Clássico. Na capital jogo capital

Este domingo, em Alvalade (18h00) enquanto o Benfica descansa (já jogou a jornada 20) o FC Porto apresenta-se favorito face ao Sporting.

Com o Benfica envolto em lutas intestinas que o fizeram desistir de lutar por títulos nos últimos três anos e com o atrevimento do Sporting em ser campeão nacional pela mão do jovem Rúben Amorim, o habitual discurso regionalista vomitado pela propaganda do FC Porto há tantas dezenas de anos que já cheira a mofo e está a precisar urgentemente de ser tratado à base já não de naftalina mas sim de nitrato de prata virou os canhões para os lados de Alvalade. Não deixa de ser curioso que seja Sérgio Conceição a levantar o facho da diferenciação nortenha, logo ele que nasceu e se fez rapaz em Coimbra que pode ser a norte de Lisboa mas é seguramente a sul do Douro e não se pode dizer que seja uma das capitais do norte, apesar de ter sido uma das capitais de Portugal. Enfim, cada um absorve os idealismos que lhe transmitem com a voracidade que bem entende, mas para mim não deixa de ser estranho que profissionais de um ofício como o futebol, que tanto os faz trabalhar um dia em Santiago de Riba Ul como no dia seguinte no sopé das Montanhas do Pamir se disponham a fechar portas a novos compromissos com tal facilidade. Claro que, por outro lado, este desporto que apaixona o mundo, é volátil demais para se prender a atitudes e a discursos de ocasião, mas a verdade é que, hoje em dia, nenhum de nós com dois dedos de testa, prevê que num futuro próximo Sérgio Conceição venha a ser treinador do Sporting ou do Benfica embora tenha demonstrado até ao momento ter capacidade mais do que suficiente para isso. As suas tiradas fecham-lhe portas que deveria manter abertas, mas claro que esse é um assunto que lhe toca a ele e não a mim. Limito-me a sublinhar que estas tiradas sobre a azia que as vitória do FC Porto provocam no resto do país, imagino de de Duas Igrejas às Fajãs debaixo, como se o FC Porto tivesse o direito e arvorar como representante de toda uma região na qual abundam benfiquistas, sportinguistas, belenenses além de adeptos de clubes tão históricos como Boavista, Braga, Guimarães e por aí fora vem dos tempos tristes de uma figura adorada na Invicta, José Maria Pedroto, que merece a consideração de muitas pessoas pela quais tenho o maior respeito mas que não tem um pingo da minha desde que resolveu numa frase de baixeza sórdida meter na mesma linha preto e palhaço referindo-se ao na altura selecionador nacional, Mário Wilson – esse sim um Senhor com maiúsculas, um dos homens mais livres, mais cavalheiros e mais bondosos que tive o orgulho de conhecer – provocando com isso um dos momentos mais deprimente da centenária história da Seleção Nacional quando o comboio em que os seus membros seguiam para um jogo particular em Vigo foi selvaticamente apedrejados na Campanhã. O futebol é de há muito um pasto para a guerra que geralmente começa por tentar ser psicológica e depois se espalha pelas bancadas e pelas ruas. Por isso convém ter memória e, como disse um dia Iva Delgado, a filha do_General Sem Medo, «a memória nunca prescreve».

 

Naturalmente favorito

Vem portanto o FC Porto a Alvalade neste domingo com os dentes cerrados e certo de que uma vitória é fundamental para não deixar o Benfica (que já disputou e venceu a sua partida desta jornada n.º 20) a oito pontos de distância. E, assim sendo, a batalha das frase brutas já está no ar há dias a fio. Ninguém poderá dizer que a equipa de Sérgio Conceição não é a grande favorita, não só porque é mais forte, mais estruturada, tem um jogo mais agressivo e jogado com mais intensidade e, fundamentalmente, tem melhores jogadores. Infelizmente, os últimos jogos entre Sporting e FC Porto têm sido pasto para momentos de agressividade extrema, para não dizer de verdadeira violência, e de desagradável ordinarice. Foi assim que quis José Maria Pedroto, o sacrossanto treinador por cuja pessoa, desculpem lá, ainda por cima num país em que todos os homens mortos são homens bons, nunca tive o mínimo de apreço e cujo pacote de resultados apresentado no final da sua carreira com treinador acabaram por ficar muito mas mesmo muito abaixo da sua fama, sobretudo no tempo em que passou como selecionador nacional, tratando Eusébio com um desrespeito insuportável – ele gostava de dizer, para irritar os benfiquistas, que o melhor jogador português de sempre tinha sido o meu conterrâneo Hernâni. o Furacão de Águeda – e ficando famoso como o selecionador que só ganhava ao Chipre e foi a Londres empatar com uma equipa de anões. E se foi assim que ele quis, os seus seguidores, mesmo passados quase cinquenta anos, continuam a venerar a sua palavra.

Eis como, nas vésperas de mais um clássico, que para o Sporting terá, quanto muito, o suporte da defesa de um orgulho esta época bastante espezinhado tal a correnteza de objetivos desperdiçados, podemos perspetivar que vamos estar perante um desafio muito mais lutado do que jogado, à imagem do último, em Leiria, que terminou com uma vitória indiscutível dos portistas.

Entramos numa segunda volta que vai obrigar Sérgio Conceição a tirar dos seus jogadores não um litro mas sim um litro mais um quartilho até porque depois dos cinco pontos perdidos de enfiada pelo Benfica face a Braga e a Sporting a equipa de Schmidt voltou ao ritmo dos triunfos fáceis e simplistas. Há, neste momento, com um jogo a menos para o FC_Porto, oito pontos a recuperar (nove se não vencer na Luz) e ninguém pode dizer que não é como trepar os Alpes d’Huez. Se as coisas se decidissem pela agressividade do discurso, Sérgio bateria aos pontos, se não mesmo por KO, Rúben Amorim. O problema é que, quando a bola começar a rolar, palavras leva-as o vento, como sempre aconteceu na história dos homens.