Aeroporto de Lisboa: os custos que Governo e Comissão escondem

Não vai ser fácil. Basta percorrer o Portugal da expansão urbana que segue a migração da população rural para as grandes cidades do litoral, desde os anos cinquenta. Na esmagadora parte dos casos não houve planeamento urbano.

por Sérgio Palma Brito

Autor de TAP, €3.200 milhões depois, que futuro? Militante do Partido Socialista

 

Portugal, Lisboa e o Aeroporto Humberto Delgado não podem esperar 10 ou 12 anos pelo novo aeroporto e sua Cidade Aeroportuária. É preciso um aeroporto de transição. O novo aeroporto tem custos escondidos.

 

1. Interesse do país impõe rápido ‘aeroporto de transição’ 

*‘aeroporto de transição’ 

e ‘infraestruturação urbana muito próxima’

O novo aeroporto demora 10 a 12 anos e prolonga a perda de receita turística, e degradação da imagem de marca (reputação) do país e do destino Lisboa.

Está em causa o interesse nacional, que exige um compromisso sobre medidas excecionais para apressar a entrada em serviço de ‘aeroporto de transição’. 

O ‘aeroporto de transição’ é o projeto Portela + Montijo, acordado entre Estado e ANA em janeiro de 2019, financiado por esta, sem custo para o contribuinte, e com Declaração de Impacte Ambiental aprovada. Repito, sem custo para o contribuinte.

Em entrevista recente, Gonçalo Byrne é claro: «Se a solução, por exemplo, for como aquela que está, Portela e Montijo, já há infraestruturação urbana muito próxima. Agora, se for para Alcochete, se for para Pegões… o que eu sei é que vai resultar numa pressão urbanística brutal. E os municípios, que estão articulados, já sabem disso. Vemos já enormes pressões urbanísticas». (Público, 2023.07.02).

 

*Coragem política 

– precisa-se

O ordenamento do território tem base cultural sólida. Foi a aplicada no Algarve pelo Plano Dodi, inspirado pelo ministro Arantes e Oliveira, e formalizada mais tarde por Ian McHarg. Na quintessência, compatibiliza diversos graus de exigências de preservação e de desenvolvimento.

O ‘aeroporto de transição’ responde positivamente a esta análise. Tem impactes ambientais, mas cria valor para a cidade e país, isto é, para os portugueses.

Vai ser combatido pelo ambientalismo radical de fachada mais ou menos científica que, na sanha de tudo afirmar proteger, desprotege o homem. Esta sanha tem de ser contrariada com argumentos de base técnica e científica do modelo ‘compatibilizar’ a apoiar forte determinação política.

Vivemos momento de verdade em que o país precisa da coragem política do primeiro-ministro e do líder do principal partido da oposição para tomar e impor esta decisão. Sem excluir, claro outras forças políticas.

Não falo em seu nome, mas estou autorizado a referir Associação da Hotelaria de Portugal e da Associação o apoio deste compromisso pela a Confederação do Turismo de Portugal, da Associação da Hotelaria de Portugal e da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo.

2. O elefante branco na Comissão Técnica Independente 

*O hub da CTI é a Cidade Aeroportuária e não o da TAP

A cidade aeroportuária é o elefante branco nos trabalhos da Comissão Técnica Independente. Na apresentação de 2023.04.27, a CTI considera o hub intercontinental da TAP no aeroporto de Lisboa. Depois, designa hub algo de muito diferente: 

-«Um hub em Lisboa, além de ser uma entrada / saída para os nichos de mercados tradicionais de África, América Latina e América do Norte, potencia a conectividade com outros mercados, conferindo ao país maior capacidade competitiva em termos ibéricos, europeus e, fundamentalmente, Globais».

Esta definição é a da cidade aeroportuária, ausente nos trabalhos da CTI. É o que leva Gonçalo Byrne a declarar: «Quando vejo a constituição das valências desta comissão técnica, a componente urbana não está lá».

 

*Aeroporto em espaço rural exige Cidade Aeroportuária importante

A CTI utiliza ‘aeroporto greenfield’ a sublimar os aeroportos em espaço rural de Canha e S. Vicente do Paul, batizados de Alcochete e Santarém.

Ainda segundo Byrne, «a opção a conhecer em 2024 gerará operações imobiliárias brutais e teme que os instrumentos de planeamento e ordenamento do território sejam insuficientes para moderar essa pressão». 

Ambos são aeroportos em espaço rural, indissociáveis de cidade aeroportuária, fruto de duas dinâmicas. A de alojar percentagem elevada dos cerca de 12.000 trabalhadores no futuro aeroporto. E a de atrair pessoas, instituições e empresas qualificadas que vão formar o hub proposto pela CTI.

É esta cidade aeroportuária que preocupa Gonçalo Byrne e deve preocupar os portugueses. 

O planeamento urbano está ausente dos trabalhos da CTI por decisão política a que esta deu cobertura ‘técnica e científica’. Governo e CTI estão a tempo de reparar rapidamente o erro. 

 

3.Planeamento urbano prévio e custo da cidade aeroportuária

*Planeamento Urbano prévio

De novo a Gonçalo Byrne: «Mas é estranho que as outras especialidades, das arquiteturas, não estejam presentes. Não só da arquitetura como pensamento, conceção, com uma visão… diria holística, de tudo. E as consequências do que é esta ‘cidade’ aeroportuária a funcionar no futuro. Porque, se elas não são contempladas, vai acontecer aquilo que aconteceu com os outros aeroportos. O aeroporto da Portela, como cidade, é um desastre».

Não vai ser fácil. Basta percorrer o Portugal da expansão urbana que segue a migração da população rural para as grandes cidades do litoral, desde os anos cinquenta. Na esmagadora parte dos casos não houve planeamento urbano.

Se houver coragem para localizar a cidade aeroportuária em terreno público… está dado o primeiro passo do sucesso, por castrar a especulação imobiliária de transformar solo rural em urbano.

A cidade aeroportuária, indissociável do aeroporto em espaço rural, tem de assentar em planeamento urbano prévio, apesar deste prolongar os problemas atuais do AHD, do destino Lisboa e do país.

 

*Esta Cidade Aeroportuária tem custo nunca estimado

A CTI escamoteia os custos do aeroporto. Caso de aerogare, pistas etc. em terreno não preparado. Mais as infraestruturas urbanísticas públicas. E, sobretudo, acessibilidades faraónicas que incluem a terceira travessia sobre o Tejo. 

A freguesia do Parque das Nações dá uma ideia do que será a cidade aeroportuária. São 5,44 km² de área e população de 22.382 habitantes em 2021 (INE).

Para os 12.000 trabalhadores no AHD e suas famílias há custos muito importantes. Há os pessoais (reorganizar trabalho e escolas de filhos, etc.), os sociais (perda da identidade local), os económicos (habitação e outros), os macroeconómicos (alocar recursos) e os dos serviços públicos.

O investimento em infraestruturas urbanísticas e serviços públicos será investimento do Estado e da autarquia. O dos serviços será custo de empresas. O investimento da habitação fica a cargo dos particulares.

Aeroporto e cidade aeroportuária criarão as dinâmicas económicas, sociais e culturais na base do sucesso que a CTI assume? Ainda pagamos obras faraónicas sem relação com a sociedade e economia do país. O aeroporto em espaço rural e sua cidade aeroportuária correm risco sério de ser mais uma destas obras. E os contribuintes pagam.

 

4. Portugueses, acordai!