Quando, no verão de 1987, António Manuel Pacheco Domingos, nascido em Portimão no dia 1 de dezembro de 1966, chegou ao Benfica, depois de ter jogado no Torralta e no Portimonense, ainda havia Fernando Chalana mas era já um Chalana diferente, carregado pelas mágoas das suas frustrações em Bordéus. Pacheco era um menino de 21 anos e sonhava em ocupar aquele buraco do lado esquerdo que se abria na avançada dos encarnados à medida que a magia de Chalana se desvanecia no éter onde se queimam as chamas finais dos génios sem idade. Era rápido e repentino, mas não era, nunca foi, nem nunca poderia te sido Fernando Albino Sousa Chalana, que tinha, imagine-se!, apenas mais sete anos do que ele. Foi a maior injustiça que o futebol e a vida lhe poderiam ter imposto. Ficou para a história pelo episódio quase anedótico da final da Taça dos Campeões Europeus, em Viena, logo no ano seguinte ao da sua chegada, frente ao PSV Eindhoven, que meteu as botas que se descalçavam sozinhas simplesmente porque alguém se lembrou de estrear meias nesse encontro definitivo. Não apaixonou o Terceiro Anel, mas ficou seis anos na Luz até que, no Verão Quente de 1993, trocou um clube à beira da bancarrota, com ordenados em atraso, pelo rival do outro lado da Segunda Circular, o Sporting, que vivia a fase fanfarrona da presidência de Sousa Cintra. Até nisso foi secundário. Paulo Sousa ofuscou-o numa espécie de revolução que quebrou o pacto de não-agressão entre ambos os clubes. Em 1995 já tinha ido procurar outros ares. Reencontrei-o, na companhia do António Florêncio (mais um desaparecido recente), em Nottingham, onde fez crescer as raízes da esperança de jogar noutro campeão da Europa. Não o quiseram. Voltou, triste (houve sempre nele uma certa tristeza que impedia a explosão da sua técnica) para o Belenenses, e balançou entre a Reggiana, o Atlético, o Santa Clara e o Estoril, num final sem brilho. De repente, ainda tão jovem, saiu também triste da vida. Já não sei como chorar amigos mortos se, a cada dia que passa, a morte me leva mais um. O buraco do lado esquerdo nunca foi preenchido no Benfica. Agora resta um buraco no lado esquerdo do peito.
António Pacheco. Um buraco do lado esquerdo
1966-2024 . Fugiu do Benfica para o Sporting mas foi perdoado