A intervenção de Pedro Passos Coelho num comício da AD pode ter sido desastrada e inoportuna, mas teve o condão de colocar os democratas-liberais a falar de imigração, furando o duopólio do Chega e do Bloco de Esquerda.
A imigração oferece um dilema para quem defende, em simultâneo, a livre circulação de pessoas (e de bens e de capitais), a empatia e compaixão para os deserdados da sorte, uma vida condigna para todos e a preservação em segurança de uma comunidade de valores partilhados. Não tenho certamente resposta para todas estes múltiplos ângulos da questão da imigração, nem aqui haveria espaço para a todos discutir. Seguem-se modestas observações.
É claro que alguns setores economia precisam de mão-de-obra imigrante; e é um facto que estes imigrantes não são um ónus para o estado social nacional, bem pelo contrário. Contudo, a ideia que a imigração é a panaceia para os problemas causados pelo nosso inverno demográfico (entre os quais avulta a sustentabilidade da segurança social) é ridícula e uma bomba relógio social e política. Como é ridícula a ideia de que a imigração pode compensar a emigração de talentos jovens.
Política de imigração e política de integração dos imigrantes são duas coisas distintas. A primeira contem a segunda, mas, ao contrário do que certa esquerda cosmopolita pretende, não se esgota nela. Os imigrantes têm direito a condições de vida dignas – o que inclui acesso à habitação, saúde e educação para os filhos. Constituírem a maioria dos sem-abrigo em Lisboa, como divulgou o Presidente da Câmara, envergonha-nos. Como nos envergonha o incêndio de há um mês na Mouraria num minúsculo apartamento onde coabitavam 22 imigrantes. Contudo, não tendo o país recursos do país infindos, essas condições deploráveis podem ser a consequência inevitável de não gerirmos pró-ativamente as admissões de imigrantes económicos. A laxidão das portas escancaradas (patente na lei de 2022 que criou a figura do visto para procurar emprego), acaba, ela própria, por alimentar o submundo da imigração. Não é humano dizer, venham os que quiserem e, depois, amanhem-se como puderem. Como tantas vezes na vida, as boas vontades enchem o inferno.
É verdade que os indicadores de criminalidade entre os imigrantes não suscitam alarme social. Infelizmente a questão não se esgota aqui, pois a segurança tem também uma dimensão subjetiva. E, ainda que fruto do preconceito, esta não pode ser ignorada quando é partilhada por muitos. Quando mais de metade dos inquiridos responde, ‘poucos ou nenhuns’ à questão ‘em que medida Portugal deve deixar que pessoas dos países mais pobres fora da Europa venham e fiquem a viver por cá’, colocada num numa sondagem recente do ISCTE, temos um problema de perceção da imigração. Na génese desta resposta está, estou em crer, a insegurança. Insegurança não no sentido policial ou securitário; insegurança no sentido de ameaça a um sentimento de comunidade. Este é o verdadeiro desafio: integração na comunidade. Não a criação de outras comunidades, partilhando os mesmos espaços, mas estanques, como numa salada de frutas multicultural. Antes, uma integração que, sem anular a diversidade, promova a adesão a uma paleta comum de normas, estilos de vida e propósitos e desenvolva um sentimento de confiança, pertença, segurança e cuidado uns com os outros.
Professor universitário