos cortes no abastecimento de gás natural “normalmente levam a grandes cortes”, explicou Kateryna Filippenko, um analista da consultora Wood Mackenzie especializada no mercado energético, à CNN Business. “O risco de que cortem o que atravessa a Ucrânia é muito, muito alto”, avisou, avaliando que espera que as torneiras sejam totalmente fechadas ainda antes do final do ano.
Entretanto, a crise humanitária na Ucrânia agrava-se a cada dia. Tendo o diretor para a Europa da Organização Mundial de Saúde, Hans Kluge, alertando que dez milhões de ucraniano, um quarto da população, estão sem energia numa estação em que as temperaturas deverão descer abaixo dos -20 ºC. “O frio pode matar”, lembrou Kluge, e Putin mostra-se bem consciente de disso. Sendo esse um dos muitos motivos para a Rússia ser declarado um Estado patrocinador do terrorismo pela União Europeia (página 9).