É tudo uma questão de legitimidade

Por que é que a condução das investigações foram feitas pela PSP e não pela PJ?

Se António Costa tivesse demonstrado metade da decência e respeito pelas instituições democráticas durante o seu mandato, como demonstrou na sua demissão, não nos sentiríamos tão aliviados de o ver sair e aceitar uma crise política desta natureza.

Reconhecimento tem de ser feito ao comprometimento e desempenho das funções da Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, que conduziu o início do processo de investigação criminal aos mais altos cargos políticos do país com um exemplar cumprimento do segredo de justiça, não obstante pressões e fugas dos interesses instalados. Que o diga Sandra Felgueiras, que foi afastada da RTP, o seu programa censurado e a apresentação da sua peça de investigação jornalística, que deu origem a este processo, bloqueada até data posterior às eleições de 2019.

Neste ponto, há dois esclarecimentos que gostaria de ver feitos: o do porquê de a condução das investigações terem sido feitas pela PSP e não pela PJ (como seria de esperar) e o esclarecimento dos crimes que estão em causa na investigação, porque num Estado de direito é fundamental que o visado se possa defender adequadamente e neste contexto, que o país possa saber se é possível manter António Costa como primeiro-ministro interino, ou não.

Uma coisa é certa, um novo ato eleitoral é inevitável. Um governo de iniciativa presidencial não é uma realidade atual, os atuais partidos políticos não padecem da mesma falta de maturidade dos de outrora. Ademais, qualquer composição governamental seja ela da ala de António Costa ou de Pedro Nuno Santos suportar-se-ia numa muito fraca legitimidade.

A primeira porque uma significativa parte da equipa que compôs e compõe o executivo está ferida de decência institucional desde o início dos casos das suspeitas que levaram a mais de uma dezena de demissões, à acusação de três ministros e à detenção de outros cargos dentro da mesma esfera política.

A segunda, pela manifesta falta de legitimidade, que nem na estrutura do próprio Partido Socialista encontra representação.

Já se percebeu que Marcelo Rebelo de Sousa alinha com a narrativa da necessidade de aprovação do Orçamento de Estado, jogando com datas processuais por motivos meramente práticos. O ato da aceitação da demissão do primeiro-ministro pelo Presidente da República é, na sua substância, ato suficiente para a queda de todas as propostas legislativas do Governo.

Garantindo-se a possibilidade do próximo Governo com uma nova visão política e económica para Portugal, possa definir novos desígnios para o país.

Que com uma renovada legitimidade, o foco no crescimento económico do país e um espírito reformista, dará início a um futuro de crescimento e de melhoria das condições de vida dos portugueses. Alcançando desta forma também, as condições para um processo de cura e reconciliação de uma crise política que abriu a mais profunda cisão entre a sociedade civil e a classe política nacional.