Atualmente investigadora do Observatório Nacional de Violência e Género/CICSNOVA, NOVA FCSH, trabalhou no primeiro inquérito à violência de género em Portugal, em 2007, e tem focado a sua carreira a estudar este fenómeno. Apesar das oscilações dos números apurados, «não tem havido uma descida consistente» deste tipo de violência, que arrasta consigo muito mais do que a violência doméstica. Para que o cenário mude, defende, é preciso mais formação: nos profissionais de primeira linha, claro, mas também nas crianças – porque é por elas que «vem a mudança». Dalila Cerejo, que nos recebe no Colégio Almada Negreiros, deixa claro: «É muito mais caro proteger as vítimas do que prevenir».
Entre 1 de janeiro e 15 de novembro deste ano, 28 mulheres foram assassinadas, 22 das quais no contexto de relações de intimidade, de acordo com os dados da OMA e pela UMAR. São mais cinco do que em 2021. Como olha para estes números?
Existe uma certeza do ponto de vista da leitura dos números: as oscilações não são grandes. Mas de facto não se está a conseguir reduzir drasticamente e, sobretudo, consistentemente, o valor dos feminicídios. Mais importante do que haver mais cinco mulheres assassinadas este ano, a leitura mais valiosa a retirar é que não tem havido uma descida consistente do ponto de vista da violência de género – que não abarca apenas a violência doméstica. É preciso ainda ter em conta que falta adicionar o número de mulheres que sabemos que cometem suicídio como a escapatória final a uma situação de violência doméstica que, em muitos dos casos, tem uma trajetória de anos. Os dados reportam ainda que, na maioria dos casos das mulheres assassinadas, há trajetos passados de violência doméstica e há denúncias anteriores reportadas às autoridades. Nós enquanto sociedade – em particular, o sistema – deixámos escapar, por entrelinhas, a possibilidade de salvar estas mulheres que fizeram denúncias e que foram assassinadas. Mas saber que os feminicídios existem e que, provavelmente, irão sempre existir não deve ser argumento para deixar de acreditar no funcionamento nacional de apoio às vítimas de violência doméstica, porque ele funciona.
Mas há coisas a melhorar.
Temos de aprender com o que correu mal nos casos em que estas mulheres fizeram denúncia e o sistema não foi capaz de as proteger convenientemente. E depois corrigir. Para isto, um instrumento importante é os relatórios da equipa de análise retrospetiva do crime de violência doméstica, que fazem um ótimo trabalho para mostrar o que correu mal.
Grande parte casos de violência doméstica reportados acabam arquivados. O crime de violência doméstica ainda é visto como um crime menor?
Enquanto cientista social não estranho esses números. A violência doméstica é a tipologia de crime mais denunciada de Portugal e não devia ser tratado como um crime menor, porque a sua dimensão é a maior. Penso que por via da exposição mediática que o fenómeno tem tido, por via das campanhas de sensibilização, por via das políticas públicas quem têm sido bastante trabalhadas e robustas em Portugal, por via do trabalho das pessoas na linha da frente, como as forças de segurança, os profissionais de saúde, etc. – enquanto sociedade estamos cada vez mais conscientes de que é um crime cuja denúncia é imperativa. O crime de violência doméstica é um crime público: não são apenas as vítimas que devem reportar. Quando a vítima não o consegue fazer – sabendo a dificuldade de romper o ciclo do medo, da vergonha e da incerteza – é importante que os outros à sua volta o denunciem, porque têm essa obrigatoriedade moral e ética enquanto cidadãos e cidadãs. Ainda há muito para fazer. Ainda é um crime muito silenciado dentro de quatro paredes.
Isso de um ponto de vista mais social. E do ponto de vista jurídico?
Em 2017, nós sabemos que cerca de 85% dos casos de violência doméstica eram arquivados. Nem chegavam a ser julgados. Os 15% restantes dividiam-se entre penas efetivas de prisão e suspensões provisória de processo. Deste ponto de vista, parece ainda haver também trabalho a fazer no que diz respeito à formação dos profissionais de primeira linha – como os polícias – cujo trabalho tem sido fantástico, mas que é preciso melhorar. E é verdade que existe falta de profissionais nas forças policiais. E a formação é essencial para que, no primeiro momento de recolha de depoimento à vítima, a recolha da formação seja o mais robusta possível para poder providenciar ao MP e ao juiz provas suficientes para ajudar na proteção da vítima. Ao decretar a medidas de coação e afastamento, a prova tem de ser de tal forma robusta que lhe permita de facto consolidar perante a mesma que se impõe medidas de afastamento e de coação ao agressor que são as adequadas perante o risco que aquela mulher corre.
Mas acha que existe, de uma forma geral ou num determinado setor, alguma resistência a essa formação?
Não lhe chamaria resistência. E sim algum défice e alguma qualificação do ponto de vista da formação no tratamento deste tipo de crime. A vítima chega num estado de fragilidade muito grande e nem sempre é fácil retirar-lhe informação. Para o fazer, é preciso uma sensibilidade que se adquire através da formação especifica que torne o trabalho cada vez mais eficaz. Por lei, deveria haver em cada esquadra – seja PSP ou GNR – um profissional com formação específica no atendimento à violência doméstica. Sabemos que isso não acontece. Quanto mais formação há em cada agente, no caso da GNR, no atendimento do crime de violência doméstica, maior é a capacidade desses agentes de produzirem prova robusta de que falei há pouco. E quanto mais formação, melhor será o plano de segurança que as forças policias têm em conjunto com o MP e com o juiz de instrução, que a vítima seja protegida. Quando a avaliação de risco fica mal feita, não protegemos a vítima convenientemente. E o momento da denúncia é essencial para colocar a vítima em segurança.
A pandemia não veio ajudar. As vítimas ficaram mais isoladas, os dados agora conhecidos eram de se esperar.
Os dados não nos surpreenderam, porque sabemos que os contextos de violência doméstica, em particular a violência interpessoal de género, são muito marcados pelo controlo coercivo e controlo social que o agressor impinge sobre a vítima, para que fique mais isolada na sua rede social de apoio. E uma vítima cada vez mais isolada e controlada é uma vítima com mais dificuldade em pedir ajuda. Não nos surpreendeu que no período do primeiro confinamento a violência contra as mulheres enquadrada no contexto da violência doméstica não só aumentou em quantidade como em intensidade, quando comparado, por exemplo, com os últimos 12 meses do ano anterior à pandemia. Em casos de crise financeira, em casos de crise sanitária, as mulheres estão muito mais expostas à violência e à violência doméstica. Não é um acaso que nos primeiros cinco meses desde ano – e isto são apenas dados reportados às forças de segurança e, portanto, a ponta do icebergue – houve, em média, 41 queixas de violência doméstica reportadas. Infelizmente, são ainda uma minoria as mulheres que rompem o ciclo de violência e que conseguem denunciar.
Disse recentemente que a causa, ou uma das causas, para a violência de género tem que ver com modelos de masculinidade e com as assimetrias de poder entre homens e mulheres. Quando falamos desses modelos de masculinidade, estamos a falar do quê?
Em 1995, fizemos um inquérito de violência contra as mulheres – o primeiro. E em 2007 fizemos um outro – a homens e a mulheres – sobre a violência de género e percebemos que as características de vitimização sofrida pelos homens e pelas mulheres são substancialmente diferentes. Enquanto os homens são vítimas maioritariamente de outros homens: de amigos, colegas de trabalho ou desconhecidos, vítimas nos espaços públicos, nas ruas – as mulheres são vítimas de outros homens e, na sua grande maioria, companheiros, maridos e namorados, atuais ou passados, e no espaço da casa. Concluímos que uma das ferramentas usadas nestes ditos modelos de masculinidade é precisamente a violência.
E quais são as principais características dos agressores? Quais são esses modelos de masculinidade?
Ao contrário de que às vezes se possa querer passar, de que há questões de personalidade, ou de saúde mental, havendo uma ‘psicologização’ do agressor – o que na verdade se observa é que o agressor clássico de violência doméstica a pratica fundamentalmente em casa, ou seja, a dimensão do poder e onde ele se sente empoderado é no espaço da casa. Retirando esse predomínio da casa, raramente a ferramenta da violência é utilizada, porque a dimensão do poder já não é assim tão assimétrica como é em casa. É ainda um agressor que tende a desvalorizar o tipo de violência que pratica – e digo isto baseado naquilo que tem sido o meu trabalho com os agressores – e algumas das vezes até a negação, em casos em que há a suspensão provisória do processo e em que os agressores estão a frequentar o programa de intervenção para agressores de violência doméstica. E, mesmo nesse contexto, tendo-se dado como culpados, entram numa fase de negação e de desculpabilização e até de menorização do ato de violência para com a vítima. Uma outra característica: se perguntar às vítimas porque é que acham que o homem realizou aquele tipo de atos, elas – na sua grande maioria – dizem que tem a ver com as questões do sentimento de posse e do ciúme.
Esse sentimento de posse do homem para com a mulher manifesta-se em atitudes do dia a dia?
Sim. E muito cedo numa relação. Aliás, é um preditor importante do que pode vir a ser uma potencial relação violenta: o ciúme que se começa a manifestar relativamente cedo numa relação íntima, e que no início as vítimas até diziam que ‘sabia bem’, porque era visto como uma atitude de lisonjeio, começa a ser cada vez mais frequente e patológico. O ciúme – esse sentimento de posse – começa a ser usado como um pretexto para justificar a ação. É importante perceber que este sentimento de posse com que se vivem a relações íntimas também é importante começar a ser desconstruído. Se olhar para os últimos dados da violência no namoro, dos jovens a partir dos 15 anos, percebemos a facilidade com que naturalizam alguns comportamentos que têm que ver com esse sentimento de posse – e os estudos indicam mesmo isso. É preocupante, porque estamos talvez a assistir a novas vítimas e a novos agressores.
A naturalização desse tipo de comportamentos vem de onde? De casa?
Hoje em dia não podemos falar de uma socialização primária que seja unicamente construída em casa, isso já não existe. Portugal continua a ser uma sociedade marcadamente patriarcal, basta olharmos para os dados do gender gap pay, da divisão das tarefas domésticas, da dificuldade de as mulheres ascenderem às posições de topo – quer seja na política quer seja nas grandes empresas. Continuamos a ter forte indicadores de uma sociedade desigual em termos de género. E estes modelos desiguais perpassam e não é apenas na família.
Na escola, por exemplo?
Claro. E nós temos, por exemplo, os manuais para a Educação para a Cidadania, e esta disciplina não é só educação para a igualdade de género – que também é fundamental. Trata-se da educação para a tolerância, para a liberdade da autodeterminação sexual e identitária de género e, sobretudo, para os valores de uma sociedade democrática e igualitária. Trata de uma série de questões associadas aos direitos humanos, à liberdade dos cidadãos e cidadãs. E o exercício da democracia faz-se pela igualdade em várias dimensões. Infelizmente, às vezes num discurso simplista, e até bacoco, fala-se da ideologia de género.
Antes disso, queria perguntar se acha que todas essas temáticas são bem ensinadas. Há falta de professores, de formações…
O que também sabemos é que por vezes as escolas, muito pressionadas para cumprirem os programas escolares, veem-se com dificuldades em trabalhar mais a fundo a desconstrução destes modelos de género. Repare: nós podemos investir na proteção das vítimas – e temo-lo feito com muito trabalho, formação e muito dinheiro investido. Mas quando agimos, já o crime se deu. E o fundamental é na intervenção precoce. E acredite: é muito mais caro proteger do que prevenir. Proteger implica custos para a proteção da vítima, os polícias, os tribunais, as ONGs, o SNS, a casa abrigo, a formação… E temos trabalhos que conseguem quantificar esse tipo de custos – proteger fica muito mais caro à sociedade como um todo do que prevenir um potencial crime de violência doméstica.
Como olha para a obrigatoriedade da disciplina de Educação para a Cidadania? E a falta de formação dos docentes?
Sem dúvida que acho que devem ser profissionais com formação específica e com conhecimento no nosso quadro legislativo, legal. É importante explicar aos jovens, e aos docentes que estão diante deles, que a violência no namoro é um crime. E se calhar a maior parte dos jovens não o sabe. Se calhar muitos deles não sabem que a diferença salarial entre homens e mulheres é de cerca de 300 euros. Tudo isto é um empoderamento para eles – têm acesso a este conhecido e a esta informação e ficam sensibilizados para a existência das desigualdades e como é que elas se concretizam. É muito fácil falar que isto retira tempo às crianças, aos alunos, e que é ideologia. Mas não. O que isto faz é dar conhecimento aos jovens da sociedade em que vivem. E dar estas temáticas empodera as crianças para que elas rumam à mudança, porque é uma mudança com esta rutura ainda muito patriarcal que temos na sociedade portuguesa que temos de fazer. E essa mudança vem dos jovens. Quanto melhor os docentes conseguirem explicar o mundo no qual estão inseridos, as lógicas desiguais de género em que vivem e as lógicas de intolerância que continua a haver, melhor será a sua capacidade de intervenção no mundo.
E o que é a ideologia de género?
Não sei bem o que é. Também não sei se há algum artigo científico em que as pessoas que se dizem contra a ideologia de género possam explicar o que é. Não nos podemos esquecer do que está enquadrado na nossa legislação. O direito à autodeterminação – nomeadamente de género e sexual é, de facto, um direito. É um direito da comunidade LGBTQIA+ e não só. É um direito à liberdade de cada um de nós e é um avanço civilizacional. Tudo o que seja retirar direitos conquistados para as mulheres – como recentemente a IVG nos EUA, e não é um fenómeno só deles, aliás, a Polónia é um bom exemplo disso – é, na minha opinião, um retrocesso civilizacional com impacto.
Os programas de intervenção com os agressores são importantes para tentar combater estas assimetrias? E têm impactos positivos?
Não sei se têm impactos positivos ou não. Não posso falar quando a sua eficácia porque conhecemos, efetivamente, pouco daquilo que é uma avaliação qualitativa do fenómeno. O que eu sei é que eles são fundamentais. Não é importante saber, dos agressores que estão a frequentar o programa, aqueles que o terminam com o sucesso, ou seja, cumprem os 18 meses a que são obrigados e depois ficam libertados da obrigação de qualquer outro compromisso legal. Uma mera quantificação de quantos agressores entram no programa e quantos é que saem cumprido os 18 meses é insuficiente.
O que é preciso perceber?
Dos que saem, depois de cumprido os 18 meses, quais são os que reincidem e os que não reincidem. Prende-se com a necessidade de haver projetos qualitativos de acompanhamento da reincidência, porque a violência doméstica é um dos crimes com mais taxa de incidência. É importante perceber se quem reincide o faz porque não esteve no programa ou porque apesar de ter lá estado voltou a cometer o mesmo crime. O processo visa quebrar a possibilidade de reincidência, e é isso que nós são sabemos na maior parte dos casos. É importante perceber as fraquezas para cada vez mais ter programas de integração eficazes – que previnam a reincidência.
E quais são as fraquezas que aponta? Considera 18 meses pouco tempo?
Não tem necessariamente a ver com os 18 meses. Os programas foram testados e estão em implementação há algum tempo e tenho a certeza quem os coordena tem essa sensibilidade para ir enquadrando medidas. Falo mais com mais propriedade do programa PAVD (Programa para Agressores de Violência Doméstica) que é o que conheço melhor, que tem cerca de 20 sessões e cada sessão de duas horas equivale a um modulo específico com uma temática que se trabalha com o agressor, como o controlo de impulsividade, por exemplo. Um desses módulos é sobre a desconstrução dos modelos de valor de género. Nós sabemos de estudos nacionais e internacionais que a maioria dos agressores não tem distúrbios de personalidade. Como eu já referi, na maioria são agressores cuja única questão são valores de masculinidade exacerbada. E olham para a violência como um direito. É manifestamente pouco trabalhar com os agressores uma sessão de duas horas desconstruindo os estereótipos de género.
Como é que se faz essa desconstrução?
É um trabalho mais psicológico, portanto não sou a melhor pessoa para lhe falar disso. O que posso dizer é que numa personalidade adulta, nós estamos carregados de estereótipos. Temos a nossa forma de ver o mundo. E dependentemente na nossa maior ou menor flexibilidade, temos essas crenças e esses modelos muito enraizados. E o trabalho de desconstrução dessas lógicas e desses estereótipos de género não é fácil, daí a urgência de aumentar o tempo de trabalho nesta temática com os agressores.
O que conclui com o trabalho de campo que fez?
Os agressores têm uma perspetiva de desvalorização da violência que exerceram. Percebi que o agressor típico ‘vacila’ um pouco mais é quando se fala nos filhos. E é bom não esquecer, também com base na ciência, que na grande maioria dos casos os filhos são vítimas diretas da violência doméstica, tanto que os filhos têm um estatuto de vítima autónoma. E além da desconstrução género, é importante trabalhar uma lógica relacional, íntima, muito baseada numa ideia de controlo. Uma expressão que eu ouvia muito era: ‘Eu não queria agredir, mas de facto ela não fazia aquilo que eu queria’. Há uma estrutura mental no agressor que desenha um determinado código de conduta, um referencial moral e um modelo de feminilidade, idealizado na sua parceira, e o seu modelo de masculinidade. E quando eles entram em conflito, ou seja, quando a parceira não respeita estes modelos de género feminino idealizados, é visto para o agressor como um desrespeito à sua autoridade, acabando a agir com o uso da violência.
E esta violência pode assumir outras formas que não a violência física?
Vai das coisas mais pequenas que possa imaginar. Que maquilhagem podem ou não usar, como é que têm de ter o cabelo, como é que se podem vestir. Às vezes até uma troca de olhares na rua pode ser muito problemático. Isto é a forma que se manifesta o poder e o controlo coercivo dos agressores. Há o controlo, depois há a fase da acumulação de tensão manifestada no exercício da violência, usa-se a violência e depois há a fase da chamada ‘lua de mel’ – o pedido de desculpa, onde muitas das vezes as vítimas voltam para o agressor. E a roda gira assim.
As diferenças entre sexo e género têm alguma importância na própria desconstrução dos modelos de masculinidade a trabalhar com os agressores?
Acho que é fundamental as pessoas saberem diferenciar o sexo e o género. Embora o sexo seja dado, à partida, biologicamente, o género é de facto uma construção social. Somos nós enquanto sociedade que definimos o que é o masculino e o que é o feminino. O que significa ser mulher utilizando um determinado referencial de feminilidade e o que significa ser homem utilizando um determinado referencial de masculinidade. É na desconstrução de valores, modelos e crenças que diariamente construímos o género que assenta, também, a chave para conseguir desconstruir os estereótipos. Há coisas tão ínfimas que não pensamos e não valorizamos e que também fazem o género, como as emoções. Sem dúvida que os modelos de género também se fazem a partir de uma conduta emocional muito especifica e muito díspar em homens de mulheres.
Como por exemplo a ideia de que o homem não chora?
Claro. O chorar é visto como um sinal de fragilidade. A ideia de que o homem não pode ser frágil ou vulnerável. Por vezes podemos pensar que as emoções são naturais, mas grande parte do espetro emocional é socialmente construído. E essa construção também é diferente na socialização dos rapazes e das raparigas. E muito daquilo que é desassociar os rapazes das emoções funciona quase sempre contra eles.
E desassociar os homens das emoções pode criar um barril de pólvora no futuro? Tornando-os possíveis agressores?
Quanto à sua analogia, não lhe sei responder. O que eu sei é que num mundo em que cada vez mais se realiza as questões da inteligência emocional, a grande ferramenta que se pode dar a todos é a de viverem as suas emoções de uma forma saudável: vivê-las. Vivemos numa cultura em que parece que não fica bem sentir, falar de nós ou pedir ajuda. E isto é também parte do que não é saudável nas nossas sociedades. O pior que podemos fazer é passar às crianças a ideia de que é errado sentir. Quanto mais dificuldade temos em gerir a nossas emoções, mais propensos estamos a usar determinados escapes, como a violência.