por Alexandre Faria
Escritor, advogado e presidente do Estoril Praia
Espanha pode ter resistido a uma queda abrupta no extremismo, mas a Europa continua ameaçada por uma viragem ideológica, progressiva e perigosa, colocando em risco os alicerces democráticos inerentes à sua própria construção institucional. Apesar do desemprego em baixa e com um salário mínimo a subir, os espanhóis evidenciam sinais preocupantes que os aproximam da Hungria, da Polónia ou de Itália, com uma franja política portuguesa à espreita da oportunidade daí surgida, de modo a demonstrarem essa hipotética exequibilidade futura, à qual acrescem os riscos das decisivas eleições em França no próximo ano.
No panorama e contexto atuais, a encruzilhada europeia revela não estar em causa a economia ou o crescimento económico, tratando-se apenas de decisões acerca do ideal de sociedade desejado para os próximos tempos. E são duas visões do mundo completamente distintas. Ou optamos por uma sociedade inclusiva, integradora, respeitadora e defensora dos direitos humanos, dos direitos das mulheres e das minorias, do caminho em prol de um desenvolvimento sustentável e respeitador da Natureza, ou cedemos aos discursos fáceis e populistas, oportunistas e destruidores dos princípios da liberdade e da igualdade.
Perante estas ameaças institucionais, Portugal deve privilegiar a sua história comum, instigando a relevância que possui no quadro mundial graças à Lusofonia, aproveitando as portas abertas noutras comunidades e as pontes possíveis a estabelecer entre diversas regiões e os países, ajudando a Europa a superar os seus obstáculos radicais.
Alguns passos significativos têm sido dados e merecem ser aprofundados internamente, de modo a não se perderem oportunidades. Desde a 28.ª Cimeira Ibero-Americana, realizada em março passado em Santo Domingo, na República Dominicana, onde se reforçou a cooperação entre a comunidade ibero-americana e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, tornando as duas comunidades membros observadores recíprocos e formando uma aliança para a transição energética, à recente cimeira entre a União Europeia e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, ocorrida em Bruxelas, com avanços relevantes nas áreas económica e energética, Portugal conseguiu demonstrar um importante papel de intermediação. Quando um acordo comercial entre a União Europeia e o espaço Mercosul abrange 25% da economia global e 780 milhões de pessoas, quase 10% da população do mundo, facilmente se depreendem as vantagens daí oriundas.
Trabalhando em conjunto e partilhando valores comuns, o aprofundamento da relação entre a Europa, a Comunidade Ibero-Americana, a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, onde os laços se estreitam através de Portugal, encontramos os desafios mais singulares do ponto de vista geopolítico, correspondendo aos desejados modelos de sociedades multiculturais e livres.