Há largos anos, atravessar o Jardim da Estrela a caminho do Pedro Nunes era para mim trajeto obrigatório. Com a primavera, que chegava vibrante como a adolescência, surgiam as ciganas. A empatar o colorido da estação, as ciganas contrastavam nas suas vestes escuras . Mas tinham tanta treta como os pássaros. Dia sim, dia não, eu era travada por uma delas, que me lia a mão para deitar o olho ao destino. Nessa altura havia tempo para tudo, e eu pelava-me por ouvir uma história. Sobretudo quando era falsa. Nuno Santos fez-me lembrar esses tempos. Ele lá deitar as sortes, deita, mas alguém acreditará? As pessoas, em casa, não viram o que eu vi? As câmaras da TVI não estavam em frente à mansão de Armando Pereira, o cofunfador da Altice, a filmar a chegada de um camião que trazia os seus carrões de estalo antes que os investigadores da Operação Picoas, que esperavam o mesmo para lhes deitar as mãos, saltassem dos carros onde aguardavam discretos?
A cartomante de Queluz de Baixo lança cartas apenas para, qual mulher despeitada, se vitimizar e tentar limpar a imagem da estação Há coisas, ainda do tempo da RTP, que o acompanham como um chocalho. Dizer que são falsas as notícias que o Nascer do Sol tem vindo a publicar serve-lhe de pouco. Como poderá negar os factos?
Armando Pereira disse aos investigadores, e repito, que os jormalistas daquele canal tentaram chegar à fala com ele na véspera das buscas mas que se recusou a prestar declarações.
Com que base o diretor da estação nega? Falou com o próprio? Não me parece, mas eu sei que a TVI tem uma fonte no processo. O que é normal. Mas apenas uma, que será aliás tão cativante como uma cartomante. Contudo, para quê, em jeito de varrer a testada, dizer que "os jornalistas da TVI foram apurar o que é que foi efetivamente dito nos interrogatórios", se os autos depois de terem ido ao juiz de instrução ainda não foram devolvidos ao Ministério Público? E introduzir nesta épica uma "professora universitária que nada tem que ver com a comunicação social" como sendo a responsável por ter avisado os arguidos é apenas criar ruído com uma figura-mistério.
A escuta que o Nascer do Sol publicou na sexta-feira parece clara. Pelo menos (e ainda está por confirmar se não foi antes), os jornalistas da TVI chegaram na véspera de manhãzinha ao local. Tomaram assento num café das vizinhanças e falaram como se as paredes ainda dormitassem. Claro que a nova chegou célere aos ouvidos do magnata. Mas não eram precisas tantas voltas. Nessa escuta com um primo, captada nesse dia, este último avisou: "Liguei-te de manhã porque me ligaram a dizer que havia jornalistas que te procuravam". Ao que o outro respondeu: "Todas as pessoas que tem saído e entrado da minha casa hoje, me contaram que eles colocaram a câmara na estrada e esperaram… mas não é grave, eles não me conseguiam ver, colocaram a câmara no largo e depois em frente à porta. É a TVI de Portugal".
Entretanto, nesse mesmo dia, o genro do homem da Altice, que chegara para uma temporada de férias, deixou a mulher para trás, depois de saber da presença da equipa da TVI, e pirou-se.
Mas tudo isto, para Nuno Santos, é falso. Falso, falso. Encalha sempre no mesmo vocábulo. Vá mas é à bruxa.