Nas últimas semanas houve dois avisos da indústria automóvel que nos deviam fazer pensar. Elon Musk, CEO da Tesla, afirmou que «as marcas de automóveis elétricos chinesas vão arrasar a concorrência». Carlos Tavares, CEO da Stellantis, referiu que «se não tivermos cuidado, vamos ter carros elétricos inacessíveis e os fabricantes chineses a suplantarem-nos».
Estas afirmações vêm na sequência de se saber que o construtor de veículos automóveis chinês BYD (Build Your Dreams) tornou-se, no último ano, o 10.º no mundo em vendas, com 2,11 milhões de veículos vendidos, superando a Tesla e tornando-se o líder mundial nos veículos elétricos.
A República Popular da China fez, há alguns anos, uma opção estratégica pelos automóveis elétricos: percebendo que a sua indústria automóvel não era competitiva com motores de combustão, optou por realizar uma deriva pelos veículos elétricos. Estão à frente na tecnologia.
Para poder produzir automóveis elétricos o país necessitava de extrair e separar as terras raras (que contêm os metais das transições energética e digital). Atualmente, a China controla cerca de 80% do mercado mundial das terras raras. Estão à frente no controle das matérias-primas.
Percebendo o mercado, em dezembro último o MOFCOM (Ministério do Comércio Externo Chinês) proibiu a exportação da tecnologia de processamento das terras raras. Ainda há poucos anos um ministro português disse, numa entrevista, que não devíamos explorar o subsolo marítimo da nossa plataforma continental porque o mercado internacional está abastecido. Poucas vezes teremos lido um governante fazer tal elogio à dependência.
A questão que se deve colocar é a de perceber o porquê de a União Europeia estar a acelerar, como está, a transição energética num setor no qual não é competitiva, pondo em risco as suas empresas deste setor. Recorde-se que a indústria automóvel representa 7% do PIB da UE e 13 milhões de empregos (7% do mercado de trabalho na União), colocando-se em causa o modelo social europeu.
Há duas explicações possíveis para a estratégia da UE nesta área. Por um lado, idealismo político, decorrente da agenda em torno das alterações climáticas, que se vai impondo muitas vezes sem ponderação – o que conduz a erros estratégicos como parece estar a acontecer aqui, o conhecido politicamente correto.
Por outro, pelo lobby económico em torno das mesmas alterações climáticas, que aproveita o surgimento da agenda para forçar a imposição da mudança – seguindo um caminho mais de revolução do que de evolução – e aproveitando-se de alguns ‘idiotas úteis’ que se deixam deslumbrar pela nova ciência, olhando para a árvore sem ver a floresta.
A simplicidade do argumentário do ‘cataclisma que está para chegar’ é atraente, mas bate de frente com a realidade de um sistema internacional cuja natureza não se alterou. Quem controlar a riqueza determinará os equilíbrios de poder e as regras do jogo. As regras, essas, são claras de perceber quando se perde liberdade económica: quem paga manda! Esta geração de portugueses percebeu-as quando a intervenção da troika colocou o país na mão dos credores.
Paul Kennedy, no Ascensão e Queda das Grandes Potências, explicou como o Império Otomano definhou decorrente das más lideranças. Nós temos a sorte, ou o azar, de estar a assistir ao nosso definhar, por nos deixarmos liderar por quem ‘faz fraca forte gente’.