A menos de 10 dias do Dia Mundial sem Tabaco, e de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o tabagismo é responsável por cerca de um milhão e 200 mil mortes todos os anos. Em Portugal, aproximadamente 20% a 26% da população é fumadora. Segundo um relatório da Direção-Geral da Saúde (DGS), mais de 13 mil pessoas perderam a vida em 2019 devido a doenças relacionadas com o consumo de tabaco.
De acordo com as últimas estimativas do Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), cerca de 11,7% das mortes ocorridas em Portugal em 2019 foram atribuídas ao tabaco. Do total de 13.559 óbitos registados, a maioria era composta por homens (10.815). Estima-se que 1.771 dessas mortes tenham sido resultado da exposição ao fumo ambiental, sendo 561 por doenças cérebro-cardiovasculares, 425 por infeções respiratórias, 312 por doença respiratória crónica, 242 por diabetes mellitus tipo 2 e 220 por cancro.
A faixa etária com a maior percentagem de óbitos relacionados com o tabaco foi aquela com idades compreendidas entre 50 e 69 anos, com 24,8%. O relatório do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo do Tabagismo (PNPCT) menciona que entre 85% e 90% dos casos de cancro de pulmão ocorrem em fumadores. Em 2020, o número de utentes atendidos em primeiras consultas de cessação tabágica diminuiu em 51,7% em comparação com o ano anterior, totalizando 6.129 utentes. Além disso, houve uma redução de 39,2% nas consultas de apoio intensivo à cessação tabágica, com um total de 25.486 consultas realizadas em Centros de Saúde e serviços hospitalares.
Dos 152 locais de consulta que permaneceram abertos em 2020, cerca de 62,8% das consultas foram realizadas presencialmente, enquanto as restantes foram conduzidas remotamente por meio de videoconferência ou telefone.
Em 2019, foram conduzidas 268 iniciativas estruturadas de prevenção do tabagismo direcionadas à comunidade a nível local. Essas iniciativas alcançaram um total de 192.013 pessoas, das quais 86.523 eram crianças e jovens em idade escolar. No entanto, devido à pandemia, houve uma redução significativa no número de atividades realizadas em 2020, com apenas 54 iniciativas, e uma diminuição na população alcançada, que foi de 14.651 pessoas, das quais 2.616 eram crianças e jovens em idade escolar.
“Como médica oncologista posso dizer que o tabaco é um enorme fator de risco para o cancro, mas não só, também para as doenças respiratórias crónicas e cerebrocardiovasculares”, começa por dizer Joana Bordalo e Sá, presidente da Federação Nacional dos Médicos. “Esta lei tenta transpor para a legislação nacional a diretiva europeia, através de uma série de proibições e tornando a venda de tabaco menos acessível. Entendo que a legislação deve, acima de tudo, proteger quem não fuma. Por isso, algumas das medidas impunham-se: como a proibição de fumar ao ar livre dentro do perímetro de locais de acesso ao público em geral ou de uso coletivo, tais como estabelecimentos de saúde, estabelecimentos de ensino, recintos desportivos, estações, paragens e apeadeiros dos transportes públicos”, explica.
“No entanto, as proibições, só por si, podem não resolver a redução do consumo de tabaco. Quem tem esta dependência vai continuar a comprar nos locais disponíveis e vai continuar a fumar. Era necessário dotar os serviços de saúde com mais consultas de cessação tabágica, a nível hospitalar, mas sobretudo ao nível dos cuidados de saúde primários, mas com a falta de recursos humanos, nomeadamente de médicos, é difícil”, constata a Assistente Hospitalar Graduada de Oncologia Médica no IPO do Porto.
“Quando temos 1,7 milhões de cidadãos sem médico de família, como pode a população ter acesso a uma consulta de cessação tabágica de forma universal?”, questiona. “Mas mais importante que proibir e remediar, seria fundamental prevenir. É necessária mais educação e literacia para a saúde para evitar a dependência do tabaco e de outras. Assim como devia haver um investimento, sério e forte, na promoção de hábitos de vida saudáveis, dieta e exercício”, salienta a profissional de saúde.
“O problema é que esta e outras dependências acontecem numa franja da população que é socialmente mais desfavorecida. E o país está mais desigual do ponto de vista social, há falta de emprego e de condições de trabalho dignas, de habitação a preço justo e comportável para as famílias, além de que pilares do estado social como a educação e a saúde estão em crise profunda”, lamenta, adiantando que “as soluções são apontadas todos os dias, mas infelizmente não se tem visto qualquer vontade política em fazer mudanças estruturais e medidas concretas para o país reverter esta e outras situações”, sendo que “a problemática da dependência do tabaco é apenas uma delas”.
Consumo de tabaco diminuiu também entre as mulheres
Em 2021, soube-se que Portugal havia cumprido a meta da redução de fumadores e do consumo entre mulheres, que vinha a aumentar desde 1987. Nos cinco anos anteriores, houve uma diminuição no consumo de tabaco em Portugal Continental, de acordo com o Relatório do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo do Tabagismo da DGS. Em 2019, 16,8% da população com 15 anos ou mais era fumadora, sendo que 14% eram fumadores diários.
Uma tendência positiva é observada entre as mulheres, que anteriormente apresentavam um aumento no consumo de tabaco desde 1987. No entanto, houve uma redução na prevalência do consumo entre as mulheres, passando de 13,2% para 10,9%, considerando-se também o tabaco aquecido.
Com a redução no número de fumadores e no consumo de tabaco entre as mulheres, o país alcançou dois objetivos do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo do Tabagismo (PNPCT) estabelecidos pela DGS, que foram cumpridos em 2020. Apesar da redução do consumo de tabaco em todas as regiões de Portugal, ainda existem assimetrias regionais. Por exemplo, no Algarve, a redução foi mais do que o dobro da registada no Alentejo.
A Região Autónoma dos Açores continua a ter as prevalências mais altas de consumo, com 23,4% de fumadores, seguida pela Região do Alentejo, com 19,1%. Entre os jovens de 13 a 18 anos, em 2019, os cigarros foram o tipo de produto mais experimentado, com 29,3% dos jovens que já fumaram. Em seguida, vieram os cigarros eletrónicos, com 22,2%, seguidos pelo cachimbo de água (shisha), com 15%, e o tabaco aquecido, com 4,9%.
No que diz respeito ao consumo nos últimos 30 dias antes do inquérito, verificou-se que 13,4% dos jovens consumiram cigarros, 4,7% consumiram cigarros eletrónicos e 3,7% consumiram tabaco para shisha.