Espantam-me os lugares comuns que vou lendo e ouvindo acerca de Luís Montenegro que tendem a desvalorizar as suas capacidades. Há, entre jornalistas e comentadores (até da sua área política), alguma jactância na forma como o avaliam.
É notório que tudo aquilo que Montenegro tem assumido como compromisso, a propósito do xadrez eleitoral depois de março, é sempre posto em dúvida. Como se ele não tivesse deixado claro – e deixou – quais são as suas opções nos diversos cenários possíveis.
É verdade que Montenegro teve dificuldade em liderar a oposição a Costa? Sim, mas ninguém pode esquecer o que fez Rio, amarrando-se ao cargo por longos meses depois da sua triste performance eleitoral e de ter favorecido nas listas de deputados, e assim no grupo parlamentar, os adeptos da sua fação, saneando os que tinham apoiado Montenegro. E, claro, a maioria absoluta, e o facto de o líder da oposição não ter lugar no Parlamento, aliviaram a pressão sobre o Governo.
Por fim, Marcelo Rebelo de Sousa, que facilitara a vida à ‘geringonça’, foi sempre uma voz dissonante relativamente ao Governo maioritário do PS. Assumiu críticas e posições que deixara a cargo da oposição no seu primeiro mandato, cumprindo, aliás, a tradição dos Presidentes de serem sempre mais interventivos nos segundos mandatos.
Por outro lado, Montenegro tem de conviver com os fantasmas do PSD. Com Cavaco e as suas certezas. Com Passos Coelho, que defende o frentismo de direita. Com Marques Mendes, que procura a equidistância porque tem outras ambições. Com Rio, que vai reunindo e se entrincheira com os seus últimos fiéis nas suas obsessões.
Montenegro tem conseguido aproveitar, das aparições destes vultos, o que lhe interessa, sem descartar apoios, não sendo tolhido pelas sombras e pelos jogos dos seus antecessores. Conseguiu reeditar a AD, o que lhe aporta votos e alarga o espetro ideológico, invadindo terrenos da IL. Tem o apoio do experiente Paulo Rangel, um trunfo importante e um político que o ajuda a ver o mundo e a Europa, temas que não deixarão de pesar em março.
Por contraste com Pedro Nuno Santos, Montenegro assume, candidamente, que nem tudo corre ou lhe correu bem. Com tantos eleitores indecisos, o estilo dos candidatos a primeiro-ministro será um fator relevante na escolha final. Um homem como os outros, como Montenegro se apresenta, pode convencer os eleitores de que é melhor com as suas dúvidas do que o seu adversário com as suas certezas. Finalmente, Montenegro esteve bem na comunicação de crise, a propósito do inquérito que foi tornado público. Sem dramatizar ou reclamar do Ministério Público, esclareceu o que devia e no tempo e no tom certos. Numa campanha que se anuncia suja, era previsível que isto sucedesse. Por norma, as denúncias dos delatores anónimos são enviadas em simultâneo para a comunicação social e para as autoridades competentes.
Acredito que nada haverá que comprometa Montenegro. E que esta denúncia até o vai beneficiar, dado que a opinião pública está cansada de tantos episódios e tende a não os valorizar.
Falta ouvi-lo ainda sobre questões como a habitação, em que só pode ter opções diferentes do PS, que nesta e outras matérias se aproxima do BE. É que se for para ficar tudo igual, é no PS que o eleitorado irá votar. Mesmo neste novo PS, que virou à esquerda. Num tempo de acrimónia e acusações cruzadas, os políticos não podem esquecer que o eleitor precisa que o convidem a sonhar.
Um homem como os outros
Montenegro teve dificuldade em liderar a oposição a Costa? Sim, mas ninguém pode esquecer o que fez Rio, amarrando-se ao cargo por longos meses .