Por João Sena
O regresso dos jogadores aos clubes após a realização do Mundial no Qatar foi feita a conta-gotas, com o que isso representa para o trabalho dos treinadores e preparadores físicos. O facto de nunca ter havido uma pausa tão prolongada a meio de uma época levanta uma série de dúvidas sobre a melhor forma de recuperar os internacionais depois de concluída a competição. Na prática, os clubes vão ter de fazer uma segunda pré-época, embora mais curta, e isso pode transformar as equipas e trazer algumas surpresas à primeira liga.
Além de ser necessário fazer uma gestão do plantel muito cuidada, há outro aspeto importante que é a mudança do método de treino e do sistema de jogo a meio da época, o que pode influenciar o rendimento dos atletas. Desde julho que o mind set dos jogadores estava trabalhado para treinar e jogar de uma determinada forma no seu clube; em novembro tiveram de se adaptar a outra realidade na seleção e em dezembro volta tudo ao normal com a exigência máxima dos treinadores, pois há objetivos a cumprir a nível interno e nas competições europeias.
É muito estranha a correria que os jogadores tiverem de fazer no último mês e meio, além de ser prejudicial em termos físicos. A sobrecarga de jogos e o pouco tempo de descanso que os jogadores tiveram entre o fim do Mundial e o regresso aos clubes aumenta o risco de lesões, sobretudo musculares. Naturalmente que é um privilégio para qualquer clube entrar em campo com dois campeões do mundo, como acontece com o Benfica (Enzo Fernández e Nicolás Otamendi), mas isso significa que os argentinos só começaram a treinar dois dias antes do importante jogo para o campeonato frente ao Braga. O presidente do Sindicato do Jogadores, Joaquim Evangelista, considera que “é desumano o esforço que exigem aos jogadores. É impossível acompanharem este ritmo, têm de ter descanso sob pena de entrarem em burnout”.
Cinco clubes portugueses cederam jogadores a várias seleções, a saber: Benfica e FC Porto (6), Sporting (4), Braga (2) e Chaves (1). Esse facto obrigou os treinadores a fazer um planeamento específico para cada jogador de acordo com as condições físicas em que chegaram aos clubes e também anímicas. No caso de Portugal, tudo o que aconteceu à volta da seleção não deve ter deixado muita gente feliz.
Enquanto os internacionais jogavam o Mundial, os restantes jogadores disputavam a fase de grupos de Taça da Liga, alguns jogos amigáveis com equipas claramente inferiores ou, pura e simplesmente, estavam de férias. Até que ponto isso foi positivo é o que vamos saber nas próximas semanas. A maioria dos jogadores gostam das grandes competições e de jogos a doer, e o que se passou nestas seis semanas foi tudo menos isso. Vai ser preciso voltar a elevar os níveis de motivação de cada plantel.
Sobre os efeitos do Mundial a meio da época, o treinador campeão nacional pelo FC Porto admitiu que “ninguém tem certeza de nada em relação à paragem do campeonato. Não podemos adivinhar se foi benéfico ou prejudicial, mas para o Porto houve um aspeto negativo que foi ter um ou outro jogador lesionado e com uma percentagem de massa gorda acima daquilo que eu permito. Tivemos de recuperar esses jogadores para que ficassem na forma ideal. Essa análise vamos fazê-la no final da época, parece-me mais justo”, disse Sérgio Conceição. O treinador do Benfica, Roger Schmidt, não gostou da paragem “ninguém ficou satisfeito com o facto de o Mundial ser a meio da época. Agora, temos que nos focar nos restantes jogos”, disse. Curiosamente, Rúben Amorim desvalorizou a interrupção no campeonato: “Houve uma paragem, mas para nós não foi paragem porque tínhamos a Taça da Liga para disputar. Aproveitámos para trabalhar e melhorar a equipa, e lançámos miúdos que vão ser o futuro do Sporting”, afirmou.