Olarilolé, olarilolei

As linhas vermelhas que afastam o Vox do arco da governação, como não acontece estranhamente com nenhum partido da esquerda radical, são as mesmas que o PS em Portugal procura traçar entre PSD e Chega para evitar qualquer solução alternativa que passe pela soma dos dois.

As eleições espanholas deixaram o país vizinho na iminência de uma nova ida às urnas dentro de meses. No domingo passado, o escrutínio resultou numa vitória de Pirro do PP liderado por Alberto Nuñez Feijóo, já que esta foi à custa de uma significativa perda do Vox de Santiago Abascal, e a direita, feitas as contas, não logrou a maioria no Parlamento.

À esquerda, porém, o PSOE de Pedro Sánchez também ficou condicionado a uma ‘geringonça’ alargada a independentistas, sendo que os da Catalunha vieram quase de imediato afastar a possibilidade de um entendimento sem prévia garantia de satisfação de todas as suas – aliás, inconstitucionais – reivindicações.

Por isso, na noite de domingo passado, assistimos a um patético desfile de reações de um conjunto de líderes partidários que, saindo todos derrotados, celebraram os resultados como se tivessem obtido uma retumbante vitória.

Cá, como lá, os comentários de dirigentes partidários e de destacadas personalidades do meio político e mediático foram igualmente ridículos.

Sobretudo para quem, face à vantagem da direita atribuída pelas sondagens até às vésperas do dia eleitoral, classificou os resultados como uma vitória da democracia. 

Para a esquerda portuguesa, a democracia nada tem a ver com a vontade do povo. Ou melhor, só há democracia quando a vontade do povo coincide com a das forças políticas à esquerda.

O respeito por quem pensa e defende ideias ou projetos não estatizantes, assistencialistas ou socializantes, para esses autoproclamados donos da democracia, não existe.

Para esses, aliás, Pinochet era um ditador e Fidel um libertador do povo explorado e oprimido.
Como se houvesse diferença entre um louco nazi fascista como Hitler e um facínora marxista-leninista como Estaline.

O que se passou nas eleições em Espanha devia servir de lição para os espanhóis, mas igualmente para os portugueses.

As eleições devem ser um momento de clarificação e de escolha política, e não o contrário.

Por mera coincidência, na sexta-feira imediatamente anterior à ida às urnas dos espanhóis, realizou-se a primeira metade da reunião do Conselho de Estado convocada pelo Presidente Marcelo em plena crise Galamba.

Um Conselho de Estado para avaliar a situação política e económica da nação ao fim de ano e meio de uma legislatura de maioria absoluta socialista recheada de trapalhadas, más escolhas, demissões, incompetências, descoordenações, desautorizações, enfim, de um rol de escândalos e casos que já teriam dado para deitar abaixo meia dúzia de governos.

E se, há semanas, quando foi pré-anunciado, se discutia a possibilidade de interrupção abrupta da legislatura dado o estado comatoso do Executivo socialista, agora a situação está de tal forma invertida que foi o primeiro-ministro quem impôs a suspensão do Conselho de Estado para depois das férias, porque tinha mais que fazer – não há memória, nunca se viu, mas mostra quem manda no país e na agenda política nacional.

António Costa pode até ter sentido um amarguinho na boca quando os resultados das eleições gerais espanholas foram anunciados – afinal, Pedro Sánchez ainda não está totalmente descartado para quando chegar a hora de baralhar e dar de novo os lugares chave na Europa –, mas tirou a prova dos nove de que o nó cego em que, lá como cá, a direita está a deixar-se enredar é a melhor garantia de eternização da esquerda no poder.

As linhas vermelhas que afastam o Vox do arco da governação, como não acontece estranhamente com nenhum partido da esquerda radical, são as mesmas que o PS em Portugal procura traçar entre PSD e Chega para evitar qualquer solução alternativa que passe pela soma dos dois. E o PSD está a deixar-se condicionar tal como o PP de Feijóo – o que lhe foi fatal.

O mesmo PS que chegou ao poder gabando-se de ter transformado duas forças políticas anti-sistema – PCP e BE – em dois partidos do tal arco da governação.

Se houvesse decência e coerência na política… Mas isso, para a esquerda no poder, não interessa nada, porque a política é como a música chiclete: mastiga-se quando e como se quer e deita-se fora.
E não é neste país que a música mais pedida no Spotify e que anda na boca de toda a gente tem como refrão ‘Olarilolé, Olarilolei’ e como intérprete quem dá pelo cognome de ‘Máfama’? Pedro Simões é muito mais compositor (são dele outras letras de sucesso do último álbum da namorada, Ana Moura) do que cantor, mas lá que é artista a ditar versos daqueles que entram e ficam no ouvido da populaça… Ainda por cima com o título de Preço Certo e a voz inconfundível de Fernando Mendes a indagar: «Quer mandar beijinhos para alguém, minha querida?».

E não é disto que o povinho gosta? Olarilolé, olarilolei. Mastigue-se e deite-se fora.