Por Dinis de Abreu
Ao contrário do PCP que invadiu Lisboa (e não só) de bandeiras alusivas ao seu centenário – ocupando ironicamente a avenida da Liberdade, sem nunca ter renunciado às ditaduras de inspiração soviética –, o PS, que lutou pela liberdade na Alameda contra os novos poderes totalitários emergentes, confinou-se no cinquentenário aos pavilhões Carlos Lopes e Rosa Mota, em convívios que meteram recados e protestos.
Compreende-se. Embora seja Governo com respaldo maioritário, enquistado no aparelho de Estado , o PS já conheceu melhores dias e alcançou meio século de vida ‘entalado’ entre a sucessão de António Costa, não anunciada nem resolvida, apesar de ser uma questão há muito em aberto na família socialista; e o pesadelo de Sócrates, que embora se tenha excluído da família, nem por isso deixou de condicioná-la, com o julgamento adiado para as calendas, confiado nos talentos dos seus advogados, nos expedientes dilatórios, e na prescrição dos processos que sobraram do crivo do juiz Ivo Rosa.
São dois embaraços complexos, que, juntamente com outros mais recentes, ofuscaram os brilhos da festa de aniversário, por muito que a militância presente nos pavilhões os quisesse disfarçar.
António Costa, um ‘malabarista’ exímio a baralhar os parceiros da ‘geringonça’, sabe que criou um deserto à sua volta, do qual acabou por ficar refém.
De facto, por muito que se esforce, não tem sucessores óbvios que o libertem para outros voos, e tarda em romper com o atual impasse, até por saber que, no limite, tem Marcelo Rebelo de Sousa ‘à perna’, com o dedo no botão da chamada ‘bomba atómica’ da dissolução.
Por diferentes e parecidas razões, um a um, todos os possíveis candidatos com fama de ‘herdeiros’, têm vindo a perder lastro pelo caminho, vítimas das suas incompetências.
O mais notório candidato, Pedro Nuno Santos, recolhido em voto de silêncio, sabe que se “espalhou ao comprido” na TAP e no dossiê da localização do futuro aeroporto (que já conta com 17 hipóteses, um absurdo da comissão técnica), e que deixou a CP em autogestão.
Para sermos justos, Pedro Nuno Santos não foi especialmente inovador, seguindo os procedimentos inconsequentes do seu antecessor Pedro Marques, antes deste ser ‘recompensado’ com a sinecura de eurodeputado em Bruxelas.
E por muito que custe aos amigos do aparelho, é improvável que Pedro Nuno Santos venha a sentar-se na cadeira do líder socialista no largo do Rato – ainda que Costa, num exercício de benevolência e de fraca memória, o tenha considerado «indiscutivelmente, um dos grandes quadros dentro do PS». É o nivelamento por baixo.
Claro que a SIC, que se tem especializado em recrutar políticos no desemprego ou na reforma, já anunciou que o quer contratar como ‘comentador’. Fraco reforço,
Depois, nem Fernando Medina, nem Marta Temido, nem muito menos Ana Catarina Mendes ou Mariana Vieira da Silva, lograram obter um estatuto capaz, quer no partido quer na governação, onde têm cometido deslizes sucessivos, designadamente, o do parecer jurídico (inexistente?…), com a fundamentação para o despedimento, por justa causa, do chairman e da CEO da TAP.
Finalmente, Francisco Assis, que já foi putativo candidato, perdeu gás e mudou-se para ‘publicitário’ de Pedro Nuno Santos. Outros, porém, nem querem sequer ouvir mencionar os seus nomes.
Paradoxalmente, embora rodeado de fiéis, António Costa esteve mais só, no meio das suas contradições e do ‘fogo de artifício’, preparado à base do IVA zero em alguns bens alimentares, e, principalmente, do inesperado bónus aos pensionistas, enquanto o PS se entretinha na frente parlamentar a ‘bater o pé’ ao veto de Marcelo, confirmando a lei da eutanásia que o Presidente será forçado a promulgar.
Em vez de festejar, com maturidade, meio século de vida, o PS e Costa parecem desnorteados e erráticos, somando ‘casos e casinhos’ e radicalizando o discurso contra Montenegro e o PSD, já comparados a Ventura e ao Chega,
Perante os maus resultados nas últimas sondagens, a liderança socialista reagiu agastada e meteu “no mesmo saco” toda a direita, talvez na esperança de dar tempo ao Bloco e ao PCP para se recomporem do desaire eleitoral.
Entre a turbulência da TAP – com o desconchavo de três ministros em rota de colisão – e a vergonha de ter o ex-líder Sócrates, suspeito de corrupção e de outras malfeitorias, o PS não tem muitas razões para se congratular, descontados os feitos de Mário Soares.
Entre os ausentes e presentes nas festas, houve históricos que foram críticos (como António Campos) e outros que incensaram o líder (como Manuel Alegre).
Infelizmente, para Costa já não basta evocar a memória do fundador. Para desgraça dos portugueses – que as sondagens revelam descrentes e zangados –, a demissão deste Governo trôpego ainda é uma miragem.