Fernando Medina foi repescado por António Costa, que o fez ministro das Finanças depois de ter perdido surpreendentemente as eleições para a Câmara de Lisboa.
Esse facto diminuiu-o, pois pareceu uma espécie de ‘prémio de consolação’.
Não fazia-se sentido – dizia-se – dar a alguém uma pasta decisiva como ‘compensação’ para uma derrota.
Houve também quem afirmasse que Medina entrava para o Governo para ‘equilibrar’ a inevitável presença de Pedro Nuno Santos.
Nuno Santos era mais à esquerda, Medina mais à direita.
E depois havia o problema da sucessão.
Medina seria o candidato à liderança lançado por António Costa para evitar a ascensão do mesmo Pedro Nuno Santos.
Tudo isso, repito, menorizou Fernando Medina.
Ele era visto como uma ‘invenção’ de António Costa e não como um ministro com peso próprio.
Mas tem-se revelado uma boa surpresa.
Pôs o foco no controlo do défice e na diminuição da dívida pública, e tem perseguido com determinação esses objetivos.
Decidiu aproveitar a folga financeira do Estado para reduzir a dívida do país – e, embora os resultados ainda não sejam brilhantes, pelo menos travou um crescimento galopante, que a continuar no mesmo ritmo nos colocaria outra vez em maus lençóis.
Para Medina, teria sido mais popular propor a descida dos impostos; e vai ter de a fazer, porque a pressão é muita.
Mas ter usado o excedente orçamental para a redução da dívida soberana é um facto que merece elogios.
Como acontece com todos os ministros das Finanças que não tomam medidas populares, Medina tem sido atacado por vários lados: pela direita, pela extrema-esquerda e mesmo por setores do PS.
Estes são facilmente compreensíveis: os partidários de Pedro Nuno Santos verão sempre nele um adversário e criticá-lo-ão independentemente do que faça.
As críticas da extrema-esquerda também eram expectáveis: os esquerdistas acham que o Estado deve endividar-se continuamente e não pagar as dívidas.
Já os ataques da direita são inaceitáveis e intelectualmente desonestos.
É lamentável que o PSD (para não falar do Chega) ataque Medina, que está a fazer a política que a direita historicamente defende: o equilíbrio orçamental.
Falei deste tema na semana passada e reafirmo-o nesta.
A socialista Ana Gomes, que se tem distinguido pelos ataques ao Governo, repete que Medina tem a «obsessão das contas certas», diz que «o Estado tem os cofres cheios mas o povo tem os bolsos vazios», e fala em política «salazarista» do Executivo.
É certo que uma das primeiras medidas de Salazar foi o equilíbrio das contas públicas e o pagamento da dívida ao estrangeiro.
Para isso, aumentou muito os impostos, provocando a ira das classes médias, que lhe chamavam «louco».
Mas o futuro mostraria que era ele quem estava certo.
Depois de consolidar as Finanças, Portugal estabilizou a moeda e começou a crescer ao ritmo europeu, aguentou o embate da II Guerra Mundial e do pós-guerra, apesar de quase não beneficiar do Plano Marshall, fez face a uma guerra colonial em três frentes e, no fim, deixou uma dívida pública irrisória e abundantes reservas de ouro no Banco de Portugal.
E, nesse período, o produto per capita dos portugueses não diminuiu em relação à média europeia, pelo contrário.
Se o país tivesse mantido o rumo dos défices altíssimos seguido durante boa parte da I República e, depois, na ditadura militar, é que teria havido uma catástrofe financeira, com custos sociais enormes.
O controlo orçamental e a redução da dívida pública são indispensáveis, por vários motivos, todos eles óbvios.
Tornam o país mais confiável aos olhos do exterior.
Baixam os juros da dívida e colocam o Tesouro a salvo de eventuais crises e imprevistos.
Aligeiram a prazo os encargos financeiros do Estado, libertando dinheiro para o investimento.
Não deixam uma fatura para pagar às gerações futuras.
Os que defendem o alívio do défice e o aumento da dívida pública usam sempre o mesmo argumento: a vantagem de dispor de capital para fomentar a economia.
Só que isso é uma falácia que os números facilmente desmentem.
Nas últimas décadas, a dívida cresceu avassaladoramente e a economia manteve-se estagnada.
O crescimento económico foi praticamente zero.
Fernando Medina está, pois, no caminho certo.
Quando a maioria dos seus colegas de Governo trabalha para as sondagens ou para as próximas eleições, desenvolvendo estratégias míopes, Medina tem a coragem de trocar o sucesso imediato por objetivos a prazo.
Lembro-me da indignação que senti quando Jorge Sampaio disse a Manuela Ferreira Leite que havia «mais vida para lá do Orçamento».
Esforçava-se a ministra das Finanças, contra tudo e contra todos (mesmo dentro do Governo), por equilibrar o Orçamento – e vinha o Presidente da República tirar-lhe o tapete.
Espero que Marcelo Rebelo de Sousa não caia na mesma tentação.
São poucos, nos dias de hoje, os políticos capazes de prosseguir políticas menos populares.
Quando surgem, ao menos que sejam apoiados por quem tem a obrigação de ver mais longe.