Lá tive eu de estudar para mais uma época de testes. Comecei a estudar para testes vai para 17 anos, altura em que o meu filho mais velho começou a ter testes. Já tive boas notas e outras péssimas, até já ia chumbando. O balanço é claramente negativo. O relevo de Portugal, o ciclo da água, os recursos linguísticos, a diferença entre determinantes e pronomes, a soma de raízes quadradas, o volume, as funções dos órgãos do corpo humano. Népias. Não decoro. Repeti seis vezes estes testes, de formas diferentes, com professores diferentes, em idades diferentes, mas não tenho emenda. Voltei agora ao quinto ano e os problemas repetem-se. Estudar para um teste é mais difícil do que preparar um business plan para apresentar ao conselho de administração de uma multinacional farmacêutica. 17 anos volvidos e posso dizer com tristeza que não aprendi nada. É preciso paciência e tempo para estudar para testes. Criar ambiente de estudo, dizem os especialistas. É preciso calma, a luz adequada, uma secretária limpa e material de apoio. É preciso um alinhamento de estrelas que só acontece esporadicamente. São incontáveis os fins de semana sacrificados aos testes para nada. Se os meus filhos aprendem com o meu estudo? Nada. Só nos irritamos mutuamente. Entre a borracha que cai e a má disposição simbiótica, assim vai passando o tempo de estudo. Os filhos que não exigem o meu estudo, estudam sozinhos, os que exigem, não estudam. Ficam à espera que lhes enfie toda a matéria dentro da cabeça. Tarefa impossível, se nem na minha consigo.
Ao fim de todos estes anos tenho a teoria de que os primeiros ciclos são mais difíceis do que os seguintes. Mais até do que a faculdade. Os primeiros anos servem para adquirir as chamadas competências e algum conhecimento que venha com elas. Os restantes servem para adquirir conhecimento e pouco mais. Nos anos mais avançados, os miúdos vão encontrando estratégias certas para enfiar a matéria na cabeça. E não recorrem aos pais que percebem tanto daquela temática quanto de astrofísica. “Tens de decorar isto!”, reclamei em desespero perante mais um manual de Ciências da Natureza na véspera de mais um teste. “Isso era dantes, hoje em dia não temos de decorar”, argumentou. É um facto. As chamadas competências não incluem a memorização como forma primordial de adquirir conhecimento. Memorizar passou a ser o parente pobre do ensino. Não se exige que os alunos debitem conhecimento, matéria, regras gramaticais, fórmulas matemáticas. Exige-se que eles preencham espaços em branco e preencham legendas feitas de setas. Pede-se que acertem e não que decorem mesmo sem perceberem. O resultado disto sou eu: só sei aquilo que decorei na idade certa. Passada a idade, as gavetas fecharam-se até hoje. Vivi com entusiasmo os idílicos tempos em que o conhecimento passou para segundo plano e só decorei o que interessava e porque me interessava. Nunca fiz apresentações sem um papel à frente, só na faculdade é que me sujeitei às orais e nunca me exigiram que soubesse de cor e salteado as preposições simples, as serras ou os nomes das pedras. E a História acabava invariavelmente na Revolução Francesa. Era o céu. De lá para cá, a importância do conhecimento e da memorização no ensino tem vindo a diminuir até aos mínimos olímpicos. A consequência é que ainda hoje não sei a ladainha das preposições e muito menos os nomes dos calhaus. E acreditem que me farto de estudar.