2023. O mundo partido ao meio

Não nos bastava a invasão russa da Ucrânia: a 7 de outubro, um ataque-relâmpago minuciosamente planeado pelo Hamas apanhou Israel de surpresa e acendeu o rastilho de um novo conflito de alta intensidade no Médio Oriente.

É este o mundo que 2023 deixa de herança: um mundo partido ao meio, quase literalmente, com focos de conflito espalhados um pouco por todo o planeta. E depois há ainda a outra guerra que parte da humanidade está a travar, para preservar o que resta da natureza, enquanto outra parte continua a poluir desenfreadamente.

Num hospital de Gaza
O ano fica irremediavelmente marcado pelo conflito entre Israel e o Hamas. Num hospital de Gaza, uma mulher coberta de sangue e poeira abraça uma menina: apesar de tudo, ambas escaparam com vida ao bombardeamento de Khan Yunis a 15 de novembro. Nem todos tiveram a mesma ‘sorte’.

O descarrilamento do Hazara Express
Um trabalhador recupera forças depois do descarrilamento do Hazara Express, que viajava entre Carachi e Rawalpindi no Paquistão. O comboio transportava cerca de mil pessoas, das quais 30, pelo menos, perderam a vida. De tempos a tempos, os antiquados, sobrelotados e mal mantidos caminhos de ferro paquistaneses, herdados da época colonial, fazem as suas vítimas.

Mau tempo em Manaus
A 17 de setembro, menos de um mês depois de o jacto de Prigozhin ser abatido perto de Moscovo, um outro aparelho da marca Embraer despenhava-se do outro lado do mundo, na Amazónia, provocando a morte aos seus 14 ocupantes. O acidente registou-se no aeroporto de Barcelos, a cerca de 400 km de Manaus, e foi causado pelo mau tempo.

As voçoroca de Buriticupu
Quem andasse pelo município de Buriticupu, no estado do Maranhão, no dia 21 de abril podia deparar-se com uma novidade na topografia da região: um buraco e peras. Não é o único. Segundo o G1, 26 destas crateras, a que os brasileiros chamam ‘voçorocas’, «avançam sobre a cidade» de 70 mil habitantes. O fenómeno, que começa com fendas na terra e chega a atingir 70 metros de profundidade, é causado por uma conjugação de falta de planeamento urbano com a deflorestação agressiva da região.

Cemitério em mar aberto
Embora os romanos lhe chamassem mare nostrum, o Mediterrâneo não é exatamente um lago. Um naufrágio em agosto, a sul da ilha de Lampedusa, provocou a morte a 45 migrantes. E, sem a pronta intervenção da guarda costeira italiana, seriam muito mais. Segundo a Organização Internacional para as Migrações, desde 2014 o Mediterrâneo reclamou qualquer coisa como 28 mil vidas.

Colosso de aço
Concluída em 1981, a escultura Motherland é um marco de Kiev herdado da época soviética. Mas em agosto este colosso de 62 metros de altura (sem contar com o pedestal, que tem outros 40) e 500 toneladas de peso perdeu parte da sua história, com a substituição do símbolo soviético no escudo pelo tridente ucraniano. A mensagem não podia ser mais clara.

A Lua ergue-se sobre o templo do deus do Sol
Chamaram-lhe superlua azul, embora exibisse uma tonalidade avermelhada. Vemo-la aqui erguer-se a 30 de agosto sobre o antiquíssimo templo de Apolo (curiosamente o deus do Sol da mitologia grega), em Corinto, datado de cerca de 560 a.C., já lá vão uns 2580 anos. Coisa pouca quando comparada com a idade da Lua: um estudo recentemente publicado estima que o satélite que orbita a Terra tenha 4,46 mil milhões de anos.

O Louvre perde um ícone
A Liberdade Guiando o Povo, pintura de Eugène Delacroix que celebra a revolução de julho de 1830, foi para restauro. Para o efeito, a grande tela teve de ser analisada por raio-x e despojada da sua moldura. Este ícone do Louvre deverá ficar longe dos olhares dos visitantes até à primavera de 2024.

Leilão
Antes de ser leiloada em Nova Iorque, esta Femme à la montre, que Picasso pintou em 1932, andou a pavonear-se por vários pontos do mundo, incluindo o Dubai. A obra, que pertencia à riquíssima Emily Fisher Landau, que faleceu no final de março aos 102 anos, acabou por ser arrematada por cerca de 140 milhões de dólares, mais precisamente 139,3 milhões.

O grande abalo da Turquia
Às primeiras horas de 6 de fevereiro, um sismo de magnitude 7,8 na escala de Richter sacudiu o Sul da Turquia e o norte da Síria, seguindo-se uma réplica de 7,5. Apesar das taxas cobradas há anos pelo governo para supostamente reforçar dos edifícios, a maioria das construções não estavam preparadas. Em Antakya (na imagem) ruíram como um castelo de cartas. Perto de 60 mil pessoas terão perdido a vida nos dois países.

A vida em ruínas
As equipas de salvamento desafiaram o frio glacial, o cansaço e as réplicas para resgatar dos escombros os sobreviventes. Na cidade de Kahramanmaras, Mesut Hancer, de colete cor de laranja, viu o seu mundo desabar com a morte da filha de quinze anos. Devastado, ficou a segurar na mão do corpo sem vida, enquanto a neve se acumulava sobre as ruínas.

Pesadelo mexicano
Famosa pelas suas praias de águas cristalinas e pelos mergulhadores que saltam de alturas vertiginosas, Acapulco é um destino turístico de eleição. Mas a passagem do furacão Otis transformou a paradisíaca cidade num cenário de pesadelo. Os ventos, que atingiram velocidades na ordem dos 270 km/h, partiram vidros, derrubaram árvores e arrancaram bocados às fachadas dos edifícios. Foi o furacão mais forte de que há registo, sendo o número de mortos por ele provocado ainda motivo de discussão: as autoridades mexicanas falam de 48 vítimas, enquanto um relatório feito com recurso às agências funerárias locais apontou para 350. Os danos materiais foram estimados em 16 mil milhões de dólares.

‘Avalanche’ de água
Depois da ditadura de Khadafi, do caos que se seguiu à sua queda e dos horrores do Estado Islâmico, a má sorte continua a bater à porta da Líbia. A 11 de setembro, a tempestade Daniel provocou cheias-relâmpago que fizeram rebentar duas barragens. A ‘avalanche’ de água levou tudo à sua frente, arrastando pessoas, automóveis e edifícios para o Mediterrâneo. Estima-se que mais de 11 mil tenham perecido na catástrofe.

Dar de beber a quem tem sede
A polícia fronteiriça da Líbia teve de prestar assistência a um grupo de migrantes que alegaram terem sido deixados no meio do nada sem água, comida ou abrigo. Atravessar o deserto a pé não é algo que esteja ao alcance do ser humano, mesmo do mais resistente.

Lutar pela sobrevivência
Um refugiado Rohingya recém-chegado caminha até à praia depois de a comunidade local ter decidido permitir temporariamente que estes desembarcassem para obter água e comida em Ulee Madon, província de Aceh, Indonésia, a 16 de novembro de 2023. Cerca de 250 refugiados Rohingya chegaram ao oeste da Indonésia num barco sobrelotado.

Tentar a sorte
Migrantes cruzam as margens do Rio Grande para os EUA, visto de Matamoros, estado de Tamaulupas, México, a 9 de maio de 2023. Os controlos da era pandémica que proíbem os migrantes de solicitar asilo nos EUA expirariam dois dias depois no meio do caos provocado pela nova política dura que significa incerteza para milhares de pessoas que procuram refúgio nos EUA. A Casa Branca alertou que a partir daquela sexta-feira, qualquer pessoa que entrasse ilicitamente nos EUA enfrentaria uma proibição prolongada e possíveis acusações criminais.

Visita humanitária
Tecoluca, 74 km a sudeste de San Salvador, 21 de agosto de 2023: Reclusos permanecem numa cela da mega prisão do Centro de Confinamento Contra o Terrorismo (CECOT), onde estão detidos centenas de membros dos gangues MS-13 e Rua 18, durante uma visita humanitária organizada pelo comissário presidencial para os direitos humanos e liberdade de expressão, o colombiano Andrés Guzman Caballero.

Beijo indesejado
A Espanha foi campeã do mundo de futebol feminino, mas a festa ficou estragada com o comportamento do presidente da federação: Luis Rubiales deu um beijo na boca a Jenni Hermoso na cerimónia de entrega das medalhas. A jogadora disse que não tinha consentido o beijo, e o ex-presidente garantiu que não se demitia. A FIFA acabou com a história ao afastar Rubiales de todas as atividades relacionados com o futebol por três anos.

Desforra
A final do Open dos Estados Unidos entre Novak Djokovic e Daniil Medvedev foi dos encontros mais extraordinários da temporada. Dois anos depois de Medvedev ter vencido neste mesmo palco, o tenista sérvio desforrou-se com um triunfo claro por por 6-3, 7-6 e 6-3, conquistando o quarto título nos EUA e o 24.º em provas do Grand Slam. Djokovic viria a terminar o ano como número um do ranking mundial.

Ondas monstruosas
Os big riders das ondas gigantes foram surpreendidos na costa da Califórnia (EUA). As tempestades no Pacífico têm provocado uma ondulação brutal, que é o sonho daqueles que gostam de enfrentar ondas gigantes – consideradas por muitos como as maiores do mundo. Alguns especialistas afirmaram que as ondas estão a ficar maiores devido aos ventos fortes atribuídos às alterações climáticas.

Estrela
A ginasta Simone Biles regressou à competição em grande estilo no campeonato do mundo de ginástica, que se realizou na Bélgica. A norte-americana foi a primeira mulher a executar o salto Yurchenko Double Pike, que depois desse movimento passou a chamar-se Biles II. Aquela que é considerada a melhor ginasta da história esteve ausente dois anos devido a problemas de saúde mental. 

Do festival à tragédia
Na madrugada de 7 de outubro, Israel acordou em sobressalto, com as sirenes a tocar e rockets a cair. No Sul do país, cerca de 300 jovens que assistiam ao festival de música Supernova foram cercados e massacrados por terroristas do Hamas, e outros 40 feitos reféns. No lugar do acampamento ficou um rasto de caos e de sangue. Com o mundo ainda em choque, o primeiro-ministro israelita, o muito contestado Benjamin Netanyahu, prometeu uma retaliação imediata. Cerca de 1400 pessoas poderão ter perdido a vida nos ataques de dia 7 de outubro, um número que haveria de multiplicar-se, do lado oposto, nos dois meses seguintes.

Interrogatório na valeta
Com dezenas de reféns levados para lugar incerto em Gaza, as forças de segurança israelita tentaram por todos os meios obter informações que permitissem localizar e libertar os seus concidadãos. Na imagem, um prisioneiro palestiniano nu e vendado a ser interrogado numa valeta à beira da estrada, na cidade fronteiriça de Ashkelon, no dia a seguir aos ataques.

O que sobra dos bombardeamentos
A resposta de Israel foi rápida e brutal. Em pouco tempo a cidade de Gaza ficou reduzida a escombros e ruínas fumegantes. Estima-se que os impiedosos bombardeamentos e incursões de soldados israelitas no território já tenham provocado mais de 20 mil mortos e mais de dois milhões de deslocados.

Cadáveres dentro de sacos
Com os ataques-relâmpago de 7 de outubro o Hamas atraiu sobre Gaza a fúria israelita, com consequências trágicas para o povo palestiniano. Em Rafah, no Sul do território, centenas de pessoas rezaram pelos membros da família Hijazi mortos pelos bombardeamentos. Desde o início do conflito, os cadáveres dentro de sacos brancos atados na extremidade tornaram-se uma imagem comum por aquelas paragens.