José Berardo poderá exercer o direito de compra sobre as 214 obras de arte adquiridas pelo Museu Berardo a partir de 2007, noticiou esta semana o Público. O diário citava o artigo 30.º do protocolo assinado entre o empresário madeirense e o Estado, referente ao destino das obras em caso de dissolução da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea – Colecção Berardo (não confundir com a Fundação Berardo): «As obras de arte compradas com recurso ao fundo de aquisições podem ser adquiridas por José Manuel Rodrigues Berardo ou por quem ele venha a indicar, pelo respectivo preço de aquisição, sendo deduzida a parte do preço que constituiu a sua participação».
Uma vez que contribuiu com metade do valor de um milhão de euros anual estipulado para aquisições (o Estado custeava a outra metade), o colecionador pode agora adquiri-las por um preço reduzido. «Berardo poderá comprar estas obras, muitas delas de artistas então emergentes, ao preço que custaram há cerca de 15 anos, desembolsando agora apenas a parte que então foi paga pelo Estado, uma vez que já pagou a outra metade», escreve Luís Miguel Queirós no Público. O empresário estará a equacionar a aquisição – seja em nome próprio, seja através de outro comprador por ele apontado.
As 214 obras em causa são na grande maioria de artistas então emergentes, embora incluam também trabalhos de nomes consagrados como Pedro Cabrita Reis, Rui Chafes e Jorge Molder.
Esta opção de compra constitui um pequeno trunfo para Berardo, que se encontra sob cerco apertado desde 2019, quando a CGD, o BCP e o Novo Banco se juntaram e entregaram no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa uma ação executiva para reaver os 962 milhões de euros em dívida do empresário – grande parte dela contraída para adquirir ações do BCP, que depois cairiam a pique. Em maio desse ano, Berardo foi ouvido na comissão parlamentar de inquérito à CGD. «Pessoalmente não tenho dívidas», declarou. A audição ficou marcada pela sua gargalhada, que gerou indignação.
Em 2020, o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – ao qual a CGD, BCP e Novo Banco tinham entregue a ação executiva para cobrar a dívida de Berardo – mandou arrestar as mais de duas mil obras de arte da Colecção Berardo, uma ordem que não abrange, devido ao artigo 30.º do protocolo, as 214 obras adquiridas.
O braço-de-ferro entre Berardo e o Estado teve um novo capítulo em 2022, quando o conselho de ministros emitiu um despacho a extinguir a Fundação José Berardo, passando também o Museu Coleção Berardo a chamar-se Museu CCB a partir do dia 31 de dezembro de 2022. Em abril de 2023, porém, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal anulou a extinção da fundação.