Para a maior parte dos observadores nomes como George Kennan, George Marshall, Dean Acheson ou John Foster Dulles são personagens distantes do quotidiano, que pouca ou nenhuma influencia têm nas suas vidas. Todavia, todos eles foram personagens centrais na construção da teia de alianças dos EUA do pós-II Guerra Mundial, que permitiu (décadas mais tarde) prevalecer na Guerra Fria.
Em maio de 2020, auge da pandemia, escrevi no SOL um artigo intitulado Enquanto dormíamos que se debruçava sobre a ascensão da China perante uns EUA que «depreciavam o sistema de alianças construído nos últimos 65 anos». Um dos resultados da soberta unilateralista norte-americana dos mandatos de George W. Bush, da retração estratégica da Era Obama e do isolacionismo arrogante dos anos Trump, foi ter possibilitado a abertura de espaço para o avanço de um sistema de alianças chinês, capaz de contrapor o sistema de alianças norte-americano.
Se, aquando da sua criação, os BRICS eram um fórum informal de países economicamente dinâmicos, sobretudo com preponderância regional, com exceção da China que era já um ator global, o mundo mudou. O ‘fórum informal’ tem uma liderança clara (a China) e novos objetivos: reformular a ordem económica mundial.
Nos dias de hoje, este grupo de países representa 45% da população mundial e 22% do PIB, o que já de si são números impressionantes. Contudo, em 2050 os mesmos países representarão menos população, 41%, mas serão responsáveis por 48% da riqueza global. Macron queria fazer parte deste grupo: está ali o futuro.
Estes números representam uma imensa transformação na ponderação de poder no sistema. É isso que se está a jogar naquelas reuniões, a hipótese de moldar uma nova ordem mundial, multipolar e pós-Pax Americana.
Qual o lugar da União Europeia neste mundo? Há pensamento estratégico sobre estas questões, ou está apenas a assistir, convencida que ainda é o continente aristocrata do passado?
A ‘Europa’ (bem como todo o ocidente) habituou-se a utilizar expressões como ‘novo mundo’ ou ‘economias emergentes’, como forma de qualificar o potencial que era percebido naqueles territórios. Hoje, quando o dito potencial ganha evidência, continua amarrada a um quadro institucional e de interesses estratégicos que podem não ser os seus.
Com uma população cada vez mais envelhecida, com fraca dinâmica económica e mais fechada sobre si própria (a guerra na Ucrânia e o eixo a leste isso implica), a União tenderá para ser cada vez menos relevante no mundo.
A UE não tem autonomia estratégica e isso torna-a pouco relevante nas decisões globais. Não tem unidade e isso impede-a de ter autonomia estratégica. Não tem líderes, e isso impede-a de ter unidade (não há um interesse europeu único, há 26 interesses nacionais).
O mundo forjado no pós-II Guerra Mundial não é mais o mesmo. Os homens que o construíram deixaram como sucessores burocratas que, mais do que moldarem o futuro coletivo dos que governam, procuram o próximo cargo. Já desistiram!