Cumprir a democracia, cumprir Portugal

Em direções opostas, o número de partidos aumenta, mas o leque variado de opções apenas enriquece o espectro eleitoral, continuando a ser incapaz de captar a atenção daqueles que estão alheados da chamada às urnas.  

A proximidade das comemorações dos 50 anos do 25 de abril tornam inevitável a reflexão sobre o que ainda falta conquistar no caminho de uma democracia plena, madura, que gere uma maior representatividade e níveis de confiança mais elevados dos nossos concidadãos.

Os números dizem-nos que a taxa de participação eleitoral tem diminuído ao longo dos anos. Desde 2009, menos de 60% dos eleitores exerceram o seu direito de voto. Se nada for feito, mesmo tendo em conta a ligeira diminuição da abstenção nas últimas eleições legislativas, teremos um fosso cada vez maior entre a política e a comunidade.

Cinco décadas depois da revolução, que nos livrou da Ditadura em que Portugal havia mergulhado, os portugueses sentem-se afastados da vida política e não lhe atribuem real importância. Em direções opostas, o número de partidos aumenta, mas o leque variado de opções apenas enriquece o espectro eleitoral, continuando a ser incapaz de captar a atenção daqueles que estão alheados da chamada às urnas.  

O futuro deve construir-se com a aprendizagem em relação ao passado, e se em Portugal encontramos uma democracia que nunca vacilou nas últimas cinco décadas – o que muito nos orgulha – é, no entanto, uma democracia por vezes sensaborona e desprovida de paixão. Que se esqueceu a quem deve dar verdadeiramente voz no seu caminho: todos nós.

É imperativo criar ferramentas que alimentem e revitalizem esta democracia, fortalecendo o contrato de confiança com os cidadãos, e encarando o verdadeiro poder que algumas entidades podem ter na perseguição deste objetivo. Falo, obviamente, do papel das Juntas de Freguesia. A título de exemplo, só nos dois últimos anos realizámos 24 reuniões públicas, abertas a todos. Promovemos o primeiro e único referendo local na cidade de Lisboa, para auscultarmos a nossa comunidade sobre a expansão da operação da EMEL a novas zonas da freguesia, com a adesão de mais de 9500 eleitores.

No chamado poder local, um verdadeiro poder de proximidade, sabem quem somos e onde nos encontrar. Estamos perto: nas ruas, nas instituições, nas escolas, na Junta de Freguesia, num conjunto de ferramentas de apoio que disponibilizamos, para trabalharmos e concretizarmos as respostas que só a descentralização pode permitir.

A atribuição de novas e reforçadas competências às Juntas de Freguesia levaria certamente ao aumento do sentimento de representatividade e permitiria atuar com maior eficácia, e em rede, possivelmente através de comunidades ou consórcios interfreguesias, para resolver problemas comuns. O combate aos fogos, a adaptação às alterações climáticas, ou a escassez de recursos hídricos, são problemáticas de inúmeras freguesias da cidade de Lisboa e do nosso país. Problemas iguais merecem soluções iguais, atuando com mais recursos e abrangência para o bem comum.

Esse deve ser o princípio e o fim que nos deve nortear, o bem comum. Defender os direitos e liberdades que a democracia nos traz, mas que nem sempre estão ainda verdadeiramente cumpridos, nomeadamente no caso das vitórias no respeito pela igualdade de género. A lei da paridade, que entrou em vigor em 2006, estabelece que as listas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as autárquicas locais asseguram a representação de 33% de mulheres. Quanto tempo será preciso até não necessitarmos de uma lei para garantirmos uma representatividade plena do sexo feminino na ação política?

Em Benfica, a liberdade continuará a andar nas ruas, a fazer parte daquilo que é a nossa essência enquanto Bairro. Iremos celebrar com cinco dias inesquecíveis de programação, dedicados a cinco públicos distintos. Concertos, exposições, tertúlias, nos diferentes espaços culturais do nosso território, especialmente no renascido Espaço Ulmeiro, reconhecido como um local de resistência no nosso Bairro, antes do 25 de abril de 1974. Trabalharemos de forma incansável para cumprir a democracia, a cidade. Já dizia Fernando Pessoa:” Falta cumprir-se Portugal…”

Presidente da Junta de Freguesia de Benfica