O presidente da Assembleia da República anunciou que o 25 de Novembro não figurará nas comemorações dos 50 anos da Revolução de Abril. Demarca-se assim do Presidente da República, que disse há um ano que o 25/11 ‘cabe’ nestas celebrações, e da Comissária Executiva responsável pelo programa das comemorações, a historiadora Maria Inácia Rezola, que defendera que a data era uma ‘peça fundamental’.
Por outro lado, o calendário oficial das comemorações do cinquentenário do 25 de Abril só termina em 2026, quando se cumprem 50 anos da aprovação da Constituição e do ciclo eleitoral de 1976: as primeiras eleições legislativas, as primeiras presidenciais, as primeiras autónomas, as primeiras autárquicas.
Na celebração dos 50 anos da revolução, havia que fazer uma escolha: ou se assinalava a data tout court – o que poderia ser redutor, porque o 25 de Abril é comemorado todos os anos no Parlamento e no resto do país – ou, como fora consensualizado, se celebrava todo o processo que conduziu à democracia. E neste caso, como aliás ficou definido na missão da Comissão Executiva, há marcos como a Constituição e o 25 de Novembro que devem ser assinalados, por muito incómodo que possam causar a alguns setores políticos.
Custa, pois, a entender a posição de Santos Silva. E essa perplexidade não é sentida apenas à direita: há muita gente no PS que não compreende a exclusão do 25 de Novembro. Será que se pretende apenas não incomodar o PCP e o BE, ou existe a perspetiva de que uma ‘geringonça 2’ possa voltar a ser útil?
Mas pode o PS, ainda assim, abdicar de celebrar um acontecimento histórico que faz parte do seu património político? É que o 25 de Novembro foi o confronto entre dois modelos políticos antagónicos, a democracia popular e a democracia liberal, tendo a defesa vitoriosa desta última sido liderada na sociedade civil por Mário Soares.
Celebrar o 25 de Novembro não é revanchismo, tanto mais que não se tratou de um ajuste de contas. Foi, sim, um episódio em que a fação comunista e extremista das forças armadas acabou derrotada pelos que queriam retomar o rumo de Abril. A data representa, por isso, o fim dos excessos dos militares do COPCON e da 5.ª divisão, dos saneamentos ideológicos, das sevícias e prisões arbitrárias, do poder dos comunistas e do furor coletivista. Mas também significa, e é bom recordá-lo, o fim da violência bombista e dos ataques a sedes partidárias, durante o ‘verão quente’.
Com o 25/11, evitou-se a guerra civil, institucionalizou-se a democracia e impôs-se um regime que o povo sufragou – e que perdura até hoje, garantindo a nossa liberdade. O 25/11 é o momento em que o regime democrático deixou de ser propriedade de alguns, tendo atingido o seu estádio adulto. Deve, portanto, ser recordado como parte da revolução, mesmo que isso incomode os que dizem gostar de Novembro porque, de facto, não se revêm em Abril. Mesmo que isso irrite quem desejava que Abril tivesse desembocado numa ditadura de esquerda, para que tudo ficasse como depois do 11 de Março. Se estes tivessem vencido, seria essa a data que seria celebrada e Abril já teria sido apagado.
No próximo ano assinala-se, por coincidência feliz, o centenário do nascimento de Mário Soares. Nessa altura, espero que possamos celebrar a liberdade – a conquista que permite que cada um de nós, à sua maneira, com as suas recordações e com as suas livres escolhas, tenha o seu 25 de Abril.