Tem 26 anos e estudou Ciências da Comunicação, sendo que, recentemente, terminou o mestrado em Gestão de Informação. Como é que foram os anos académicos? Senti que aquilo que gosto realmente de fazer é a música. No entanto, comecei estas coisas e queria terminá-las. Iniciei o mestrado numa fase de pandemia, estava tudo muito incerto e essas ferramentas estarão sempre comigo. Pensei “Vou acabar” e assim foi.
Nunca ponderou estudar Ciências Musicais ou algo semelhante? Sim, passou-me pela cabeça, mas por questões mais pessoais acabei por não seguir por aí. A minha relação com a música é algo em que sempre me refugiei: no cantinho do meu quarto sem saber de onde vinham as letras nem as melodias.
Tem alguém na sua família que a tenha influenciado? Sempre ouvimos muito fado e fomos a imensos concertos, mas não há ninguém que cante para além de mim.
Compôs a primeira canção aos 12 anos. Qual é que foi? Não me recordo, mas sei que comecei a compor com 12 anos. Sou muito fã de Taylor Swift, gosto mesmo de música country no geral e, portanto, também queria contar histórias! Escrevia mais em inglês e, quando passei para português… Nunca mais parei! Tenho um caderno com canções antigas, mas não sei se o mostrarei algum dia! Recentemente, dediquei-me à leitura da poesia. Estou a explorar este lado. Porque quero que as pessoas vejam o mesmo que eu. As pessoas veem aquilo que vejo e eu vejo tudo enquanto canto, no palco.
Em várias entrevistas, mencionou que não esperava que o seu single de estreia, “Portas do Sol”, tivesse tanto sucesso. De todo! A covid-19 apareceu e eu pensei “Tenho esta música que adoro e só quero pôr esta música cá fora”. Não tinha Instagram nem sequer canal no YouTube. A música falou por si só! Não houve grande alarido acerca de quem é a Nena: a música descobriu Portugal e as pessoas descobriram-na. Foi um processo muito bonito de se ver.
O tema transporta-nos para um amor antigo, de outro tempo, e dá-nos a conhecer Lisboa, Sintra… Vamos acompanhando um trajeto que nos envolve. Sem dúvida. Não só a história em si, que já passou, mas também a forma como é contada acaba por cativar. Parece triste, mas celebra tudo o que se viveu, o passado, assim como a História de Portugal e, mais especificamente, a de Lisboa. É uma forma de mostrar que foi bom, aconteceu e agora… Estamos aqui! Pessoalmente, gosto da música, mas… Não sei se devo dizer isto [risos].
A história é particular? As pessoas adoram perguntar isso, mas não! Sou muito observadora. Adoro estar no comboio, por exemplo, olhar para os outros passageiros e questionar “O que se passará na vida destas pessoas?”. Nos aviões, pergunto “Para onde irão?”. Quase ficamos habituados às caras das pessoas!
Escolhe o amor como tema principal ou é ele que a escolhe a si? Diria que ambos! Foram anos da minha vida em que quero falar destas emoções fortes e daquilo que o amor representa na minha vida. Continuo a escrever imenso acerca desta temática, mas tenho pegado noutros. E tem sido giro escrever sobre a fase da vida em que estou. Quando escrevemos, nunca sabemos aquilo que pode acontecer e é tudo imprevisível! Isso fascina-me.
Pode desvendar um bocadinho mais daquilo que tem surgido no decorrer do processo de escrita? Prefiro que desvendem tudo quando as músicas forem lançadas. Acho que vêm aí temas mais animados – não tantas baladas – dos quais vão gostar. Sinto-me bem quando as pessoas dançam enquanto canto.
Como acontece com a “Passo a Passo”. Exatamente! Há uma ligação especial com o público. Tenho saído da minha zona de conforto.
Sempre imaginou que, um dia, seria uma artista com uma carreira ou viu a música como hobby? Tinha e tenho sonhos e não posso parar de trabalhar, mas não estava à espera de chegar aqui. É preciso trabalhar bastante para que tudo se alinhe e chegue o timing certo. Estar a viver isto é surreal e estou extremamente agradecida.
Existiu alguma fase em que tenha ponderado desistir? Sempre soube que escreveria canções para o resto da minha vida porque me compreendo e ao mundo que me rodeia, mas não sabia se as minhas músicas tocariam na rádio. É normal que duvidemos de tudo. “Será que as pessoas gostarão de mim? Será que as pessoas vão ouvir as minhas músicas?”. Perguntas como estas surgiam na minha cabeça, mas eu não parei de me esforçar e, honestamente, estou orgulhosa disso. Não tenho problemas em dizê-lo.
Já falou na Taylor Swift. Para além dela, de quem gosta mais? Quero imenso conhecê-la, mas há outros artistas de quem gosto como John Mayer, Maisie Peters, Gracie Abrams, Ashe… No nosso país, Carolina Deslandes, Bárbara Tinoco, Quatro e Meia, Tiago Bettencourt, Miguel Araújo, Rui Veloso… Tantos! É uma lista interminável. Tento ouvir um bocadinho de tudo para interiorizar e fazer coisas diferentes.
E para quem gostaria de escrever? Temos a Carolina de Deus, a Rita Rocha, a Bianca Barros… Há imensa gente que está a conhecer e, definitivamente, gostaria de escrever para uma delas. Tenho muitas músicas que lhes poderia dar. Mas prefiro ouvir as histórias delas e escrevermos em conjunto!
Uma coisa é ter as músicas e outra é partir para a gravação do álbum. Como é que tudo correu? Foi um processo mesmo giro. Gosto mesmo de estar em estúdio. Este disco foi produzido pelo João Só e pelo Ricardo Ferreira e foi divertidíssimo estar com eles. Encontrar pessoas com quem nos damos bem e partilhamos as histórias é essencial. Explicar-lhes aquilo que senti e que queria transmitir foi fácil. A primeira música que saiu foi a “Portas do Sol” e eu já sabia que queria que o disco fosse um bocadinho encaminhado para esta temática de ruas e becos de todo o país. Histórias e coisas de rua. E comecei a reparar que todas as canções iam dar aqui, como a “Santo Popular” e a “Do meu ao teu correio”. Foi interessante estar em estúdio com estas imagens na minha mente. Estou cheia de saudades e quero voltar!
Já há uma data? Tenho algumas idas marcadas, mas não sei se virá aí alguma música. Temos de esperar para ver.
Escreveu a “Portas do Sol” em 10/15 minutos? Sim! Estava sentada no chão, com a guitarra, e cantei “Não me dás o sinal…” e eu senti que as palavras vinham de algum lado e pensei “Não vou parar de escrever!”. Fui a correr ter com os meus pais e disse-lhes: “Fiz uma música nova!” e soube que poderia ser um game changer para mim. Cantei-lhes a música e eles acharam logo que era boa. E, desde que a escrevi, nunca mais parei de a cantar. Até mesmo entre amigos. Foi um processo ótimo e rápido. Quando a criatividade vem de algures e nem sabemos explicar… É mesmo especial!
E como surgiu a ideia da gravação do videoclipe? Eu e os meus amigos falámos com um senhor que conduz Tuk Tuks, porque tínhamos de reservar um para o dia inteiro, e fomos passear. Uma amiga minha foi a realizadora e fomos aos sítios de que falo na canção. Em alguns momentos fiz lip sync. A cadela do videoclipe é a minha. É um vídeo caseiro que se transformou numa coisa muito maior do que esperávamos.
Como é que foram os concertos de apresentação do álbum? Ter o disco cá fora foi incrível porque vi as pessoas cantarem as músicas. Às vezes, sinto que passam apenas cinco minutos. Antes, tinha medo, não sabia se conseguiria estar em palco, mas ter contacto com as pessoas que me ouvem é cada vez melhor.
O nervosismo tem vindo a reduzir-se? Sim! É normal ficar-se nervoso antes de uma atuação: não há problema nenhum, significa que me importo e quero dar um bom espetáculo às pessoas. Não há adrenalina como a de estar em palco e penso “Hoje vou dar tudo!”.
Quando lhe perguntaram, numa entrevista, qual é a sua ambição na música, falou no momento em que apareceu na Times Square, numa playlist do Spotify. Já sabia que ia aparecer porque o Spotify contactou a minha equipa. Quando soube, comecei a questionar “Eu!? Têm a certeza?” e nem acreditei. Depois, estava a andar na rua, vi a fotografia que me enviaram, e fiquei “Ó meu Deus, não acredito que isto está a acontecer, a minha cara está gigante em Nova Iorque”. Obviamente que é um reconhecimento que me deixa profundamente contente. Trabalhei para isto, assim como a minha equipa.
O seu trabalho tem sido devidamente reconhecido em Portugal? Por parte das pessoas da indústria ou dos ouvintes?
Ambos. As rádios apostaram em mim desde o início e sei que se não o tivessem feito… As coisas não estariam a acontecer com tanta facilidade. OIharam para mim e acharam que valia a pena. Por parte do público, também me parece que sou acarinhada. Recebo mensagens fantásticas e… Tem sido um percurso espetacular.
No YouTube, principalmente, nas caixas de comentários, há mensagens de muitos ouvintes brasileiros. Elogiam a sua escrita, dizem que choram a ouvir as suas músicas, a pensar em Portugal… Também reparei nisso! Quem sabe… Um dia ainda irei ao Brasil!
Quais são as principais falhas da indústria musical portuguesa? Acho que, cada vez mais, se ouve música portuguesa. As pessoas pedem-na e o que não faltam são artistas. Deixem-nos cantar e mostrar as músicas! Eu própria oiço muito mais música nacional do que ouvia. Sinto-me em casa. Devia haver uma maior aposta.
O que mudou mais em si desde que entrou no mundo da música? Achei que ia ser mais assustador do que é na realidade. Quando escolhemos este caminho dizem-nos que devemos ter cuidado – e devemos, claro -, mas tenho aprendido a descontrair, confiar nos meus instintos e a ficar atenta àquilo que se passa à minha volta. Tenho aprendido a desafiar-me diariamente pondo um bocadinho de mim cá fora.
Teve alguma desilusão? Não. Acredito que por piores que as coisas pareçam… Acontecem por algum motivo. As desilusões são desilusões no momento, mas transformam-se em coisas maiores e melhores no futuro.
Onde gostaria de cantar? Vou fazer um bocadinho de publicidade aos meus concertos, mas o Coliseu de Lisboa é o maior sonho da minha vida e vai concretizar-se no dia 23 de novembro. E, na Casa da Música, soube que vou tocar na Super Bock Arena em 20 de janeiro de 2024. Ponham nas agendas! Internacionalmente… Adorava ir ao Reino Unido e ao Brasil.