Por Luís Castro, Jornalista
Em japonês chamar-lhe-iam o ‘Taki-Tali-Takolá’; em angolês, o ‘Pato-Cazumbi’ – o bangão que está em todas, o mamoite mais simpático, aquele que quando chega faz tchilar as luzes como que por magia. Na Bíblia, dir-se-ia que Deus está em todo o lado, mas que o kota Marcelo chegou primeiro.
Ele foi a todas, menos ao Parque do Perdão, não fosse alguém arrancar-lhe os pecados – não os remorsos, que os não tem – e o pusessem de penitência por uma semana. Talvez lhe trocassem a expiação por um retiro de silêncio no Caramulo ou trabalho cívico com os sem-abrigo, mas sem câmaras de televisão atrás – haveria lá contrição maior.
Há microfones no ar, balufas para atirar e selfies para sacar. O ‘papa-diretos’ virou festivaleiro e tirou a semana, pelo meio ainda teve tempo para beijocar as jogadoras da bola, já que os que dão aos braços em borboleta ou mariposa não têm estilo suficiente para merecer diretos na televisão.
E quando o protocolo não o deixou partilhar protagonismo com Francisco, Marcelo chegou mais cedo, procurou os jornalistas, debruçou-se nas grades ou espreitou atras do palco. Há pecados com aparências de virtude. Já Moedas mostrou que se os artistas são vaidosos, os modestos não precisam de se pôr em bicos de pés e ser espalhafatosos. Os discretos não enchem horas de televisão porque há obra para deixar.
Francisco não sabe, mas em Portugal só se tornam luminosos aqueles que se colocam sob os holofotes; que gostamos mais de circo, mesmo que nos falte o pão; que se privilegia a emoção em detrimento da reflexão; que uns passam o dia a escutar atrás da porta, outros a olhar pelo buraco da fechadura; que preferimos contestar a conhecer; que não falta quem duvide e descreia.
Bastaria revisitar o discurso de Cavaco Silva, de há trinta anos, quando deu posse a Cardoso e Cunha como Comissário-geral da Expo-98, para perceber que perante uma grande empreitada, os velhos do Restelo continuam vivos e a vaticinar-lhe o fracasso, que ‘diminuem a sua terra e a sua gente’ e que ‘com eles nunca chegaríamos à Índia nem a terra nenhuma’. O pessimismo é excelente para os inertes. A Jornada Mundial da Juventude Católica mostrou que eles continuam a manear a cabeça e ganharam ecrãs e microfones.
Triste país de pífaros sibilantes, em que a política se tornou ruidosa e onde todas as decisões dos governantes têm de ser justificadas com números. Tristes de nós, conformados com o sofrimento dos que orbitam à nossa volta. Quando deixaremos de venerar os engenheiros do caos? Quando voltaremos a ser a Pátria dos corajosos? Porque parámos de fazer perguntas? Porque nos fazemos de surdos?
Francisco citou São Tomás Moro, o mesmo que perguntava porque castigávamos os jovens por culpas e pecados que não são deles. Por estes dias, o Papa pediu aos políticos que pratiquem o ‘apostolado da orelha’ – que saibam escutar – e aos jovens que caminhem sem medo, mas a JMJ acabou e eles ficaram na mesma – sem esperança e sem caminho. E o que faz um jovem quando não tem trabalho? Que estrada escolhe quando lhe roubamos o futuro?
E Portugal, o que tem para lhes acenar? Basta ler as notícias dos últimos dias para reler o que já sabemos – os jovens portugueses são dos mais qualificados da UE, mas em maior risco de pobreza e exclusão social; 9 em cada 10 acabaram o secundário e 3 em cada 10 têm formação superior, mas ganham menos de 950 euros. Uns estão desempregados (20%), outros têm vínculos de trabalho precário (60%) e mais de metade não é feliz no trabalho. Também por isso, 1 em cada 4 já pensou suicidar-se e só saem de casa dos pais depois dos trinta anos.
Os jovens são a grande tragédia do nosso tempo. Quando vamos olhá-los no rosto e ouvir as suas histórias? Quando deixaremos de ter medo porque são diferentes? Eles são criativos, causam tensão, mas fazem crescer a humanidade. Francisco partiu e os Festivais estão a acabar, mas o triste e dramático Fado dos jovens vai continuar. E agora, Presidente Marcelo, o que tem Portugal para lhes oferecer para além das suas selfies?