Atentado. A bravura dos gratificados

Com um enorme facalhão, um refugiado afegão matou duas mulheres e feriu um professor de português, de quem era aluno. Os dois gratificados da PSP que estavam de serviço na Loja do Cidadão é que travaram o que poderia ter sido uma chacina ainda com mais vítimas.

Os mais atentos ficaram impressionados com o tempo de reação da polícia a chegar ao Centro Ismaili, mas a explicação é simples: foram dois gratificados que estavam na Loja do Cidadão, nas Laranjeiras, que se deslocaram rapidamente ao local, tendo conseguido neutralizar o afegão que acabara de matar duas mulheres e ferir outras pessoas, segundo fonte policial confirmou ao Nascer do SOL. A distância entre a Loja do Cidadão e o Centro Ismaili é muita curta, daí os dois agentes terem sido tão lestos a chegar ao local do crime. Só depois é que apareceram os elementos da equipa de Intervenção Rápida, além da Unidade Especial de Polícia e o seu Grupo de Operações Especiais.

«É preciso valorizar o comportamento dos dois homens que saíram do seu ‘gratificado’ para irem acudir a uma situação tão complicada. Eles podiam ter ficado quietos, mas depois de ouvirem no rádio o alerta, foram imediatamente para o Centro Ismaili», diz ao nosso jornal outra fonte policial.

E a coincidência de serem dois agentes a prestarem o serviço de gratificado permitiu que um deles tivesse levado o rádio que está ligado à central, pois quando é apenas um, é raro tal acontecer.

 

Massacre do Charlie Hebdo na origem da formação

Quando a 7 de janeiro de 2015 dois terroristas entraram na redação do jornal satírico Charlie Hebdo e mataram 12 pessoas e feriram gravemente sete, as polícias europeias reviram a formação dos seus agentes, e Portugal não fugiu à regra. A partir dessa data todos os elementos que querem ser polícias recebem a formação denominada de ‘active shooter’, que é como quem diz, formação de reação a atacante ativo. E foi por isso que o agente da PSP disparou para os membros inferiores do afegão Adbul Bashir, atendendo a que o mesmo tinha um enorme facalhão e tentou atacar os agentes. «Se ele tivesse uma arma de fogo os agentes teriam que ter disparado para o peito ou mesmo para a cabeça para não serem mortos», explica fonte sindical ao Nascer do SOL. «As antigas armas de calibre 7.65, muitas vezes, não imobilizavam logo o criminoso, pois podiam perfurar o corpo, mas se não apanhasse nenhum osso, o assaltante podia continuar a reagir. Agora, com estas de 9 de milímetros não há lugar a meiguices, e permitem que os agentes possam disparar para as pernas, imobilizando, regra geral, o criminoso», acrescenta a mesma fonte.

 

Rejeitado na Alemanha

O Centro Ismaili, em Lisboa, sede mundial da Fundação Aga Khan, foi o local escolhido pelo afegão Adbul Bashir para matar duas funcionárias, de nacionalidade portuguesa, da instituição, Farana Sadrudin e Mariana Jadaugy. O afegão, que supostamente sofre de problemas psiquiátricos, chegou a Portugal em setembro de 2021, acompanhado de três filhos menores, de nove, sete e quatro anos. A mulher terá morrido num centro de refugiados na Grécia, supostamente num incêndio.

A viver num apartamento em Odivelas, gozando do estatuto de refugiado, Adbul Bashir teria tentado a sua sorte na Alemanha, antes de chegar a Portugal, mas viu essa pretensão recusada pelos alemães – supostamente por o seu visto de refugiado ser de Portugal. A imprensa tem relatado que Bashir estaria deprimido por não ser correspondido no amor pela mais jovem das vítimas, Mariana Jadaugy, mas esse argumento colhe muito poucos defensores, pois Bashir teria viagem marcada para a Suíça no dia seguinte ao atentado.

No Centro Ismaili, o afegão recebia aulas de português, além de outro tipo de ajudas, e os filhos estavam bem integrado. Segundo o porta-voz da comunidade ismaelita, Faiz Ali, o agressor começou por atingir o professor de português, que dava uma aula a essa hora, tendo depois seguido para outro espaço onde encontrou as duas mulheres que viria a esfaquear até à morte. A mais nova estaria inclusivamente a tratar-lhe da papelada para a obtenção da naturalidade portuguesa. Ainda segundo o Correio da Manhã, Bashir terá recebido um telefonema, começando a agredir o professor de português depois de desligar o telemóvel. Após ser operado no Hospital S. José, o afegão foi depois transferido para o Curry Cabral, não correndo perigo de vida, aguardando-se que melhore para ser presente a um juiz.

O receio de tratar-se de um atentado levou a Polícia Judiciária ao local, onde estavam mais de 60 agentes policiais, que trataram de confirmar que no Centro Ismaili não havia nenhum cúmplice.

Como seria de esperar, o acontecimento desencadeou uma série de reações, tendo André Ventura incendiado as hostes com um dos seus tweets habituais: «A política de portas abertas sem qualquer controlo deu nisto. O sangue destas vítimas é responsabilidade do criminoso afegão, mas está nas mãos do governo de António Costa», sentenciou o líder do Chega.

Já o Presidente da_República apelou a que não se façam generalizações, apesar de não haver «nada que justifique um ato criminoso como este». Marcelo_Rebelo de Sousa, que se deslocou ao local para demonstrar a sua solidariedade às famílias das vítimas e à comunidade ismaili, avançou com uma provável motivação de Adbul Bsshir. Do que foi possível apurar, o Presidente ficou com convicção de que «se trata de um caso individual, que era um caso psicológico, pessoal e familiar que ocorre em muitas circunstâncias com muitas pessoas».

 

Muçulmanos liberáis nos costumes

A maioria da comunidade ismaelita que vive em Portugal saiu de Moçambique na década de 70, tendo forte presença na hotelaria nacional. Os grupos Sana, VIP e agora o Fontecruz, na Avenida da Liberdade, pertencem a empresários ismaelitas portugueses. Com o dinheiro que ganham, alguns empresários apostam em dar respostas à exclusão social e à pobreza urbana – algo que caracteriza o Centro Ismaili – uma das máximas de Aga Khan, o líder espiritual destes muçulmanos que adoram seguir as máximas de dois poetas nascidos nos séculos XI e XII, Omar Khayyam e Jalal Rumi, respetivamente. Ambos fizeram grandes odes ao vinho e aos prazeres da vida. E é por fazerem uma leitura diferente do Corão, que os ismaelitas são renegados como muçulmanos pelos sunitas, por exemplo. A título de curiosidade, diga-se que o famoso hotel Polana, em Maputo, pertence à fundação Aga Khan.