Vamos falar de direita

O Chega é o partido de um homem só, sem quadros, e André Ventura é demasiado narcisista e individualista, tornando-se facilmente um fator de desestabilização.

Uma pergunta que hoje todos fazem é esta: como será possível haver um Governo de direita sem o apoio do Chega?

Conseguirá o PSD chegar à maioria absoluta?

E se ganhar as eleições com maioria relativa, o Chega disponibilizar-se-á a viabilizar o Governo mesmo não participando nele?

Ou o PS abster-se-á, para não tornar o Governo dependente da extrema-direita ‘racista e xenófoba’, como os socialistas dizem?

São tudo perguntas sem resposta.

É impossível adivinhar.

Mas é preciso começar a discutir este problema, pois o cenário vai inevitavelmente colocar-se.

Montenegro não parece capaz de criar uma ‘onda laranja’ que leve o PSD à maioria absoluta.

E o Chega, com os valores indicados pelas sondagens, dificilmente deixará de ser imprescindível para a existência de uma maioria de direita.

É neste contexto que Fátima Bonifácio perguntou neste jornal: ‘E por que não?’

Por que não um Governo com o Chega ou o apoio do Chega?

Eu vejo a questão muito difícil, não por preconceito, não por medo do ‘racismo’ e da ‘xenofobia’ do Chega, mas por outras duas razões: o Chega é o partido de um homem só, sem quadros, e André Ventura é demasiado narcisista e individualista, tornando-se facilmente um fator de desestabilização.

Um Governo dependente do Chega não duraria muito.

E, no entanto, acho que um partido como o Chega faz falta ao sistema, pela simples razão de que o atual modelo político não tem futuro – e os partidos do sistema não estão afins de o modificar.

Como escrevi há semanas noutro local (Viver para Contar), Portugal encontra-se hoje metido num círculo infernal.

Que é este: temos um Estado-providência muito pesado (com gastos gigantescos na educação, na saúde e na segurança social, com muitos subsídios a gente que não trabalha, com encargos cada vez mais elevados nas pensões de reforma, visto que a população está a envelhecer), e este Estado exige, para se financiar, uma carga fiscal enorme; ora, esta carga fiscal asfixia a economia, levando a que os salários sejam baixos; e os salários baixos favorecem a emigração dos mais qualificados e desincentivam o trabalho dos menos qualificados, que preferem ficar em casa a receber o RSI ou o subsídio de desemprego; e estes subsídios, juntamente com todos os outros encargos, representam uma despesa enormíssima para o Estado, que obriga a uma brutal carga fiscal. E assim se fecha o círculo.

Os países desenvolvidos conseguem viver com este modelo de Estado-providência – embora cresçam cada vez menos – mas Portugal, no estádio de desenvolvimento em que se encontra, não consegue.

Para Portugal, este modelo é fatal.

Constitui um travão ao desenvolvimento.

Assim, nunca vamos sair da cepa torta.

Estamos muito contentes com o crescimento à volta de 2,5% previsto para este ano, que será dos maiores da União Europeia, mas precisaríamos de muito mais para não nos atrasarmos em relação ao pelotão da frente.

É que, em termos de volume, os 2,5% do PIB português representam uma migalha comparativamente ao 1% numa economia desenvolvida.

Trata-se de um caso típico em que as percentagens enganam.

Se o PIB de um país passar de 100 para 102,5 crescerá os tais 2,5%; mas se passar de 500 para 505, crescerá apenas 1% – e no entanto, em termos de volume, crescerá 2 vezes mais e aumentará a distância para o outro.

Portugal precisaria de um Governo que rompesse com aquele círculo infernal.

Mas o PSD não o fará.

Os partidos do sistema não o farão.

Daí a importância de um partido como o Chega para agitar as águas.

Para ganhar peso, porém, não lhe bastará conquistar eleitores; tem de ser capaz de atrair quadros, de deixar de ser o partido de um homem só, e de abandonar certos excessos.

É nesta encruzilhada que Portugal se encontra.

Ou o PSD se assume como um partido capaz de fazer ruturas e de pôr em causa o politicamente correto – afastando-se de um certo ideário social-democrata que é bem-intencionado mas neste momento é utópico – ou o Chega ganha corpo e alguma respeitabilidade, tornando-se uma verdadeira alternativa.

As coisas como estão, com um Montenegro sem coragem para pisar o risco e um André Ventura demasiado enfant terrible, é que não levam a direita a lado nenhum.

Assim, neste momento, por muito que custe a alguns, a direita não é alternativa.

Só que a realidade tem muita força – e o que estamos a ver pela Europa fora são coligações que juntam a direita e a extrema-direita.

E chegará a vez de Portugal.