Algarve. O paraíso dos anos 60 e 70

O Algarve está em linha com o turismo internacional, mas tempos houve em que quem chegasse do Reino Unido ou do norte da Europa tinha pouco mais do que sol, mar e grandes areais.

Muito antes de se tornar moda e ser ponto de encontro do jet set nacional e internacional, já as praias algarvias eram um local de encontros e de lazer de veraneantes algarvios, alentejanos e espanhóis. Os mais antigos diziam que o banho de mar acalmava os nervos, por isso era ver ricos e pobres nas mesmas praias, embora não se cruzassem.  Durante a Guerra Civil de Espanha (1936-1939), os mais abastados fugiram para o Algarve e alguns industriais acabaram por se fixar no sul do país. Nos aposentos do Hotel Bela Vista, em Portimão, pernoitaram desde políticos republicanos até à realeza.

Na década de 60, o conceito de turismo ganhou importância devido à publicidade centrada nos valores turísticos nacionais. Contudo, o grande impulso foi dado com a inauguração do aeroporto de Faro, em julho de 1965. Sem essa infraestrutura, o Algarve não teria dado o salto que deu. 

O sul do país começou a ser procurado para férias por causa das praias e do clima. As pitorescas vilas piscatórias tornaram-se um cartaz turístico de uma região onde estava tudo por descobrir. Em 1970, o Algarve ultrapassou o milhão de turistas, com a particularidade de muitos se terem radicado em definitivo na região. 
O empresário e escritor luso-brasileiro André Jordan idealizou e concretizou alguns dos empreendimentos de maior dimensão e qualidade, casos da Quinta do Lago e de Vilamoura, e foi grande responsável pelo desenvolvimento económico, social e cultural do Algarve. Em 2014, foi considerado pelo World Travel Leader Awards uma das 12 personalidades mais influentes no turismo a nível mundial.

André Jordan instalou-se no Algarve em 1972 e foi graças ao seu empreendedorismo e visão futurista que a região se tornou uma referência turística em todo o mundo. Quando chegou, encontrou uma realidade diferente daquela a que estava habituado da sua passagem por outros países. “O Algarve era muito pobre, não tinha nada. Não havia comércio, apenas algumas mercearias familiares, não havia cinemas e muito menos museus ou bibliotecas. Não tinha nada relacionado com o turismo, o que maisse via era carroças nas estradas, era uma realidade bastante patética”, lembra o comendador André Jordan. A atividade económica era também muito limitada: “Era a pesca que sustentava as pessoas. Havia algumas fábricas de conservas de peixe, sobretudo de sardinha. A agricultura era muito básica, vivia do cultivo da laranja”. Mas havia também coisas difíceis de entender. “Quando cheguei existiam três campos de golfe, mas não havia jogadores. No inverno, apareciam alguns estrangeiros para jogar, mas não fazia parte do circuito de golfe”, lembrou.

Quando o Algarve começou a ser considerado um destino de férias, os veraneantes vinham, sobretudo, de Inglaterra e do norte da Europa. “Havia poucos portugueses, a maioria era ingleses que ficavam na zona da Albufeira. O turismo não estava organizado e o Algarve era praticamente desconhecido a nível internacional. Quando tentei convencer investidores e construtores importantes para o projeto da Quinta do Lago não sabiam o que era o Algarve”.

O “boom” turístico começou na década de 70. “Nessa altura foram construídos vários empreendimentos e apareceram novos hotéis em diferentes zonas do Algarve. Os operadores turísticos começaram a acompanhar esse desenvolvimento e a apresentar programas de férias”, salientou o empresário. Praia da Rocha, Armação de Pera, Albufeira, Lagos e Praia da Luz eram os destinos preferidos dos estrangeiros. Havia tantos ingleses na Praia da Luz que chegaram a hastear a bandeira nos seus aldeamentos.

Os primeiros grandes projetos pensados para o turismo foram Vilamoura e Vale de Lobo, mas a Quinta do Lago diferenciou-se dos restantes. “Era um projeto que se caraterizava pela qualidade e exclusividade, não no sentido de excluir pessoas, mas porque se destinava a segmentos de mercado muito específicos. Foi isso que começou a aumentar o prestígio do Algarve a nível internacional”, explicou André Jordan.

A Quinta do Lago, inaugurada em 1974, trouxe uma nova visão do turismo e da região “foi um projeto audacioso”, e explicou porquê: “Sempre acreditei que o Algarve tinha todas as condições para desenvolver um turismo de qualidade. Talvez não tenha atingido o nível que poderia ter caso tivesse privilegiado mais a qualidade, mas o potencial ficou confirmado”, afirmou. 

Nos anos 1960, o turismo eramuito residual, esse facto levou a que várias estrelas da música e do cinema escolhessem o Algarve para ter umas férias tranquilas, sem ter que dar autógrafos. Comiam, bebiam, divertiam-se e passavam despercebidos. Para os locais eram apenas uns estrangeiros. Ficaram famosas as noitadas de Cliff Richard com os amigos na boite (era assim que se chamava na altura) Sete e Meio e as madrugadas na praia a ajudar os pescadores a trazer os barcos para terra. O pequeno-almoço desses artistas era já ao raiar do dia com as apetitosas bolas de berlim.

Turismo de qualidade A situação começou a mudar com o aparecimento da Quinta do Lago. “Com exceção de Albufeira, com os bares e discotecas frequentados pelos músicos de rock, o Algarve não era uma meca para as celebridades. Não retiro o mérito ao que foi feito antes, mas as grandes celebridades internacionais passaram a frequentar o Algarve quando começámos a promover a Quinta do Lago, foi esse padrão e imagem de qualidade que trouxe gente famosa ao Algarve”. A princesa Grace Kelly, o arquiteto Óscar Niemeier, o escritor Jorge Amado, a atriz Ingrid Bergman, o piloto Ayrton Senna e os músicos Paul McCartney e Tom Jones, colocaram o Algarve no seu roteiro de férias. Ainda hoje, atores de cinema, músicos, desportistas ou apresentadores das mais famosas cadeias mundiais de televisão querem estar na Quinta do Lago. Também as elites portuguesas mudaram de destino e trocaram Marbella e St. Tropez pela Quinta do Lago.

Mas não foram só facilidades e o golfe, muito associado ao turismo, foi bastante atacado. “Nós criámos o mercado do golfe, que foi de capital importância para a região, só que foi muito atacado na altura pelos ambientalistas. Demonstrámos que gastávamos menos água do que a agricultura e que criavamos mais empregos e mais bem pagos”, concluiu.