O balanço dos 8 anos de governação na área da Saúde – Parte 1

Este balanço procurará recorrer a uma análise factual, baseada em indicadores, por forma a que seja, tanto quanto possível, o resultado objetivo da realidade analisada, sem prejuízo de uma opinião suportada nos factos analisados.

Com o início do atual Governo em funções meramente de gestão, em resultado da demissão do primeiro-ministro, creio ser útil efetuar um balanço sobre a atuação dos governos do Partido Socialista, na área da saúde, desde o seu início em Novembro de 2015.

Este balanço procurará recorrer a uma análise factual, baseada em indicadores, quando seja apropriado, por forma a que seja, tanto quanto possível, o resultado objetivo da realidade analisada, sem prejuízo de uma opinião suportada nos factos analisados.

A primeira constatação, neste balanço, é a de que os graves problemas de acesso da população aos cuidados de saúde se agravaram desde 2015:

  • As listas de espera para cirurgias aumentaram em cerca de 20%, de 197.401 pessoas em espera, em 2015, para cerca de 235.000 pessoas em 2022 (Relatório de Acesso ao SNS e Relatório do CFP-Conselho de Finanças Públicas – 2023);
  • O número de pessoas aguardando pela primeira consulta hospitalar (condição prévia para a sua inscrição nas listas de espera de cirurgia) aumentou de cerca de 521 mil, em 2019, para cerca de 583 mil em 2022 (Relatório da CFP).

A percentagem de consultas hospitalares realizadas dentro dos prazos estabelecidos na lei (TMRG-tempos máximos de resposta garantida) diminuiu de 74%, em 2015 (Relatório de Acesso) para 68,4%, em 2022 (Relatório do CFP) havendo casos, que não são pontuais, de pessoas esperando por uma consulta vários meses ou mesmo anos, em algumas especialidades. Por exemplo, nos últimos dados disponíveis no Portal da Transparência, o tempo médio de espera para uma consulta de Cardiologia é de 1193 dias no Hospital da Guarda e de 890 dias para uma consulta de obesidade no Hospital de Évora.

  • O número de utentes sem médico de família aumentou de 1.044.945 em 2015 para 1.711.982 em 2023 (nov.) – Portal do SNS.

É evidente que neste período de governação socialista existiu uma situação grave, completamente anómala e inesperada, ou seja a pandemia covid-19, com grandes efeitos no setor da saúde.

Contudo, esta degradação da resposta do SNS verificava-se já antes da pandemia: em 2019 (antes da pandemia), o número de pessoas em lista de espera para cirurgia era de 242.949 (Rel. Acesso ao SNS-2022) quando em 2015 era de 197.401 (número atrás citado).

Toda esta degradação de resposta verificou-se, mesmo, apesar de terem aumentado expressivamente os recursos financeiros e humanos postos à disposição do SNS: de 2015 a 2023 os orçamentos para despesas de funcionamento (despesas com o pessoal, medicamentos, consumos intermédios etc.) aumentaram de cerca de 9,5 mil milhões (mM) para 14 mM, ou seja um acréscimo de cerca de 50%. (dados dos orçamentos do SNS) e de 2016 a 2022 registou-se um aumento significativo do nº de médicos, enfermeiros e assistentes operacionais, da ordem de +24%,; +29% e +26,7 % respetivamente (jornal Público – 21.6.2022.)

É certo que este forte aumento dos recursos humanos no SNS se deveu, também, à decisão do Governo do PS de reduzir o nº de horas de trabalho de 40 para 35 horas (contradizendo, aliás, as suas afirmações de que tal não era necessário) mas o forte aumento dos recursos financeiros e humanos, com piores resultados para a população, só pode ser explicado pela incapacidade e má gestão dos governos socialistas.

Face à incapacidade de resposta do SNS os portugueses recorrem, cada vez mais, pagando, aos serviços do setor privado da saúde. O número de pessoas com seguros de saúde passou de 2,65 milhões, em 2015 para 3,5 M em 2022, ou seja um aumento de cerca de 850.000 pessoas, aproximadamente +32%. (dados da ASF – Regulador do Setor de Seguros)

Se a estes 3,5 M de pessoas adicionarmos cerca de 1,3 M de funcionários públicos, elementos das forças de segurança e suas famílias, que pagam uma percentagem dos seus salários para subsistemas públicos (como a ADSE) verifica-se que existem cerca de 47% dos portugueses (quase metade da população) que recorrem, pagando, ao setor privado, o que dá uma ideia da escala da incapacidade e de ineficiência da gestão socialista do SNS nestes últimos 8 anos.

Aliás, podemos até inferir desta situação que a incapacidade e ineficiência teriam uma expressão ainda maior do que aquela atrás descrita, se o SNS tivesse que satisfazer todas as necessidades em saúde daquelas cerca de 4,7 M de pessoas que recorrem ao setor privado.

Toda esta situação significa que, ao longo dos últimos 8 anos, não só não foi cumprida a Constituição, que garante o acesso a cuidados de saúde a todos os portugueses, de forma geral, universal e (tendencialmente) gratuita, como se manteve uma realidade dual e discriminatória: as pessoas com meios financeiros evitam a incapacidade de resposta do SNS recorrendo, pagando, ao setor privado, enquanto que a população mais desprotegida e vulnerável (aquela que os governos socialistas dizem defender) por falta de meios para o pagamento de seguros de saúde, permanece, por largo tempo, nas listas de espera para cirurgias e consultas.

Os graves problemas de acesso têm, ainda, uma outra expressão, evidente e bem documentada na comunicação social, nos dias que correm, e que se referem ao fecho de serviços de urgência, em várias especialidades (cirurgia geral, obstetrícia, pediatria etc.) num número muito elevado de hospitais do SNS, levando os utentes a ter que recorrer a unidades longe das suas residências, com os inerentes problemas e riscos para a saúde e por vezes, de vida.

É certo que esta situação também se deve a um crescente nº de médicos se recusar a efetuar horas extraordinárias, para além das exigíveis legalmente, mas o Governo foi incapaz de prever e depois resolver o problema nos anos e meses em que ele já se arrasta.

O congestionamento das urgências, daí resultante, agravado pela época da ocorrência de surtos de gripe, levam os serviços a condições de atendimento, inaceitáveis e não dignas, como aquelas a que assistimos hoje, com pessoas em macas, a serem alimentadas e a terem a higiene pessoal, em corredores superlotados, e à afirmação por profissionais de saúde de que se está a praticar uma ‘medicina de catástrofe’.

A este respeito o Governo e a Direção Executiva do SNS têm-se esforçado por colocar na opinião pública a ideia de que a causa do congestionamento das urgências hospitalares, afetadas objetivamente pela degradação das suas condições de atendimento, se deve ao número muito elevado de pessoas que a elas recorrem sem disso terem necessidade, as denominadas “falsas urgências”.

Ou seja, o Governo e a Direção Executiva do SNS, enquanto tentam atuar sobre a ‘oferta’ de cuidados de urgência, atingida por anos de ineficiência e má gestão, pretendem agora limitar a ‘procura’ condicionando o acesso da população.

Não se questiona que muitas pessoas se deslocam às urgências verificando-se, depois, que não havia necessidade, mas fazem-no porque não terem alternativas e porque, no seu entender, necessitam de uma assistência rápida, o que não pode ser criticado como se infere, por vezes, das declarações de responsáveis do setor da saúde e de comentadores na Comunicação Social.

Na impossibilidade de resposta dos Centros de Saúde, é útil a referenciação dos casos urgentes pela linha telefónica SNS24 (para a qual a população deve ser persuadida e não coagida), o que comporta um risco não existente, na prática, na triagem dos hospitais, mas tal não pode ser a solução para o problema.

A única forma de enfrentar o problema é contrapor à concentração nas urgências a disseminação do atendimento dando aos utentes alternativas que sejam credíveis e em que nelas possam confiar. Isto só é possível com um bom funcionamento dos cuidados primários. A crise das urgências, para além dos problemas descritos, é, antes de mais, a incapacidade de resposta dos Centros de Saúde, ou seja, a crise dos cuidados primários. l

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