Os choramingas do costume

O próprio comentador da Belém TV, numa das suas muitas irritantes palestras diárias com que insiste em nos massacrar, veio a público acusar o país em causa de não respeitar os direitos humanos, sem precisar em que áreas é que estes são violados.

Já se passaram doze anos desde que o Qatar foi escolhido para organizar o mundial de futebol, cuja fase final decorre neste momento e da qual já fomos arredados por causa de uma espécie de réplica de Alcácer Quibir.

Durante todo este tempo, não se ouviu uma única voz de protesto pelo facto da organização desta competição ter sido entregue àquele país, nem na altura ninguém se lembrou de questionar  a razão pela qual se oferecia tamanha responsabilidade a um Estado que, alegadamente, não respeita os direitos humanos.

Foi preciso chegarmos às vésperas do início deste evento desportivo para se gerar um coro de lamúrias à escala global, arremessando-se todo o tipo de acusações contra aquela nação árabe, principalmente a de não respeitar os trabalhadores estrangeiros, as mulheres e os homossexuais.

Alegou-se, também, uma suposta existência de escravatura e lançou-se para o ar a ideia absurda de que, durante a construção dos diversos estádios, terão perecido 6500 trabalhadores provenientes dos países asiáticos mais pobres, sentenciando-se que estes estavam reduzidos quase à condição de escravos!

Por cá não se fugiu à regra e de quase todos os quadrantes sairam da toca os habituais choramingas, que vieram apelar a um boicote à presença de autoridades portuguesas no Qatar.

O próprio comentador da Belém TV, numa das suas muitas irritantes palestras diárias com que insiste em nos massacrar, veio a público acusar o país em causa de não respeitar os direitos humanos, sem precisar em que áreas é que estes são violados.

Esqueceu-se, ou fez-se esquecido, de que sempre tivemos relações muito cordiais com o Qatar, onde está presente uma significativa comunidade portuguesa, bem integrada junto dos locais, gerando, com essas irreflectidas palavras, um incidente diplomático que poderá ter proporções bem gravosas para os nossos que lá vivem e trabalham.

Marcelo, igualmente não se recordou de que quem tem telhados de vidro em casa, não deve atirar pedras para o quintal do vizinho!

Isto porque enquanto ele se entretinha a lançar farpas aos qataris, as autoridades portuguesas procuravam desmantelar uma rede de tráfico humano, que há muitos anos actua impunemente em solo pátrio e cujos tentáculos se estendem aos países da Ásia Central, cujo propósito tem sido o de canalizar mão-de-obra barata para laboras que não encontram receptividade junto do mercado de trabalho nacional.

Portugal tem ido buscar trabalhadores aos mesmos países que os têm exportado para a construção civil no Qatar, com a grande diferença de que neste país recebem chorudos ordenados e dispõem de alojamentos condignos, enquanto que por cá, a grande maioria vive em condições desumanas, conforme o comprovam diversas reportagens televisivas a que todos assistimos, e grande parte do parco salário que auferem vai parar aos bolsos das mafias que os traficam!

E o mesmo se passa um pouco por toda a Europa dita civilizada, que agora se insinua horrorizada com as condições de trabalho destinadas aos imigrantes no Qatar, mas que recorre ao mesmo expediente que se tornou moda dentro das nossas fronteiras, e pelos mesmos motivos, ou seja, porque ninguém se candidata aos ofícios que acabam por ficar abertos à imigração.

Um jornal britânico, o The Guardian, fez um trabalho de investigação junto das embaixadas dos países que têm naturais seus a viver no Qatar e concluiu que nos últimos dez anos terão morrido cerca de 6500 desses imigrantes em solo qatari.

Mas essas mortes foram provocadas por inúmeras razões, e não apenas na construção dos ditos estádios, nomeadamente em acidentes de trabalho verificados em obras diversas, por doenças, em acidentes de viação, em consequência de actos violentos e por causas naturais, entre muitas outras.

No entanto, uma seita qualquer lembrou-se de deturpar esses dados e veicular a acusação de que todos eles terão perdido a vida nas obras destinadas a acolher o mundial, não tendo ninguém se dado ao trabalho de questionar a veracidade dessa infundada notícia, tomando-a como certa.

Eis como uma mentira é assumida, pela generalidade de gentes supostamente cultas, como uma verdade!

A choradeira assentou arraiais igualmente na alegada violação dos direitos das mulheres, as quais, segundo os inquisidores, parecem sofrer mais no Qatar de que em qualquer outro lugar da terra!

Acontece que aquele país é, de entre as restantes nações árabes, talvez aquele no qual as mulheres estão mais ocidentalizadas, estando mesmo o véu restringido a quem, voluntariamente, dele não quer prescindir.

Há uma subalternização da mulher perante o homem, certamente que sim, mas essa é a prática comum no mundo muçulmano, o qual, goste-se ou não, e para mal dos nossos pecados, num futuro próximo tenderá a ultrapassar, em número de crentes, aqueles que se inspiram no cristianismo para nortear o seu modo de vida.

E o desrespeito pelo papel das mulheres na sociedade não se observa apenas no interior dos países que abraçaram o islamismo, mas também em todos quantos acolheram imigrantes vindos daquelas paragens, incluindo Portugal, sem que os habituais movimentos vanguardistas das causas fracturantes alguma vez se tenham insurgido contra esse estado de coisas.

Finalmente, a questão dos homossexuais, hoje tão na moda e que esteve na linha da frente nos apelos ao boicote do mundial que está prestes a chegar ao fim.

A lei daquele país criminaliza a homossexualidade, acredito que sim. Confesso que não me dei ao trabalho de vasculhar a legislação penal do Qatar para poder confirmar as minhas suspeitas, mas não tenho dúvidas de que essa é a realidade de todos os países muçulmanos, não só os asiáticos, mas também os existentes em todos os outros quadrantes do planeta.

No entanto, não consta que no Qatar essa lei seja aplicada de forma mais impiedosa do que noutros lados, bem pelo contrário, por lá não são conhecidos casos, devidamente autenticados, de notória perseguição judicial em função da orientação sexual.

Sempre nos habituámos a uma separação efectiva entre a política e o desporto. As competições desportivas, incluindo as de grande dimensão, como são as principais ligas de futebol, tiveram como princípio a abrangência, realizando-se em todos os países, independentemente das diferenças ideológicas, sociais, culturais e religiosas que os separam.

Há quatro anos o mundial de futebol foi na Rússia, país onde os direitos humanos, já na altura, estavam fortemente condicionados, e não se ouviu qualquer tipo de contestação.

Em 2008 os Jogos Olímpicos desenrolaram-se na China, onde o respeito pela dignidade humana não passa de uma miragem, e ninguém se lembrou de invocar o direito ao boicote.

Daí ser absolutamente incompreensível todo este frenesim gerado à volta de um país que, não sendo um modelo de exemplo, é, apesar de tudo, bem menos repressivo do que os outros dois acima mencionados, e que se caracteriza, sobretudo, por dotar o seu povo de uma qualidade de vida que nos deveria deixar a nós, europeus, roídos de inveja!   

A população, no ocidente, tende a constituir-se num único rebanho, submisso e pronto a obedecer à voz do pastor.

Só que o pastor é a esquerda libertária, com o suporte do seu principal braço armado, o lóbi LGTB, a quem, gradualmente, têm sido construídos os alicerces da obrigatoriedade de se lhes prestar vassalagem, mal-grado não passarem de uma escassíssima minoria de entre todos os que habitam neste planeta, e a consequente repressão sobre todos quantos se recusam a baixar os braços perante este novo tipo de tirania.

Assim se compreende toda esta cruzada encetada contra o Qatar!

 

Nota:

Das minhas palavras não se pode concluir que estou de acordo com as passeatas de alguns dos nossos governantes ao Qatar, para nos representarem nos jogos em que a selecção nacional se empenhou. Muito pelo contrário, apesar de ser por razões diversas daquelas que foram invocadas pela generalidade dos que a isso se opuseram, entendo como escandaloso, sobretudo atendendo à grave situação financeira que o país atravessa e às consequentes dificuldades económicas com que os portugueses se afligem, que parte da nossa classe política se tenha permitido viajar às nossas custas, ainda por cima recorrendo a um avião fretado propositadamente para o efeito.

Se os nossos políticos querem ir ao futebol, pois que vão, mas que paguem dos seus bolsos as respectivas viagens e estadias, como o faz o comum do cidadão!

O que se passou foi uma vergonha, absolutamente indesculpável!

A única consolação do afastamento precoce da equipa de todos nós, foi a de que se pouparam uns milhares de euros ao contribuinte.

 

Pedro Ochôa