Num país onde os professores da escola pública desistiram de ensinar, porque estão envolvidos em greves e manifestações, convocadas por estruturas sindicais em aberto despique, enquanto os alunos correm o sério risco de serem a geração menos preparada de sempre.
Num país onde a Justiça está paralisada pela improdutividade de vários agentes, e pelos expedientes dilatórios das defesas – com folga financeira para suportar as custas judiciais -, e pelos imbróglios jurídicos e incidentes processuais que já chegaram aos tribunais superiores, ao ponto de poderem comprometer a Operação Marquês, a Operação Lex, ou o descalabro do BES.
Num país onde a Saúde pública revela diariamente as suas fragilidades, seja com urgências fechadas, consultas atrasadas ou exames e cirurgias adiadas – apesar de consumir volumosos recursos orçamentais -, foram extintas as parcerias público-privadas em hospitais que funcionavam bem, em nome do fanatismo ideológico de Marta Temido, e que passaram a funcionar mal sob gestão pública. Custa ouvir o discurso ‘reciclado’ da ex-ministra, em rodagem aparente para a Câmara de Lisboa.
Num país onde é possível – depois do escândalo do desvio de armas em Tancos -, haver uma insubordinação a bordo de um navio-patrulha, fazendo abortar uma missão importante, alegadamente por causa de avarias e de falta de manutenção, é de estarrecer.
Num país onde os ferroviários param os comboios com greves intermitentes, lançando o caos, designadamente, nas linhas suburbanas, com absoluto desprezo pelos utentes e pela situação da CP, uma das empresas mais deficitárias na órbita do Estado, não se percebe para que serve a requisição civil, quando os sindicatos abusam de um direito.
Num país onde a TAP consumiu riqueza, a expensas do contribuinte, enquanto ‘companhia de bandeira’, para satisfazer um capricho ideológico do Governo – e voltar a ser privatizada, como se nunca o tivesse sido -, espanta que não se exijam responsabilidades para tamanha contradição.
Num país onde uma empresa pública, a Transtejo, encomendou dez navios elétricos a pretexto de modernizar a frota, dos quais nove sem as respetivas baterias, o que levou o Tribunal de Contas a equiparar a operação a «comprar um automóvel sem motor, uma moto sem rodas ou uma bicicleta sem pedais». É uma história que entra já na galeria do burlesco.
Num país onde o Governo lançou um ‘pacote’ da habitação, criticado, em privado, por Marcelo Rebelo de Sousa, que o definiu como «uma lei cartaz» inexequível – e que prevê, designadamente, a possibilidade de arrendamentos coercivos da propriedade privada, supostamente devoluta – mereceu ao primeiro-ministro, o comentário cândido, que se destina a «proteger as famílias».
O projeto justificou, aliás, o bisturi cirúrgico de Cavaco Silva, para quem o Governo «não tem credibilidade». Certeiro, o ex-Presidente convidou o Executivo a afastar «a absurda ideia de fazer do Estado um agente imobiliário ativo».
A propósito, segundo dados revelados por uma deputada municipal, Margarida Bentes Penedo, no Observador, nem com o Estado Novo se construiu tão pouca habitação pública. Na pior década, entre 1930 e 1940, foram construídas 206 casas por ano na capital. Mais perto, segundo a autarca, «desde 2000 a 2010, a média foi de 991 casas [construídas] por ano», enquanto na segunda década se «construiu 17 casas por ano» em Lisboa. No Município estavam António Costa e Fernando Medina. Está tudo dito.
Num país onde a rua voltou a ser o palco de um mal-estar que germina no país, pressentido pelas esquerdas comunistas, que não tardaram em aproveitar-se da situação para pressionar um Governo fraco e atarantado, enquanto as direitas marcam passo. Como escreveu António Barreto, «isto pode acabar mal».
Num país onde o PS procura aperfeiçoar os mecanismos de controlo do poder, e espalha as habituais ‘cortinas de fumo’, com a cumplicidade da ASAE, inventando culpados para distrair os incautos das verdadeiras razões do agravamento do custo de vida e da inação do Governo.
Num país onde o primeiro-ministro esteve contra mais estudos alternativos de localização do novo aeroporto de Lisboa, defendendo o Montijo como solução definitiva, porque «não faz sentido discutir o que já foi discutido», mas em seguida ‘tirou da cartola’ uma comissão técnica para avaliar ‘as opções estratégicas para aumentar a capacidade aeroportuária da região de Lisboa’, dilatando um impasse que já dura há décadas.
Num país onde tudo isto acontece, corrosivo da democracia, é anunciado que o Presidente da República e o primeiro-ministro estarão no Luxemburgo para assistir ao jogo de qualificação da Seleção Nacional para o Europeu de Futebol de 2024. Uma prioridade…
Por este andar, no Estado a que chegámos, qualquer dia ainda vão assistir aos treinos da Seleção, ali perto do Jamor…