Por Alexandre Faria, escritor, advogado e presidente do Estoril Praia
Os recentes casos ocorridos na política nacional só favorecem quem promove o descrédito nas instituições e na democracia, podendo até causar novas situações à semelhança das observadas na recente sessão solene de receção ao mais alto representante da República Federativa do Brasil, em pleno Parlamento e à vista de todos, praticadas com ampla impunidade no mais relevante órgão de soberania.
Como um parecer configura um documento técnico meramente consultivo, ou seja, não vinculativo, a importância reside no ser e nos responsáveis pelas decisões. É no ser que se concentram as opções executivas e apenas aos titulares se pedem justificações num espaço democrático evoluído e propriamente alicerçado.
Por estes motivos, numa fase tão exigente como a atual em virtude dos fundos europeus por implementar, não é tolerável a desautorização de um ministro da Economia pelos seus próprios secretários de Estado nem as declarações contraditórias entre o mesmo ministro e o ministro das Finanças acerca da redução do IVA. Muito menos se compreende que duas ministras sejam desmentidas pelo ministro das Finanças, evidenciando uma inacreditável falta de articulação e uma descoordenação inadmissível no Governo de um país.
A par disso, as novidades em catadupa e os comportamentos erráticos em plena comissão parlamentar de inquérito sobre a TAP, ou os tristes eventos no Ministério das Infraestruturas com elementos do gabinete do ministro, geram uma desconfiança insustentável junto da população, originando, inclusive, um silêncio nada habitual no Presidente da República, sempre lesto no seu comentário.
Só a determinação do primeiro-ministro permite esconder que algo vai mal no Reino da Dinamarca. Quando o presidente de um partido a governar com maioria absoluta apela a uma remodelação ministerial porque certos elementos se revelaram aquém das expectativas, podemos supor o pior. Se tais afirmações não foram encomendadas, não deixam de lançar um inaceitável desnorte.
Não é tempo para se crucificar bodes expiatórios nem se poderá optar por paliativos, porque a instabilidade de fundo terá de ser ultrapassada, para não frustrar as legítimas aspirações de quem atribuiu uma desejada estabilidade parlamentar para liderar os destinos de Portugal, obrigando a promover as devidas reformas estruturais e a assegurar uma melhor qualidade de vida.
Se a saída de João Galamba parecia inevitável, a decisão de António Costa revela uma coragem impressionante e demonstra não ter receio de eleições antecipadas, com a habilidade de se libertar dessa responsabilidade. Ganhou o braço de ferro institucional, mais uma vez.
Perante estes factos, é a altura de ser, de restabelecer a confiança e de demonstrar o erro na ancestral afirmação de não nos governarmos nem nos deixarmos governar, sob pena de surgirem danos irreversíveis aproveitados por populistas em momentos de crise, nomeadamente por aqueles que envergonham as instituições. Não se pode alimentar quem não tem sentido de Estado, permitindo a veleidade de acreditarem ser possível chegar ao poder.