Aeroporto – Relatório da Comissão Técnica é uma mistificação

‘Mistificar – Engano coletivo de natureza intelectual; coisa enganadora’, do Dicionário da Academia.

Em 2036, aviões começam a utilizar o Aeroporto do Centro de Tiro de Alcochete (CTA) – Pedro Nuno Santos foi pioneiro a denunciar não ser possível abrir antes com uma pista. Os 12.000 trabalhadores no AHD [Aeroporto Humberto Delgado] devem ter alojamento no local em cidade a criar, com todos os custos que tal representa. E com as pressões imobiliárias denunciadas por Gonçalo Byrne. Ou fazem navette a partir da zona de Lisboa via Terceira Travessia sobre o Tejo ou na Ponte Vasco da Gama a quatro vias. Os que residem na margem sul utilizarão rede de transporte a criar. Calculai o transtorno nas suas vidas e a pegada ecológica.

A Comissão ignora esta realidade do aeroporto do CTA. Pior, nunca integrou Ordenamento do Território e Planeamento Urbano no seu trabalho. Escondeu-nos que mudar o aeroporto é mais do que mudar aerogare e uma pista. Ao contrário do Montijo, o aeroporto do CTA cria urbe sem planeamento urbano e que desestrutura o Arco Ribeirinho Sul. É (mais um) erro de Ordenamento do Território, já dissecado por João Cravinho.

Segundo a CTI, o novel aeroporto criará Cidade Aeroportuária em espaço rural, que, lá para 2041 atrairá empresas que apoiarão a economia a passar do ‘Made in ao created in’. É ideia mais do que duvidosa, mas perturba gravemente a certeza da Cidade Aeroportuária integrada na urbe existente, do Parque das Nações a Cascais, passando por Lisboa, o agora Oeiras Valley e Nova SBE.

A sustentabilidade do AHD é também social e económica e não apenas ambiental, segundo um ambientalismo coxo. E ignora que, nas grandes urbes, o aeroporto é integrado na malha urbana, de Orly aos três aeroportos de Nova Iorque. Num país pobre, ignora o custo de oportunidade de fechar um aeroporto que funciona para abrir um novo a 50 km.

Competitividade do turismo e inovação em Lisboa, Oeiras e Cascais sofrem com o novo aeroporto. Carlos Moedas tem de cerzir o tecido urbano da Cidade Aeroportuária existente no Prior Velho e redondezas, mais nos terrenos a norte da avenida Infante D. Henrique. E, ao longo das ruínas do lado Norte desta via, criar o conjunto de edifícios do skyline que marcará Lisboa durante séculos. O AHD é decisivo para este progresso.

Em 2050 a Comissão prevê, no mínimo, entre 66 e 108 milhões de passageiros no CTA, quando, em 2019, Heathrow, o maior hub do mundo, teve 81 milhões. Esta previsão megalómana de gabinete sem business background compromete o relatório. O tráfego do AHD, estrangulado até 2036, obrigaria a duplicar os atuais 31 milhões entre 2036/2050.

Antes de 2012, Portela + Montijo é defendido pela Confederação Turismo, Bernardo Trindade, então secretário de Estado, Estudo da Universidade Católica e governo de Pedro Passos Coelho. É objeto de acordo entre Estado/ANA em janeiro de 2019 no celebre ‘Não há Plano B’ de António Costa. No AHD e Montijo a ANA investe 1.300 milhões de euros, sem custos para contribuinte e para «procura estimada superior a 50 milhões de passageiros por ano».

Portela + Montijo não é nem invenção da ANA privatizada nem imposição desta ao Governo. Afirmar o contrário roça a calúnia.

Do alto da cátedra, a CTI exclui o modelo Dual por inadequado e ineficiente, quando a ANA o defende e nele investe. Em 2007 a equipa da UCP tem modéstia intelectual e mérito científico de remeter a avaliação para a gestora aeroportuária. Os cientistas da CTI violam duas bases da Ciência, modéstia intelectual e respeito pelos factos.

A CTI ignora o projeto do acordo Estado/ANA e inventa «opção estratégica» de Montijo inexistente, para melhor o denegrir. Entre outros, inventa inútil ramal ferroviário de centenas de milhões e abertura em 2029 e não em 2027. Apesar dos 1.000 hectares de terreno público, exclui a expansão do aeroporto. Voltaremos a este tema. l

Analista sénior em turismo e transporte aéreo,  militante do PS, apoiante de José Luís Carneiro