por José Maria Matias
Aluno do mestrado de Ciência Política e Relações Internacionais na Universidade Nova de Lisboa
As eleições espanholas conduziram a um novo impasse político, difícil de ultrapassar e com desfecho imprevisível. As eleições em Espanha são sempre relevantes para a realidade portuguesa, no quadro da Península Ibérica e como forma de compreensão das tendências políticas. Tomei a liberdade de deixar alguns pensamentos sobre o que aconteceu:
O PP foi o partido mais votado, mas não terá condições para governar. Para conseguir governar, o PP precisaria que o PSOE se abstivesse durante o processo de investidura. Numa campanha marcada pela demarcação do PP em relação ao VOX e pelo anti-sanchismo, o exercício aqui colocado era no mínimo estranho. Não me lembro de nenhuma sondagem em que o PP aparecesse com a possibilidade de conseguir uma maioria absoluta sozinho, sendo assim, ficaria sempre dependente do VOX ou do PSOE. Não se pode demonizar os partidos e depois esperar que eles cedam no essencial. As pessoas que votaram no VOX ou no PSOE, recusaram o programa do PP. Ou seja, houve mais pessoas a rejeitar o PP do que a aprovar o PP.
Apesar de sair derrotado nas eleições espanholas, o VOX conseguiu resistir à pressão da polarização levada a cabo tanto pelo centro-direita como pelo centro-esquerda. O VOX perde 600 mil votos, ficando com cerca de 3 milhões de votos. Num contexto de grande hostilidade contra o partido, o VOX conseguiu resistir a algo que o Ciudadanos não conseguiu. É evidente que a atual derrota é dura de digerir, no entanto, no médio prazo, o VOX continua com todas as condições para se afirmar como o grande partido de direita em Espanha. Numa época de grande instabilidade política e com perspetiva de regressar rapidamente a um novo ciclo eleitoral, o VOX pode tirar daqui as suas lições. Mais importante de tudo: o VOX manteve-se como a terceira força política.
O PSD pode olhar para Espanha e perceber que não pode contar com o PS para nada, mas tem de interiorizar que nunca mais irá ter uma maioria parlamentar sozinho. Hostilizar o CHEGA, ou recorrer ao desespero do voto útil não é suficiente para vencer eleições e poder governar. Se não perceber, passará à irrelevância política.
O CHEGA tal como o VOX, apesar de serem partidos diferentes, vão ser chamados a fazer um exercício complexo: como manter a sua popularidade e o seu eleitorado e ao mesmo tempo conseguir diminuir a taxa de rejeição que têm em alguns espetros da sociedade. No fundo, como é que vão conseguir institucionalizar as suas visões políticas e soluções que apresentam na sociedade, de forma a serem partidos de governo, sem com isso perder a sua identidade?
A americanização da política na Europa pode trazer um grande desgaste à sociedade e aos seus líderes. Uma eleição na Europa não é necessariamente o tudo ou nada, como nos Estados Unidos ou no Brasil. Partidos como o CHEGA e o VOX poderão ter de, em algum momento, pensar nas suas referências. Será mais interessante olhar para o Brasil e Estados Unidos, ou para a Hungria? Orbán precisou de mais de 20 anos para ter as condições políticas para governar. Não terá valido a pena?
Fez este mês dois anos que comecei a escrever no Semanário Sol, a quem estou muito agradecido. Em julho de 2021 escrevi sobre os 3 desafios que a Direita portuguesa teria de responder: a sua relação com Espanha, a sua posição na União Europeia e a sua dependência da China. Esses desafios não mudaram, mas acrescento um quarto desafio fundamental: fazer o povo português acreditar que pode ter uma vida melhor no seu país. Só assim se derrotará a mediocridade e colocar-se-á um fim ao ciclo do PS.