As sagas da TAP e da Igreja!

Não somos ‘naif’, a sentença estava lida e Medina só a comunicou.

Por Manuel Boto, Economista

1. A TAP continua a sua saga e a ser uma enorme dor de cabeça quer para os governantes quer para os seus acionistas – os contribuintes portugueses que presentemente detêm 100% do capital social. Quando se julga que nada de pior lhe pode suceder, sobretudo agora que se preparava para apresentar lucros, até antecipando o prometido no Plano de Recuperação (ao que dizem porque continuamos sem o conhecer), a IGF concluiu o seu relatório sobre a legalidade do pagamento da indemnização e o Governo de Costa, perante a nulidade do ato, não perdeu tempo a despedir os seus dois principais líderes – Manuel Beja e Christine Ourmières-Widener (CO-W).

Sobre a questão jurídica, envolvendo o estatuto de gestor público, que constituiu toda a base da argumentação que concluiu pela nulidade, nem me pronuncio. Seja então assim e retirem-se consequências, mesmo num ambiente de ânsias de privatização da TAP, em que a prudência recomendaria ‘cautelas e caldos de galinha’, para a defesa sobretudo dos seus acionistas, os contribuintes portugueses que anseiam ser ressarcidos do investimento de Eur 3,2 MM.

Mas depois de dois governantes (Pedro Nuno Santos e do seu secretário de Estado Hugo Santos Mendes) terem sido sacrificados, porque considerados envolvidos e corresponsáveis por tal pagamento, alguém poderia imaginar que fosse diferente a sentença dos responsáveis da TAP, ainda por cima quando o Sindicato dos Pilotos, há muito em guerras com a Administração, leia-se CO-W, já tinha igualmente exigido essas demissões?

Não somos ‘naif’, a sentença estava lida e Medina só a comunicou. Costa, pressurosamente, veio de imediato referir que o assunto estava encerrado, porque sabia perfeitamente que não o estando, lhe continuaria regularmente a ser relembrado, como é evidente que irá ser porque o folhetim não acabou aqui. Se Manuel Beja, provavelmente irá ‘comer e calar’, estou convicto que o tema CO-W ainda fará correr muita tinta, porque no seu percurso profissional ficou uma nódoa que certamente jamais deixará que lhe fique ‘colada à pele’ e tentará ser ressarcida pela via judicial, com uma argumentação ‘de peso’ – da legislação portuguesa, ainda percebia ‘zero’ ao fim de escassos meses em Portugal e, se falhou, terão sido mais os advogados por ela e/ou os tais governantes que autorizaram o pagamento.

Sobre a questão da sua competência profissional, é difícil pronunciar-me porque não estou por dentro. Do que sobressai publicamente da sua gestão, há a registar: (i) as medidas de redução salarial e/ou de pessoal, provavelmente incluídas no tal Plano de Recuperação e que tanto explicam os lucros, foram herdadas da anterior administração, pelo que os méritos serão relativos; (ii) o beneficiar de dinheiro ‘grátis’, ou seja sem custo de capital, resultante das injeções feitas pelo contribuinte português, não indicia grandes méritos pessoais; e (iii) a recuperação do turismo de que a TAP largamente beneficia, não me parece que resulte da sua gestão. Sobre a estratégia atual, realmente não a perceciono, mas seguramente será problema meu.

Vamos ver como se desembrulha a questão da sua saída, sobretudo quanto nos custará, e ‘Rei morto, Rei posto’, venha Luís Rodrigues, proveniente da SATA, dizem que gestor qualificado e experiente na aviação e, se calhar, já deveria ser o escolhido quando foi nomeada a CO-W, por concurso internacional. Esperemos que sim, para bem da TAP, que precisa de paz como ‘de pão para a boca’. Herda os gestores que CO-W igualmente herdou, dado que nenhum a acompanhou na saída, todos oficialmente desconhecedores (!) dos meandros da saída de Alexandra Reis e, principalmente, da principesca indemnização, agora nula.

Disto tudo, sobram as ondas da saída de uma gestora estrangeira em Portugal por razões que seguramente terão repercussões internacionais negativas, dificultando a vinda de gestores estrangeiros qualificados para empresas do setor público Estatal e a convicção de que o desejo de privatização alimentado por Costa dificilmente será inferior a 100%, porque não estou a ver como depois deste episódio algum investidor ou companhia de aviação possa querer partilhar uma administração com representantes do Estado português.

2. Eu não queria, juro que não queria voltar a falar da saga dos abusos sexuais da Igreja, tão chocado fiquei com os resultados que corajosamente a Comissão liderada por Pedro Strecht ‘trouxe a lume’. Mas as conferências de imprensa de responsáveis da Igreja, a meter ‘paninhos quentes’ sobre realidades tão chocantes e a admitir que os responsáveis não serão afastados, nem sequer preventivamente, podendo ser ‘perdoados’ dentro do espírito cristão, faz-me sentir ‘vergonha alheia’.

Januário Torgal Ferreira, Bispo das Forças Armadas, veio defender o óbvio, ou seja, exigir o mínimo que qualquer pessoa pensa, exceto alguns (ou muitos) ministros da Igreja, ou seja, «em caso de suspeitas credíveis, a Igreja deve retirar preventivamente os padres do ativo». Mais, veio dizer que «os bispos que encobriram casos de abusos sexuais não servem para o lugar que ocupam». Qual a dúvida de que tem razão e, felizmente que os bispos de Angra e Évora, já terão começado a atuar, sendo possível ler em comunicados emitidos que afastaram padres mencionados na lista de suspeitos. Haja coragem para mais exemplos destes, porque também precisamos de ter fé na Igreja que deve ser exemplar, em termos daqueles que impõem e transmitem essas regras, até porque é extremamente exigente relativamente aos seus fiéis em termos de postura e comportamento.

P.S. – A IL e o anterior deputado do Chega retiraram o apoio ao Governo dos Açores. A notícia caiu que nem uma bomba e o PS ficou a esfregar as mãos de contente, a aspirar o regresso ao poder por via de eleições. Vou dar de barato as razões para estas zangas, mas sobra a lição de que se o PSD quer governar Portugal, terá de ajudar a ressuscitar o CDS ou levará anos para o conseguir. Quanto aos Açores, palpita-me que vem aí uma maioria absoluta do PSD.