O Bloco de Esquerda, se bem nos lembramos, é um ressuscitado. Já esteve clinicamente morto, e voltou à vida mercê da ação das «carinhas larocas», como lhes chamou um dia Jerónimo de Sousa (e depois pediu desculpa…).
Após a saída do fundador, Francisco Louçã, o BE viu sair sucessivamente Daniel Oliveira, Ana Drago, Rui Tavares, Joana Amaral Dias, Fernando Rosas, Miguel Vale de Almeida, etc., para não falar do prematuro falecimento de Miguel Portas e, mais tarde, de João Semedo.
Dir-se-ia que o BE estava acabado.
Até que, nas eleições de 2015, surgiram Catarina Martins, Mariana Mortágua e Marisa Matias – e inesperadamente, com este trio, o BE ressuscitou.
Conseguiu a melhor votação de sempre.
E a partir daí manteve-se na crista da onda.
Tornou-se consistentemente o terceiro maior partido político português, à frente do PCP, e passou a dar cartas.
Integrou a ‘geringonça’ e condicionou fortemente o PS no Governo.
Mas este passo revelou-se fatal.
De um dia para o outro, começou a perder gás.
Catarina Martins viu diminuir a sua presença mediática (coincidindo, curiosamente, com a ascensão de André Ventura).
Nestas últimas eleições, o BE foi o quinto partido, apenas com 4% dos votos.
E agora parece de novo à beira do coma: Catarina Martins já anunciou a saída da liderança e o sólido ‘bloco’ de 2015 está a partir-se aos bocados, atravessado por fissuras internas.
O Partido Comunista anda desaparecido.
Já quase não se fala nele e pouco entra nas contas políticas.
Terá ainda alguma influência nas greves, mas são fenómenos localizados.
Como partido de eleitores, sumiu-se.
O seu líder, Paulo Raimundo, podendo ser um político capaz, é uma mosca morta, um homem de aparelho, mais talhado para gerir administrativamente uma loja do que para atrair clientes.
Não se vê que o PCP tenha condições para crescer, mesmo perante a crise do BE.
O Partido Socialista também não vive um bom momento.
Os sucessivos casos no Governo afetaram gravemente a sua imagem.
É visto hoje como um partido muito mais empenhado em servir-se do Estado do que em servir o Estado.
Impera a impunidade, houve secretários de Estado e ministros que tiveram de se demitir em consequência de negócios pouco claros, seus ou de familiares, referem-se interesses obscuros, e o primeiro-ministro perde mais tempo a apagar fogos dentro de casa do que a governar o país.
Nestas condições, vai cair bastante eleitoralmente nas próximas eleições.
É inevitável.
Por muito que ainda faça, a sua imagem está indelevelmente manchada.
A repetição da maioria absoluta é impensável e mesmo uma vitória com maioria relativa já é problemática.
Ora, com o BE em queda, com o PCP em queda, com o PS em queda, muito dificilmente a esquerda será maioritária depois de 2026, se as eleições não forem antes.
Muito dificilmente os partidos da direita – PSD, Chega, IL e CDS – não terão juntos a maioria no Parlamento.
E, nesta medida, têm de começar a organizar-se para encontrar uma solução de poder.
Não podem continuar a dizer que não falam uns com os outros – caso contrário, o país arrisca-se a ficar ingovernável.
Se o PSD, o Chega, a IL e o CDS não se entenderem, segundo uma base qualquer, a única hipótese será um Governo minoritário do PSD ou do PS, dependendo de qual dos dois for o mais votado.
E será uma solução muito frágil.
É preciso que os partidos da direita interiorizem esta ideia: dentro de três anos serão maioritários na Assembleia da República e caber-lhes-á responder perante o país – positiva ou negativamente.
Fala-se no regresso de Pedro Passos Coelho, que – dizem – poderia ser o elemento federador dos vários partidos dessa área.
E ele tem dado alguns sinais de que pode estar a ponderar um regresso à política.
Acontece que os regressos, em geral, não resultam.
Na política como noutras áreas.
O regresso de Jorge Jesus ao Benfica foi um tremendo flop, assim como o de Cristina Ferreira à TVI.
Tudo tem o seu tempo – e com Passos Coelho dificilmente será diferente.
Claro que há sempre exceções.
Mas eu não poria todas as fichas nessa hipótese.