Crises potenciam explosão de marcas low cost

As low cost no retalho não param de chegar a Portugal e a febre parece não acabar. Afinal, todos gostam de produtos mais baratos. E momentos de crise económica ajudam. Daniel Sá recorda que este não é um fenómeno novo e a tendência é continuar.

Normal, Pepco, Kik, Primark… tantos nomes de que certamente já ouviu falar e que sabe bem o que são. Cadeias low cost que parecem estar a invadir Portugal e feito as delícias de quem procura produtos mais baratos.

Na sua maioria são lojas europeias e o seu crescimento em Portugal é notório. O caso mais recente – ou pelo menos com mais destaque – é a dinamarquesa Normal. Chegou a Portugal em outubro de 2022, instalando-se em Sintra, mas rapidamente se alastrou a outros pontos do país. Promete uma abordagem única de ‘compra inteligente’, com preços mais acessíveis de marcas conhecidas do público, desde bens alimentares a produtos de higiene pessoal e limpeza doméstica. Atualmente existem 18 lojas em Portugal, distribuídas um pouco por vários concelhos de norte a sul, estando previstas mais quatro aberturas até à próxima primavera.

Dentro da mesma lógica, mas com outra variedade de produtos – uma vez que tem também vestuário -, a Pepco chegou há menos tempo a Portugal. De origem polaca, é uma das maiores lojas de retalho de vestuário da Europa. Atualmente conta com 14 lojas em Portugal entre Lisboa, Coimbra, Porto, Albufeira, Olhão, Elvas, Tavira, Barreiro, Aveiro, Pombal e Barcelos.

E estas não são as únicas. Destaque ainda para a Kik. A retalhista alemã está em expansão e a sua maior aposta é no vestuário – mas tem também artigos para a casa -, prometendo vestir uma pessoa dos pés à cabeça por 30 euros. Está já em vários países da Europa e em Portugal conta com pelo menos cinco lojas.

A febre parece fazer efeito e despertar outras marcas. Em breve, Portugal terá também a Action. É uma cadeia holandesa de ‘pechinchas’ e destaca-se pelos milhares de produtos para o dia a dia (não alimentares) a preços baixos. E quando dizemos preços baixos, são mesmo: tem mais de 6.000 produtos em catálogo, com 1.500 produtos abaixo de um euro.

«Se vieram cá parar é porque já estão noutros sítios», comenta Daniel Sá, diretor executivo do Instituto Português de Administração e Marketing (IPAM). De facto, todas estas lojas têm presença em vários países europeus.

O responsável adianta que «qualquer mercado tem do low cost ao luxo» e que, olhando para o caso português como se fosse uma pirâmide, «o mercado de luxo em Portugal é muito curto», dando como exemplo principal a conhecida Avenida da Liberdade, em Lisboa, «e mais algumas pinceladas pelo país». Uma coisa é certa: «Nem sequer temos um mercado de luxo muito significativo».

Falando do mercado low cost, que «obviamente faz parte de todas as indústrias, de todos os negócios e tem a faceta evidente do retalho também», de onde vem este sucesso? «Porque o mercado é muito competitivo e porque o consumidor quer sempre pagar o menos possível», a adesão «é natural», considera Daniel Sá. E continua: «E em contextos de crise, ou dificuldade económica – que é aquele que estamos a atravessar também – mais probabilidades de sucesso tem».

Lembrando que o rendimento disponível das famílias é menor, o diretor executivo do IPAM defende que «se pudermos ter ofertas a valores mais baixos, as pessoas aproveitam essas oportunidades. É um registo natural». E diz ver este cenário «como perfeitamente normal em relação ao que são mercados maduros como é o mercado português».

Já os analistas da XTB chamam a atenção para o impacto da chegada destas cadeias. Ao Nascer do SOL dizem que, em termos de produção, «a economia poderá sofrer um impacto negativo, já que poderemos deixar de produzir certos produtos a nível nacional para os importar». Contudo, «para o consumidor final, este cenário será positivo, já que conseguiria adquirir produtos semelhantes com baixo custo».

Os analistas adiantam que, por outro lado, «algumas empresas poderão acabar por ser penalizadas nos lucros, devido ao aumento da concorrência no mercado». No entanto, «tendo em conta que estamos numa economia aberta, também é preciso lembrar que o mercado possui uma capacidade de se adaptar a diferentes situações».

Um fenómeno que não é novo

Apesar desta febre, é preciso ter em conta que não se trata propriamente da estreia das low cost no retalho em Portugal. O primeiro destaque vai para a C&A que apareceu no nosso país em 1991. Apesar de não ser exclusivamente low cost, a marca assumiu preços mais acessíveis quando chegou a Portugal há mais de 30 anos. Seguiu-se a H&M. A marca sueca chegou ao país em 2003 e tal como a H&M, não era (nem é) exclusivamente low cost, mas conta com preços mais acessíveis em várias peças.

Junta-se a francesa Kiabi, que tem crescido a olhos vistos no país e que promete roupa a preços acessíveis para toda a família. Chegou ao nosso país em 2010.

E é impossível falar em low cost no retalho sem destacar a febre da Lefties, conhecida por ser a versão mais barata da Zara. Tem já cerca de 30 lojas em todo o país e é conhecida pela relação qualidade-preço.

De todas estas, a mais ‘recente’ é a Primark. Chegou em 2009 e conta não só com vestuário mas também artigos para o lar, beleza, higiene, entre outros.

Daniel Sá explica que esta tendência deverá continuar. «É para continuar e já tem muitas décadas. Já falámos do caso da C&A e encontramos praticamente em todas as indústrias estes tipo de soluções», detalhando que este mercado de preços mais baixos «não é uma novidade, é uma coisa já com algumas décadas, vai-se é renovando e vai aparecendo com novas marcas, com novas ideias, com novas fórmulas. Mas, na sua base, este mercado low cost mantém-se inalterável».

A verdade é que todos gostamos de uma boa pechincha, sendo esta a principal razão da atração por estas cadeias. «Faz parte do modelo de negócio. Não apenas trazer preços muito competitivos como as próprias estratégias de comunicação são muito agressivas, muito eficazes», diz Daniel Sá, destacando que «acabam por ser marcas que conseguem chegar a grandes massas e a ter volumes para comunicação muito grandes e conseguem fazer esse burburinho com significado nos mercados onde chegam».

E os outros?

Questionado sobre se estas chegadas em massa podem ter consequências para as marcas que já estão instaladas no país há mais tempo e com outros preços, o diretor executivo do IPAM é da opinião de que o fenómeno «nunca é negativo, é sempre positivo». E justifica. «É assim que a economia cresce, é assim que a concorrência tem que se tornar melhor, é assim que quem já está no mercado tem que se reinventar e, se quiser baixar preços tem que ser criativo ou então, se quiser diferenciar-se de outra forma, tem que o fazer». E, face a este cenário, não há dúvidas: «Ganha sempre o consumidor final, que vai tendo sempre alternativas distintas».

O responsável defende ainda que «é esta dinâmica que faz com que o mercado avance e que hoje em dia tenhamos cada vez melhores empresas, produtos, serviços, sempre em benefício do consumidor. E cabe a cada empresa reinventar-se e analisar o mercado onde quer estar e fazer melhor. É este o princípio desta concorrência moderna. Nunca vejo desvantagens nisso, só vejo vantagens».