Volta à Espanha. No reino das subidas e descidas

A Volta à Espanha é um permanente desafio para os ciclistas. Ao terceiro dia entraram na alta montanha a caminho de Andorra, com Evenepoel a conquistar “La Roja” e a defender a vitória do ano passado João Almeida aponta a um lugar no pódio.

Está na estrada à Volta a Espanha, uma das provas clássicas do ciclismo mundial. Até dia 17 de setembro, 22 equipas, com oito corredores cada, vão disputar 21 etapas, num total de 3.153 quilómetros. O percurso compreende sete etapas de alta montanha, seis de média montanha, seis etapas em linha e dois contrarrelógios, um por equipas e outro individual. O começo da prova foi atribulado e muito criticado devido à hora tardia do contrarrelógio. As últimas equipas, entre as quais estava o vencedor de 2022, fizeram a prova de noite… e não é suposto as bicicletas terem faróis. Além dessa falha organizativa, também a Polícia Nacional deteve quatro pessoas acusadas de preparar atos contra a caravana.

O percurso deste ano é mais exigente do que o habitual, com muita montanha e subidas que chegam aos 18% de inclinação, ou seja, é um traçado feito à medida dos trepadores. Apesar das dificuldades, nada se compara com as primeiras edições na década de 30, que foram consideradas provas desumanas devido às longas distâncias de cada etapa. A segunda semana deverá ser decisiva em termos de classificação geral, com duas etapas de alta montanha que podem provocar grandes diferenças entre os favoritos. Nessa altura ficamos com uma ideia de quem está em melhor forma para enfrentar a última semana, com três etapas para velocistas e duas para especialistas em montanha, com constantes subidas e descidas, que exigem pedalada forte. 

Os vencedores das últimas quatro grandes provas internacionais estão presentes na Volta à Espanha 2023, pelo que se pode falar num plantel de luxo. Há três grandes candidatos: Remco Evenepoel (Soudal), Primoz Roglic e Jonas Vingegaard (Jumbo). O vencedor do ano passado, Evenepoel, só decidiu participar na prova em julho. O belga está a fazer uma época excelente, conseguiu vitórias em provas importantes e venceu o contrarrelógio no Mundial de ciclismo. Antes da prova admitiu que a preparação para o Mundial o pode ajudar nos contrarrelógios e na montanha, percebeu-se isso na etapa que terminou em Andorra. Roglic venceu a Volta a Itália e sabe bem como ganhar em Espanha, onde triunfou por três vezes. Vinegegard é o recente vencedor da Volta à França e continua em grande forma, como demonstrou na primeira etapa de montanha. Estes dois “galácticos” do ciclismo mundial querem vencer a Volta à Espanha para realizar um feito raro que é ganhar duas clássicas na mesma época. Neste século apenas dois corredores o conseguiram: Alberto Contador (Giro e Vuelta, 2008) e Chris Froome (Tour e Vuelta, 2017). Enric Mas (Movistar) e Juan Ayuso (Emirates) aparecem num patamar inferior em termos de favoritismo relativamente aos três principais candidatos. Em termos coletivos, a Jumbo é a favorita. Caso um dos seus ciclistas chegue a Madrid com a camisola vermelha torna-se a primeira equipa a vencer no mesmo ano as voltas à Itália, França e Espanha.

Portugal teve seis ciclistas à partida: João Almeida e Rui Oliveira (UAE Emirates), Nelson Oliveira e Ruben Guerreiro (Movistar), Rui Costa (Intermarché) e o estreante André Carvalho (Cofidis). João Almeida está a fazer uma boa época e terminou no pódio quatro das cinco provas realizadas (Tirreno Adriático, Catalunha, Volta à Itália e Polónia). É um ciclista forte nos contrarrelógios e bom trepador. “Tenho feito uma boa época e chego a esta prova tranquilo e motivado. Estou ansioso pela primeira semana”, disse. E considera o facto de a equipa ter dois ciclistas que podem lutar pela vitória um estímulo. “É bom termos dois candidatos. Será tudo uma questão de quem estiver melhor. Espero ter boas pernas”, disse João Almeida, que considerou ser “um dos melhores pelotões” onde já esteve inserido, tantos são os grandes nomes que vão estar à partida.

A Movistar tem dois portugueses capazes de fazer bons resultados. Nelson Oliveira foi sexto no contrarrelógio no mundial de ciclismo e está preparado para enfrentar a dureza desta prova. “Será mais uma oportunidade para tentar vencer uma etapa. Estou numa boa condição física e vou dar o melhor em benefício dos objetivos da equipa. Vai ser uma prova bastante competitiva, basta olhar para os nossos adversários, mas temos uma excelente equipa”, concluiu. O outro corredor da equipa é Ruben Guerreiro, que afirmou estar “mentalizado” para realizar uma boa prova. “Agrada-me o percurso montanhoso. O objetivo passa por vencer uma etapa e ajudar Enric Mas a lutar pelos lugares do pódio”. No final da terceira etapa João Almeida é o melhor português, em 13.º, a 42 segundos do líder. Ruben Guerreiro é 39.º, Nelson Oliveira 63.º, Rui Costa 119.º, André Carvalho 155.º e Rui Oliveira 168.º.

 

O legado português

A presença de corredores portugueses na Volta à Espanha é quase tão antiga quanto a prova. O melhor resultado foi obtido por Joaquim Agostinho em 1974, ao terminar no segundo lugar a 11 segundos do vencedor, tendo ganho duas etapas. Dois anos depois venceu uma etapa e andou de vermelho durante quatro dias. Outros ciclistas em destaque foram Ribeiro da Silva, quarto classificado em 1957, e João Almeida, quinto em 2022.

A primeira participação aconteceu em 1945 (5.ª edição da prova) com oito ciclistas. Quatro chegariam ao final, destacando-se a prestação de João Rebelo de Jesus com um honroso 6.º lugar e duas vitórias em etapas, foi ainda 2.º na classificação por pontos e 2.º no prémio da montanha. Em 1975, Fernando Mendes foi sexto de geral e venceu a categoria das metas volantes. Acácio Silva terminou a Volta à Espanha de 1991 na 65.ª posição, mas venceu a classificação final dos sprints especiais. Mais recentemente, Nelson Oliveira em 2015 e Sérgio Paulinho em 2006 venceram uma etapa. No total, os ciclistas portugueses venceram 11 etapas na Volta à Espanha.