Por Luís Castro, Jornalista
Porque chapéus há muitos, lá do Palácio das cantigas, quando o Pai virou tirano, o Costa desceu do Castelo e foi à bola. E pelo Tatão, os Chicos goelaram: «Ó inclemência! Ó martírio! Estará porventura periclitante a saúde desse nobre e querido menino d´oiro?». Mas não, ele coisou os lobos e prometeu-lhes dançar até as solas gastar. E foram todos sebastianar para a pensão ao lado porque a perfumaria vai entrar na moda, não tarda nada. Eles apaixonados, os outros danados.
E como ela lhe marcou a entrada – mas falhou a saída -, e com os polícias e os bombeiros a caminho, vozeia a contrarregra: «Ó seu cavalo!!! Então você foi-me pôr em cena o telefone verdadeiro???». Mas o mais novo já pedala a fugir da carreta e gargalha: «Nem tu, velha carcaça, escaparás ao meu ódio!». Do balcão, o líder da claque entoa: «Esse-el-bê! Esse-el-bê!». Ao lado, o Vítor não percebe nada, mas levou um cartaz. Pegam-se à Reguada. No final, fica 3-1, pró Sporting.
O povo assobia enquanto o Costa desce de Rabelo, mas algum malvado lhe bombou a vinhaça das pipas e encheu-as com pedras da calçada. Vai pesado e só a dois palmos da água. Querem-no borda fora. O Falcão, esse, ficou sem companhia e lá do alto protege o peregrino no Douro; os abutres, que vieram do Egito extremado, esperam picar-lhe as entranhas. Tiraram as ligaduras e alguém lhes abriu o sarcófago. Dizem que tem nome de Rio.
Insistem que vai em fuga e que ao passar na Ribeira haverá de levar umas marteladas. Mas, da Costa não se viu Rui. Talvez as bordoadas sejam mais lá para baixo, em Espinho, que fica apenas a algumas fogaças de S. João da Madeira – o eixo do mal que lhe quer dar uma comichão europeia. Os dois, que se cruzaram pela universidade e querem o mesmo poleiro, já se engalfinharam há uns anos. Ao intervalo, ia 1-0 pró Espinho.
Acertam-se eles nos balneários enquanto nas bancadas contamos nós as coroas para um fino, ou uma súrbia – porque imperial é na mouraria e a inbicta é mui nobre e liberal. «Irra, peça licença!», reclama o ainda senhor do Castelo. «Comigo é sempre prá frente!», responde-lhe o cobiçoso e destemido arqueiro com mais uma flechada no flanco. Da bancada norte, lá no Lima, gritam que só querem ver Lisboa a arder! Estão desatentos. Já arde.
«Prrriu!» Ó bai-me à loja! Há que alapar. O leão de S. Bento põe toda a linha avançada em modo de picó-boi – Albano descobre o aloquete, Travassos arreganha a taxa, Barrigana tem uma breca e Peyroteo avia-lhe um molete. «Carago, ainda vais levar uma cabazada!», grita o Outro que lhe promete des-Glória. Adianta-te um grosso, «prognósticos é no fim do jogo», bitaita o Pinto – ao Costa. Ficaram com o toco e deram frosques, antes que se esbardalhem.
Fumega o comboio, mas a bitola não acerta. São zero horas e o relógio dá sete meia. Acertaram pelo de S. Bento, o de Lisboa. Simplício Costa volta para o seu Castelo. Há uma caixa-forte para guardar enquanto não vem mais lanha para se queimar. Enquanto isso, o Marquês, que também já foi menino, vocifera: «Misére! Misére! Já ninguém se importa com a minha saúde!». Saem mais umas gotas, antes que volte o berreiro.
Por agora as bobines do Tatão ainda estão frias. A onda bate-lhe na lâmpada e recua – é por isso que o som quer sair e não pode. Está a aquecer a máquina. Mas o Evaristo ainda tem cá disto e a agulha do Tatão não chega-chega. Só pica-pica. A trombeta há de tocar.
E quando terminar a cura do repouso, com mãos na cintura, cabeça levantada e de sorriso nos lábios, sairá o faduncho da saudade. Os cadetes suspiram: aquilo não é um homem, é um tambor. «P´la-Tatão; P´la-Tatão; Tão, Tão!», gritará o povão de punho esquerdo erguido na mão. Ouve-se que lhe vêm uns ares da Ericeira. E ós-depois?! Até lá, «Aguenta-te Costa!».