Pedro Nuno Santos quis dar um ar de estadista responsável e preocupado com a estabilidade política e social do País, pelo que achou por bem enviar uma carta ao recém-empossado primeiro-ministro, propondo-lhe um acordo para um orçamento rectificativo, mas apenas para satisfazer as pretensões de diversas classes profissionais, as quais implicam, obviamente, um considerável esforço financeiro.
Ou seja, um documento alusivo às contas gerais do Estado, mas que observe somente medidas do agrado geral, excluindo qualquer uma, menos atractiva, que vise proporcionar a viabilidade das outras.
E, pasme-se, tudo o que o novo secretário-geral do PS pretende que o actual governo implemente é precisamente o oposto da prática levada a cabo pelos governos de que fez parte activa, os quais tiveram a oportunidade de as realizar mas, por teimosia, incompetência ou simples discordância, se recusaram sempre a concretizar.
Santos quer-nos fazer crer que nunca pertenceu aos governos de Costa que, durante longos oito anos, se marimbaram para a recuperação do tempo de serviço dos professores, deixaram os militares e polícias das forças de segurança a perder rendimentos e a não serem contemplados com o subsídio de risco atribuído à Polícia Judiciária, penalizaram gravemente os oficias de justiça e instalaram o caos junto de todos quantos dedicam a sua vida ao serviço da saúde pública.
Santos, mesmo depois de abandonar o governo por causa das traquinices em que se envolveu, votou a favor de todos os orçamentos fabricados dentro do seu partido, os quais, naturalmente, fecharam sempre os olhos às legítimas ambições daqueles que agora ele quer ver recompensados.
Poder-se-ia pensar que Santos, investido da nova responsabilidade de dirigir o PS, fez um mea culpa e reconheceu as injustiças de que foram vítimas tantas pessoas de bem durante o consulado do seu antecessor, pelo que, genuinamente, quer contribuir activamente para reparar o mal do qual tem também imensas culpas no cartório.
Nada mais falso!
A carta que endereçou a Montenegro reveste-se de uma hipocrisia total e de uma baixeza sem limites, porque Santos pretende somente retirar dividendos políticos, já a pensar num eventual acto eleitoral antecipado para breve prazo, apropriando-se, abusivamente, dos louros de uma reparação tardia dos atropelos praticados contra centenas de milhares de servidores do Estado, em cuja chancela de responsáveis consta igualmente o seu próprio nome.
Numa frase: este socialista quer que o novo governo ponha em prática uma política à qual ele se opôs enquanto membro do executivo anterior, assinando depois, por baixo, como se fosse ele o autor das justificadas benesses a conceder agora a quem tem sido esquecido na progressão da sua carreira profissional.
É preciso ter lata, e muita!
Mas não contente com todo este descaramento, Santos vai ainda mais longe ao querer impor um prazo de dois meses para que o governo execute o acordado. Ou seja, pretende que seja apresentado um orçamento rectificativo, atente-se, uma correcção do último orçamento da responsabilidade do seu próprio partido, descartando, desta forma, que o acordo que pretende negociar venha a ser englobado somente no orçamento de 2025.
A razão, claro está, é bem simples, a de que o PS não se quer comprometer com as contas do Estado para o próximo ano, porque está apostado em chumbá-las e esperar que o Chega siga o mesmo caminho, levando, assim, à queda do governo e à realização de novas eleições, a grande jogada de Santos para se mudar para a residência oficial do primeiro-ministro.
Se todas estas medidas, indispensáveis para a reposição da justiça junto de todos quantos foram abandonados pelo Estado que assistem, bem como, e principalmente, para se assegurar a paz social, vierem apenas a constar no orçamento do ano vindouro, o PS será encostado entre a espada e a parede, porque a rejeição daquele documento implica, naturalmente, que as pretensões daqueles funcionários públicos sejam, igualmente, reprovadas, ficando Santos com o ónus da culpa.
Em termos eleitorais, estas caturrices pagam-se caro, sendo que a respectiva factura viria a ser endereçada, evidentemente, aos socialistas.
Quero acreditar que Montenegro tenha percebido muito bem a jogada do seu adversário, razão para que não se deixe cair na esparrela e avance com as políticas necessárias para uma boa governação, sem que destas fique dependente da boa vontade da esquerda parlamentar.
Foi esse o recado do eleitorado no passado dia 9 de Março: governe sem a ajuda do PS!