Sonhou ser bailarina. Aos 15 anos pediu à irmã mais velha, Mariana, o favor de ir com ela fazer um casting que procurava duas irmãs gémeas. Meses depois foi escolhida para apresentar o programa Disney Kids, ao lado de Francisco Garcia. Carolina Patrocínio recorda o início de carreira, os dissabores do lado mediático e o momento atual: «Dar uma entrevista, como estou agora a fazer, era uma coisa que me causava uma ansiedade tremenda». «Gosto muito mais dos últimos 10 anos da minha carreira do que dos primeiros!».
A SIC celebrou recentemente 30 anos, ou seja, a Carolina tinha cinco quando o canal nasceu. Lembra-se dos primeiros programas a que assistiu na televisão?
Tenho uma memória muito presente: de sentar-me de manhã com a minha irmã mais velha [Mariana Patrocínio], de ligarmos na SIC e esperarmos pelo genérico de abertura do canal. Portanto, acordávamos mais cedo do que a estação. Lembro-me do hino, das cores, do jingle de abertura… Recordo-me como se fosse hoje, era algo marcante na vida das crianças que esperavam pela abertura do canal ao sábado ou ao domingo de manhã. Depois, ao longo da minha vida e ainda antes de fazer parte desta estação, tenho muitas memórias de programas como o ‘Big Show Sic’ [risos], lembro-me de, ainda em miúda – dancei ballet durante muitos anos -, ser fascinada pelo mundo do espetáculo e pelas bailarinas da televisão, de saber de cor e de dançar como as dançarinas que acompanhavam o João Baião. E de querer aqueles fatos que eram extraordinários!
Nessa altura, então, os sonhos já estavam relacionados com os palcos? Talvez mais para o lado da dança do que para a televisão? Ou já era um misto?
Não, estava completamente direcionada para a dança. Achava que a minha vida iria passar por ser bailarina e foi essa a formação que tive desde muito pequenina. A minha mãe inscreveu-me no ballet quando eu tinha 4 anos e dancei até tardíssimo. Quando entrei no Disney [Kids], ainda tentei conciliar durante 2 ou 3 anos os ensaios e os espetáculos, mas tornou-se incomportável.
Chega à condução do Disney Kids com apenas 16 anos, mas, ainda antes, tem uma história caricata de um casting que foi fazer com a sua irmã. Quer partilhar?
[Risos] Sim, quando tinha 14 ou 15 anos foi quando senti que estava decidida a procurar um lugar meu, que me desse independência financeira também, em que encontrasse o meu cantinho. Sou a segunda de seis irmãs, cresci numa família com muito amor, mas de muita intensidade também. As minhas memórias são sempre de muita confusão em casa. Tanto que aquilo que eu considerava um luxo era ir dormir a casa da minha melhor amiga, que era filha única, e tínhamos a atenção da mãe só para nós, que nos perguntava que brincadeiras queríamos fazer e o que queríamos jantar. Aquilo para mim era uma coisa absolutamente extraordinária porque eu era criada na dinâmica de uma família numerosa. Tal como eu, hoje em dia, faço com os meus [quatro] filhos… é difícil alimentar egos individuais ou vontades próprias. Portanto, o meu luxo era ter o meu cantinho e, por volta dessa idade, aos 14-15, quis procurar o meu lugar e fi-lo um bocadinho à revelia dos meus pais. Inscrevi-me às escondidas num casting da SIC, para o papel de gémeas na série ‘Uma Aventura’. O único problema é que eu não tinha gémea nenhuma [risos], mas convenci a minha irmã mais velha [Mariana, dois anos mais velha do que Carolina], que é muito mais tímida do que eu. Como éramos muitas vezes confundidas – e ainda hoje em dia somos – disse-lhe: «Mana, vais fazer isto por mim! Vens comigo ao casting das gémeas. Não tens que fazer nada, eu falo por nós». E assim foi. Correu relativamente bem, combinámos o dia em que tínhamos nascido, para não haver falhas [risos].
Foram sozinhas?
Sim, sozinhas. Não dissemos a ninguém. Quem fazia o casting – e ainda faz a maior parte dos castings em Portugal – era a Patrícia Vasconcelos. Perguntou-nos o apelido e deu-nos a entender que as coisas tinham corrido bem. E no final disse-nos: «Eu sei que vocês têm aí um segredo que querem contar». E eu respondi: «Sim, nós não somos gémeas». [A Patrícia Vasconcelos] já tinha percebido, mas automaticamente notou que havia ali duas personalidades muito diferentes e uma miúda – que era eu – que procurava aquele sonho e que falava por mim e pela minha irmã, que dava o corpo às balas. Ficou com os meus registos e disse para tentar mais à frente, que não iria ficar com aquele papel por razões óbvias, mas que outras oportunidades viriam.
É neste seguimento que entra no Disney Kids?
Sim, passados uns meses volta a chamar-me e diz que há uma vaga que ainda não tinha sido preenchida [para fazer par com o Francisco Garcia]. O casting estava aberto e fui, novamente sem dizer aos meus pais, porque eu tinha muito essa necessidade de provar, da perfeição, de só dizer se tivesse sido escolhida, senão pareceria um falhanço. E a desilusão queria vivê-la sozinha.
Aos 16 anos já tinha essa perceção?
Sempre fui assim. Tenho um lado, infelizmente, bastante competitivo sendo que a maior competição é sempre comigo mesma. Se em algumas alturas da vida isso me trouxe dissabores, nessa fase servia quase como uma proteção: não dizer algo que podia falhar. Mas ficaram bastante bem impressionados e disseram que me contactavam mais à frente. Na altura, tínhamos que preencher muitos papéis, dizer quem eram os nossos encarregados de educação e dei os dados da minha mãe, naturalmente. Quem recebeu o telefonema, mais à frente, foi a minha mãe, a informar que eu estava entre as três finalistas para um casting da Disney. E a minha mãe fez exatamente o mesmo jogo comigo, não me disse nada [risos]. Disseram que iam voltar a avaliar e, desta vez, era a minha mãe que já sabia e eu não.
Mas não lhe cortou as asas?
Não me cortou as asas. E só quando teve a certeza de que eu tinha ficado é que a minha mãe me disse. Aí foi um projeto já com os meus pais envolvidos porque era uma miúda, tinha 16 anos, ainda estava no colégio, no 11º ano. Os meus pais foram logo muito conservadores, no sentido em que disseram que não viam problema nenhum em fazer aquele projeto, mas que havia condições: não poderia faltar no horário escolar e todas aquelas regras à volta disso.
E sendo uma família conservadora, como referiu, qual foi a reação a esta entrada no mundo da televisão?
Acho que foi mais duro para mim do que para a minha família. Não considero que tenha tido uma educação conservadora, tive uma educação tradicional. Fui sempre educada no sentido de respeitar o próximo, mas sobretudo a respeitar a figura do adulto, de haver alguma submissão.
Os mais velhos eram olhados como sendo uma figura de autoridade?
Exatamente. E quando entro na SIC, nesta empresa, via os câmaras e os produtores, que eram mais velhos do que eu – toda a equipa era mais velha do que eu, que tinha 16 anos. Tinha uma submissão automática. Tratava as pessoas na terceira pessoa, por você, e isso caía tão mal dentro deste ambiente que era gozada e rotulada… Eu lidei pior com a entrada neste mundo do que a minha família, que achava que eu fazia um programa até didático com a marca Disney, uma marca internacional reconhecida. A adaptação foi muito mais dura para mim do que para eles. Durante a primeira década da minha vida enquanto apresentadora, o que senti verdadeiramente dificuldade foi em encaixar-me nestes dois mundos porque não queria desiludir a minha família, não queria nada comprometer o seu bom nome e a boa reputação, os seus princípios. Vivia nesta dualidade de querer conquistar o meu lado mediático enquanto apresentadora, mas sem nunca poder tocar no nome da família ou ferir suscetibilidades, de dizer alguma coisa que desse um eco errado e fosse associada à minha família. Enquanto fui prisioneira disto não fui propriamente feliz e não consegui viver esta profissão de forma livre.
E foi difícil perceber que tentar colocar essa parte familiar numa esfera intocável era impossível?
Era impossível, tudo se cruzava. A minha vida pessoal foi numa determinada altura muito visada, e de forma agressiva, pela imprensa. E a imprensa escrita tinha muito valor e muito poder, através das fotografias não consentidas, dos paparazzi nas férias… era impossível fazer essa dissociação [do lado profissional e pessoal], além de que era uma miúda, nem sabia fazê-lo. Depois, nas entrevistas, eu falava na minha família e tinha os ecos de que não deveria ter falado, então eu vivi sempre com medo. Dar uma entrevista, como estou agora a fazer, era uma coisa que me causava uma ansiedade tremenda e só bastante tempo mais tarde, à vontade 10 anos depois do início da minha carreira, é que comecei a desprender-me e a pensar: ‘Eu sou a Carolina, além daquilo que a minha família é. Tenho que começar a desprender-me deste rótulo e deste estigma, porque às tantas não é só como as pessoas me veem, sou eu própria que me aprisiono e que não consigo falar de forma aberta’.
Era um conflito interno?
Sim! Era um conflito interno e nem dava para estar aqui e viver em pleno este mediatismo que tem que se viver e aprender a vivê-lo. Gosto muito mais dos últimos 10 anos da minha carreira do que dos primeiros.
Temos que falar também de um programa incontornável que apresenta, o Fama Show. Há aquela ideia de que trabalhar só com mulheres é complicado, mas pressupõe-se que no seu caso tenha sido mais fácil uma vez que fez estágio em casa. Ter crescido numa casa com tantas mulheres foi uma ajuda? Totalmente. Eu sou uma pessoa com uma personalidade muito conciliadora e faço esse papel na minha família, em particular com as minhas irmãs. Sou uma pessoa que facilmente liga pontes entre as personalidades delas, que cria pontos de consenso, sou muitas vezes chamada no caos precisamente para mediar e isso não se aprende: ou se tem esse lado e esse feitio ou não se tem. Tenho irmãs que são mais explosivas e sempre fiz esse papel em casa. Quando entrei numa equipa de mulheres, em que havia muito essa conversa de que seria duro, de que haveria muita competição, intriga ou muita fofoquice, senti-me completamente em casa. A equipa do Fama tem vindo a ser alterada ao longo das temporadas, já passaram por cá dezenas de apresentadoras e eu nunca me senti desconfortável a gerir egos ou conflitos. É um papel de que me orgulho e mesmo nas reuniões sou sempre uma pessoa que procura soluções e não problemas. E não estou a vangloriar-me, é uma característica, tenho outras horríveis, mas sou muito conciliadora e isso, numa fase mais madura da minha carreira, tem sido uma mais valia para mim. Se, no início, tinha este estigma de mimada ou de que fazia isto não porque precisava, mas porque gostava, agora esta e as outras características completamente opostas a essa narrativa que fizeram sobre mim são uma mais valia.
Acha que o facto de ter vindo de um meio privilegiado tornou-a um alvo mais fácil?
Muito mais, principalmente numa altura frágil da vida de uma mulher que é a adolescência. Muitas vezes, acho eu na minha modesta opinião, confunde-se o que é ter autoestima e o que é ter confiança. Acredito que a autoestima está mais intrinsecamente ligada com a forma como nós somos criados, mais com a nossa infância, com o facto de termos crescido numa redoma de amor, se nos deram atenção ou não, e eu sou uma mulher com muita autoestima, tive esse privilégio. Mas isso não significa que tenha sido sempre confiante na minha vida. Penso que a confiança é algo mais situacional. Muitas vezes não me senti confiante quando não fui escolhida para determinado papel, quando tive uma relação de amizade destruída, quando tive um conflito familiar que não conseguia resolver… Isso são situações que quebram a nossa confiança. E o que é que está por detrás disso? A autoestima. Isso foi o que me fez continuar, deu-me resiliência para continuar a tentar. As pessoas dizem-me: «Tu és uma mulher super confiante, nada te atinge», mas isso não é verdade. A confiança tem altos e baixos e consigo quase desenhar um quadro que mostre as alturas em que não tive confiança, mas a autoestima é uma boia de salvação, de amor – e não é que não se trabalhe, trabalha-se -, mas acredito que está muito intrinsecamente ligada com a nossa infância.
Por falar nas diferentes fases, entretanto surgiu o programa What’s Up, que apresenta desde 2020. Quais são as principais diferenças que sentiu entre o Fama e este programa a solo?
Este programa, para mim, foi quase uma prova e uma consolidação da confiança que me deram porque não deixa de ser um espaço meu, num canal temático, mas em que tenho muita liberdade não só a nível de conteúdos como na escolha dos convidados. A coisa mais importante que me dá são horas em televisão. Isto funciona quase como com os atletas de alta competição, quanto mais horas de competição um atleta tem mais profissional fica. Comparo muito esta profissão com os atletas de alto rendimento. Cresço com as horas que tenho em televisão, no caso do meu marido [Gonçalo Uva], são horas em campo, não é no banco, é a jogar. O What’s Up dá-me horas em televisão: falho, mas consigo perceber o erro e corrigir, e isso é importantíssimo.
Teve uma rubrica designada ‘O Mundo de Carolina’. Que também pode ser vista de outro ângulo: há o mundo dos comuns mortais, que se levantam de manhã e a dificuldade é sair da cama, e o seu mundo, em que pela mesma hora já fez o treino matinal. O exercício físico é, obviamente, muito associado a si e, como vem dizendo, trata-se de uma questão de prioridades. De que é que abdica para conseguir conciliar a família com os treinos, o trabalho e este estilo de vida?
Além de dormir… O exercício físico teve vários papéis diferentes ao longo da minha vida, hoje em dia não tenho sombra de dúvida sobre o que faz em mim. O que me leva até à hora do treino é pura e simplesmente disciplina, não é motivação. Isso não existe. Essa prioridade de que às 7h ou às 13h estou a treinar é pura disciplina, como chegarmos ao trabalho a horas. A motivação começa no momento em que estou a treinar e a querer acabar o objetivo daqueles exercícios – começo a acreditar em mim. É autoterapia porque nunca fiz uma sessão de terapia na minha vida, nunca tive psicólogo, nem psiquiatra, nem terapeutas, nem coach. Muitas vezes entro para um treino com a cabeça completamente embrulhada, desmotivada, calada e saio de lá com esses nozinhos desfeitos. É a minha terapia.
Família
Carolina Patrocínio e Gonçalo Uva casaram em 2013 e têm quatro filhos em comum: Eduardo, de 2 anos, Carolina, de 5, Frederica (7) e Diana (9).
Já pensou no que diria se a sua filha Diana (completa 9 anos em março) chegasse a casa daqui a 6 ou 7 anos e dissesse que ia conduzir um programa como o Disney Kids? Ou se quisesse ser uma estrela do TikTok, num panorama mais atual.
[Risos] Certo. Ainda me causa um bocadinho de angústia e de ansiedade tentar projetar isso na vida dos meus filhos. Acho que nos vemos sempre com aquela eterna juventude e irreverência dentro de nós; e está tão presente este meu passado e os meus primeiros anos em televisão que acho que fico automaticamente com um sentimento de proteção em relação a elas e de querer quase controlar tudo se isso acontecesse [risos]. E é impossível. Muitas vezes temos que errar para aprender. Eu fartei-me de dar tiros nos pés na forma como acabei por ser vista, fosse em entrevistas, fosse por ser mal interpretada, fosse naquela narrativa que disseram sobre mim que não era verdade. Cria-me um bocadinho de angústia pensar nisso, ainda tenho uns aninhos pela frente para fazê-lo, mas o que não deixo de fazer em casa é tentar criar crianças independentes, que não tenham medo e que saibam que têm um porto seguro para onde voltar. Nisso sou uma mãe muito pouco overprotective porque dou muito espaço, principalmente a nível físico [risos].
Também é muito conhecida por esse lado. Não segue a linha daqueles pais que quando os filhos estão a andar de bicicleta ou de skate agarram logo os filhos com medo que caiam…
Não, não, nisso sou o oposto. Até há uma expressão que usam aqui na empresa que é: «As tuas filhas são todo o terreno». E são mesmo. Gosto muito de lhes dar espaço e de ver até onde vão os limites delas porque acredito que as crianças, desde uma tenra idade, sabem medir os seus limites. Foi sempre o que os meus pais nos izeram. Educar através do exemplo, liberdade com responsabilidade e com individualidade. Um exemplo muito prático: num parque infantil, muitas vezes vemos a criança a subir um escorrega e a mãe a dar a mão com o medo legítimo de que a criança se magoe, mas eu sou o oposto. Sou o tipo de mãe que se senta no parque, observa e vê até onde elas vão. As minhas filhas têm esse feitio parecido com o meu, são aventureiras, gostam de testar os limites e é tão engraçado reparar como as crianças pensam… no fundo, isso é o princípio da autoconfiança. Há pais que não têm essa capacidade, não têm essa personalidade, e protegem-nos demasiado.
Que tradições familiares é que tenta manter com os seus filhos?
Tantas tradições. Tive uma infância muito privilegiada no sentido de ser uma criança feliz e as memórias passavam muito por essa vivência de casa de férias com primos e a presença dos meus avós – e tive os meus avós até muito tarde, ainda tenho um avô vivo – uma dinâmica muito familiar, de primos e irmãos e é isso que fomento também e tenho a sorte de ter as minhas irmãs por perto e de ter esses laços muito fortes. Costumo dizer que são primos-irmãos porque os meus sobrinhos obedecem-me como se eu fosse uma segunda mãe e vice-versa, as minhas irmãs e os meus cunhados têm autoridade total para educarem os meus filhos como se fossem deles.
Quais são as regras de ouro lá em casa?
As três que não falham. Educar através do exemplo é sem dúvida uma máxima. Liberdade com responsabilidade, ou seja, essa ideia de que cada um tem que decidir por si até onde vai a sua própria liberdade e assumir a responsabilidade dos seus atos. Nunca ofender e nunca desiludir. Apesar de ter sido educada assim, mais à frente sofri com essa responsabilidade, com essa mochila tão pesada que levava. Já em adulta, disse numa entrevista que o medo que mais tinha era o de poder desiludir os meus pais. O meu pai ficou super sensibilizado. Se calhar às vezes educamos assim sem nos apercebermos, se calhar também o faço com as minhas filhas e elas poderão ter este peso de não me quererem desiludir, o que também é horrível. Educar com amor acima de tudo.
A família é um dos seus pilares e também um dos conteúdos mais recorrentes nas suas redes socais. Falou dos tiros nos pés que deu: acontece pensar duas e três vezes antes de fazer alguma publicação? No seu caso em concreto acontece uma pequena coisa espoletar logo uma grande polémica…
Oscilo bastante. Tem muito a ver com a fase de confiança ou de falta de confiança que estou a viver na minha vida. E devo também essa verdade a quem me segue, de não ter de fazer tudo by the book. Seja na forma como estou com os meus filhos, como vivo o meu casamento, a minha profissão ou até os treinos… tento ser o mais transparente e dou o corpo às balas, mesmo se achar que não é tradicional. Outras vezes estou mais sensível e penso duas vezes. Não exponho quando não me apetece lidar com esse hate.
Tornou-se conhecida do público através da televisão, mas as redes sociais elevaram o seu nome a um género de marca, sendo que tem quase um milhão de seguidores…
As redes sociais deram-me muito empoderamento porque comecei a falar na primeira pessoa. Vinha de uma realidade totalmente diferente dos primeiros anos televisivos, em que tornei-me uma miúda mediática sem ter uma narrativa própria. Não podia falar de mim como gostava. As redes sociais deram-me isso e quem me acompanha sabe perfeitamente como penso.
Este ano, além dos 20 anos de carreira, celebra também 10 anos de casamento. Já falou sobre um dos segredos do sucesso na relação: a cerimónia entre o casal. Tem outros?
É uma regra de ouro do nosso casamento, essa cerimónia que está intrinsecamente ligada com o respeito pelo outro, de haver linhas que não ultrapassamos. Venho de um universo de muitas irmãs e essas linhas da intimidade são muitas vezes ultrapassadas entre irmãos, seja com asneiras ou ofensas que sabemos que magoam, que tocam naquele ponto fraco. Eu e o meu marido nisso somos muito respeitosos e, acima de tudo, isso faz com que cada um de nós torne o outro melhor pessoa porque tiramos o melhor um do outro e felizmente continuamos a gostar verdadeiramente da companhia do outro. Escolho sempre o Gonçalo, em detrimento de tudo, para sentir-me bem: conhecer um sítio, fazer uma coisa pela primeira vez, mas nesse campo, que não é amizade, também não temos de saber os segredos todos um do outro, eu não tenho de saber o que ele faz ao longo do dia todo nem quero, muito honestamente. Esse mistério é importante no casal, importante para mim, presumo que não seja importante para outras pessoas que vivem de outra forma mais intensa ou mais transparente. Nós encontrámos o nosso equilíbrio assim, somos muito independentes nas nossas vidas e nas nossas carreiras, mas cúmplices depois na parte em que nos tornamos melhores pessoas.
Há bocadinho falou no facto de ser muito competitiva, mas qual é a característica sua em que é incorrigível, aquela que os seus familiares já dizem que ‘não é defeito, é feitio’?
Eu acho sempre que é uma qualidade, mas em alguns momentos já me apontam como uma característica não tão boa. Desenvolvi uma capacidade de relativizar muito grande, também por todas as coisas que vou vivendo na minha carreira. Isso ajudou-me muito, é uma ferramenta que uso no meu dia a dia com tudo: relativizar, de ver de fora, de ter esta visão helicóptero, de não deixar a parte emocional envolver-se demasiado. Isto é ótimo, seja numa conversa difícil que temos com uma pessoa no trabalho ou numa relação pessoal. As minhas irmãs dizem muitas vezes: «Já sei que vais dizer que isto não tem importância nenhuma», mas é uma ferramenta que me ajuda.
Em televisão qual foi o melhor conselho que recebeu?
Que o melhor improviso é aquele que é combinado, ou seja, a preparação é sempre a chave, em tudo na vida, seja para uma conversa difícil, seja para um programa de televisão, seja para uma entrevista que tenha que fazer, seja para um desafio profissional. Tive a sorte de ter grandes oportunidades, mesmo, ao longo da minha carreira, como ter sido a representante da SIC nos Óscares, em Hollywood, ou de ter feito a cobertura do Jubileu da Rainha [Isabel II]. A preparação é sempre a chave.
Já fez saber o seu posicionamento em relação às intervenções estéticas. Numa altura em que cada vez mais se fala em televisão real isto poderá ser um choque ou não tem relação?
O tema é transversal em todas as áreas, não é por estar na televisão ou nas redes sociais… É tudo válido, cada mulher tem as suas razões para fazê-lo. Temos é que criar crianças fortes para perceberem e lidarem com o assunto de que a comparação é o nosso pior inimigo e contra mim falo, quantas vezes me comparei e a minha pior comparação é comigo própria. Sou super competitiva comigo e muito castradora comigo também.
Qual o sonho que gostava de realizar antes dos 40?
Criar uma associação ou um projeto em que possa dar sem precisar de receber nada em troca. Em que possa fazer a diferença na vida de alguém, algo relacionado com uma causa que me seja próxima.
Alguma vez pensou mudar de ‘casa’? Houve propostas?
Nunca em tempo algum ponderei um segundo em ideias que surgiram do mercado mudar-me desta estação. A SIC tem algo irrepetível e que não é passível de ser copiado, o ADN. É impossível. Isto tem um ADN muito forte e quem trabalha cá sabe do que falo e ou nos identificamos ou não nos identificamos – e eu identifico-me muito. Sinto-me completamente em paz e acho que a SIC tem ainda muito mais para dar.
Entrou com 16 anos, hoje tem 35, além do crescimento profissional acabou por ser também um crescimento pessoal?
Quase já nem consigo lembrar-me de quem eu era [antes da entrada na SIC]. Nos últimos tempos tem-me acontecido de forma cada vez mais frequente ter momentos de introspeção e de reflexão, que as minhas irmãs chamam breakdown emocional, mas não são breakdowns emocionais, são momentos em que paro para pensar e quase que gostaria de encontrar a Carolina dos 16 anos para confrontá-la com tudo isto que se passou. O que conquistei, os erros que ainda iria ter, e acho que essa miúda ficaria orgulhosa daquilo que tenho conquistado, sem nunca menosprezar. Nós, portugueses, temos um bocadinho esta síndrome do impostor que é achar que nunca valemos tanto quanto aquilo que nos dizem que valemos.