Por Luís Castro, Jornalista
Só há vinte e quatro democracias plenas no mundo e Portugal não é uma delas. Consideram-nos uma democracia imperfeita e puseram-nos onde já estávamos em 2006. Nada mudou nos últimos dois anos, continuamos em 28.º lugar no ‘Democracy Index 2022’, mas fomos ultrapassados pela República Checa e pela Grécia. Segue-se a Eslovénia.
Bastava termos dedicado uns minutos a ler o relatório da revista britânica The Economist e rapidamente teríamos percebido porque nos estamos a tornar no carro vassoura da Europa: reclamamos muito, mas exigimos muito pouco. Temos uma cultura que se dá à lamúria e quando nos perguntam o que queremos, é frequente respondermos que ‘tanto faz’, ou ‘escolhe tu’; E se nos perguntam como estamos, vamos ‘assim-assim’ ou ‘mais ou menos’. É típico dos portugueses, já dizia o Presidente Jorge Sampaio.
O ranking de 2022 diz-nos que somos uns empatas, num país onde o Estado não sai da frente e que em vez de subsidiar devia regular. Por isso, o relatório mostra-nos que não evoluímos na qualidade da governação e que nos alheamos das decisões e da participação política. Falta-nos exigência, ambição e avaliação. Andamos na tática e sem estratégia – tática faz-nos ganhar um jogo e estratégia faz-nos ganhar o campeonato. Não há objetivos e poucos querem saber do país que precisamos de construir. Para quem nos governa, o importante é sobreviver politicamente de hoje para amanhã.
Luís Marques Mendes, recentemente nas ‘Conferências da Sociedade Civil da RTP2’, realizadas na Porto Business School, quebrava a confidência de uma reunião em petit comité com uma alta representante da União Europeia, onde ficou a saber que a República Checa tem como ambição, em 2028, quando terminarem estes fundos de Coesão e Convergência que agora começaram a ser distribuídos, deixar de depender dos fundos europeus. Concluía o também Conselheiro de Estado que, por cá, já estamos preocupados em saber ‘quais os futuros fundos depois de acabarem estes fundos’.
A República Checa está a um lugar de ser considerada uma democracia plena. O país liderado pelo general Petr Pavel merece estudo, mas não é necessário ser cientista ou académico para rapidamente concluirmos que a explicação também está no relatório anual do The Economist. Os checos tornaram-se mais interventivos na participação política e na consciência dos problemas do seu país, o que faz com que os seus governantes sejam mais responsabilizados e os governem melhor, para além de já estarem a ultrapassar Portugal também nas liberdades civis.
Portugal é visado também no relatório do V-Dem Institute como uma das democracias eleitas onde se regista degradação das suas instituições democráticas. No ´Democracy Report 2023´, onde se avaliam os desafios das democracias face às autocracias, os investigadores da Universidade sueca de Gotemburgo também colocam a República Checa à frente de Portugal na qualidade das decisões tomadas e no acesso à igualdade de oportunidades.
Mas os checos não são os únicos, o mesmo está a acontecer com os gregos e os eslovenos que estão mais exigentes com os seus políticos e os estónios que se dizem mais bem governados do que os portugueses. Até os malteses têm bastante mais consciência política do que nós e sabem que o crescimento económico tem de andar a par do crescimento social, pois só assim se combatem as desigualdades.
Miguel Torga já escrevia sobre o que considerava um fenómeno curioso: «O país ergue-se indignado, moureja o dia inteiro indignado, come, bebe, e diverte-se indignado, mas não passa disto. Falta lhe o romantismo cívico da agressão. Somos socialmente uma coletividade pacífica de revoltados». Mas também nos passa depressa, até porque ao Portugal dos três ‘efes’ de Salazar – Fado, Fátima e Futebol –, a democracia deu-lhe mais um, o de Festivais. Com Fé e fezada, esqueçamos as lamúrias e rejubilemos porque o verão está a chegar e com ele vêm os concertos, o Papa e o Benfica vai ser campeão. E já passaram quase cinquenta anos.