Nascimentos. Mães estrangeiras aumentam natalidade

Os últimos dados até são positivos, mas ainda assim não chegam para equilibrar as contas. Falta de apoios financeiros e opções pessoais fazem de Portugal um país de velhos.

Os números não mentem e a continuarmos assim Portugal vai continuar a perder habitantes. Basta olhar para o número de óbitos e de nascimentos, no ano passado, para ficarmos com uma ideia clara do cenário português: morreram mais de 124 mil pessoas e só nasceram pouco mais de que 83 mil. E estes números denotam um crescimento de nascimentos em relação a 2021, à semelhança dos números apurados nos primeiros seis meses do corrente ano.

Curiosamente, ou talvez não, o aumento dos nascimentos em Portugal muito se deve aos estrangeiros, que representaram mais de 16 por cento dos novos cidadãos do país, atendendo a que todos aqueles que nascem em solo nacional adquirem a nacionalidade automaticamente. E é aqui que começam algumas críticas, pois, segundo fontes hospitalares, são cada vez mais as mulheres grávidas de seis meses que optam por escolher Portugal para terem os filhos, seja no Sistema Nacional de Saúde (SNS) ou em clínicas privadas. Não têm qualquer ligação a Portugal, mas como é mais seguro e mais barato do que nos seus países, arranjam maneira de serem atendidas no SNS. “Obviamente que há um turismo de Saúde cada vez mais forte em Portugal. Se é verdade que os migrantes contribuem para a natalidade do país, também não é mentira que muitos dos novos nascimentos são de famílias que não residem em Portugal”, confessa ao i uma médica.

A propósito dos nascimentos em Portugal, Jorge Malheiros, investigador do Centro de Estudos Geográficos (CEG) da Universidade de Lisboa (UL), dá a sua visão: “Nós olhamos para a evolução dos nascimentos e na altura da crise financeira e da resposta de austeridade deu um trambolhão dos 90 e tal mil para os 80 mil e pouco. Agora está nos 80 e tal mil nascimentos, mas no caso dos nascimentos de mãe portuguesa estão relativamente estáveis. No caso dos nascimentos de mãe estrangeira duplicaram no último ano disponível que é o de 2022. E uma parte dos nascimentos de mães lusas são de origem estrangeira, mas que se naturalizaram”. 

Cada vez mais tarde Mas quais as razões para a queda da natalidade? Há as razões óbvias, as financeiras, e as de opção pessoal, atendendo a que muitas mulheres preferem apostar na carreira profissional e só pensam em ter filhos muito mais tarde. A idade das mães na altura do primeiro filho anda na casa dos 31 anos, sendo que em 2020 nasceram 20 crianças de mães com mais de 50 anos. Se é verdade que é difícil encontrar mães de primeira viagem com menos de 30 anos, há quem pense de maneira diferente e tenha optado por ser mãe aos 20 e poucos, como poderá ler nesta edição.

Quanto às questões financeiras, o mais comum é ouvir casais que apontam o dedo à falta de creches. “Acredite que é mais difícil arranjar uma cresce para um filho do que inscrever um na faculdade e, por isso, a resistência a ter mais”, é um desabafo que se ouve com alguma frequência, e que retrata o sentimento de muitos casais. No entanto, o Governo faz uma leitura diferente: avança com mais 12 mil lugares gratuitos em creches, além das privadas que acolhem crianças de famílias necessitadas.

Maternidades encerradas “Um país que permite o encerramento de maternidades, deixando jovens em apuros à porta das urgências, não quer mesmo resolver o problema da baixa de natalidade”, desabafa outro médico com quem o i falou. Como em tudo na vida, há sempre duas versões para o mesmo facto. O Governo garante que está a resolver o problema do encerramento das urgências, e que nenhuma grávida deixará de ser atendida convenientemente.

 Continuando nas maternidades, o que dizer das mães que se queixam de práticas médicas que roçam o sadismo na altura do parto? Oiçamos uma jovem que relatou ao nosso jornal o que foi a sua aventura na hora de ser mãe: “Sempre que gritei com dores havia alguém a desvalorizar e a fazer comentários do género: ‘Esta é mesmo a sua primeira vez’. Foi-me feita a manobra de Kristeller sem o mínimo consentimento ou informação de forma a obrigar o bebé a descer. Foi super doloroso e não sabia porque tinha uma enfermeira a fazer força na minha barriga para ajudar o bebé a descer”, lamenta, acrescentando que não sabe se poderá conseguir voltar a ser mãe.

Famílias numerosas sem apoios especiais Num país em que cada vez há menos nascimentos, apesar de no ano passado e no primeiro semestre do ano, se ter registado uma ligeira subida, nem as famílias numerosas se deixam de queixar do país que não é para bebés: “Nenhuma medida tem em conta a existência de filhos no agregado familiar. Por isso é que muitas pessoas não querem ter filhos: porque, neste momento, essa decisão é de empobrecimento”, explica Ana Cid Gonçalves, secretária-geral da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas. Longe vão os tempos em que o número de filhos tinha correspondência na habitação social a que se tinha direito ou nas ajudas fiscais no que diz respeito aos empréstimos bancários.

Num cenário pessimista há ainda que acrescentar o problema laboral que alguma grávidas enfrentam. Segundo a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), em 2022 “foram instaurados 111 processos de contraordenação por falta de comunicação da não renovação de contrato de trabalho de trabalhadora grávida puérpera e lactante” à ACT.

Mas não se pense que a população mundial está a baixar, bem pelo contrário. E, segundo algumas estimativas, é previsível que no final do século, sejamos 10 ou 11 mil milhões. Sejamos é como quem diz, daqui a 77 anos já estarei noutras paragens.