É o mais novo de seis filhos e, desde pequeno, cresceu num meio musical. O pai, Shay O’Donoghue, era músico e, por isso, todos os filhos seguiram as suas pisadas de certa forma, cantando e/ou tocando algum tipo de instrumento. Foi desta forma que Danny começou a lidar com aquela que é considerada como Primeira Arte até porque, como disse em entrevistas anteriores, na sua família, o objetivo era fazer carreira na música: e, quem não o fizesse, sentia que estava a falhar de certo modo. «O meu pai era um músico bastante proeminente na Irlanda e os meus irmãos estavam ambos em bandas e a minha irmã era cantora. Por isso, havia sempre competição pela atenção do meu pai porque ele não se preocupava com mais nada, só se preocupava com a música. Parecia sempre uma corrida entre mim e os outros rapazes e raparigas da família para fazer alguma coisa na música, não necessariamente para ser famoso, mas apenas para ter sucesso na música e tentar impressioná-lo, sabes?», começa por explicar Danny à LUZ. «Podíamos cantar, dançar, ou fazer um som de pum com o braço, o que quer que fosse, só para tentar chamar a atenção das pessoas. E eu fazia tudo isso. A cantoria resultou. O canto deu certo», sublinha o cantor que costuma afirmar com convicção que o pai é uma das suas maiores inspirações e, por esse motivo, deseja ser lembrado tal como ele é: uma boa pessoa. «Era um homem bastante estoico. Era esperto, inteligente, tinha moral, todas essas coisas, mas também era… Sabes, ele era forte e era um verdadeiro homem, mas também era muito suave e muito clemente e todas essas coisas. Por isso, sim, gostava de ser como ele. Mas acho que, provavelmente, a sua qualidade mais atrativa era a bondade com que tratava as pessoas. E tratava sempre toda a gente, independentemente de quem fosse, bem. Tratava os reis como se fossem porteiros e os porteiros como se fossem reis. É uma coisa bonita porque apenas nivela o jogo, nivela toda a gente, de modo que ninguém seja mais importante do que qualquer outra pessoa no mundo. Somos todos iguais, por isso acho que essa é a principal lição que tento retirar dele», continua Danny que, numa entrevista ao jornal britânico The Guardian, explicou que idolatrava o pai ao ponto de levar as canções para casa como se fossem «cheques de ordenado». E, com o primeiro grande cheque que recebeu gastou milhares de euros a levar 300 crianças com necessidades especiais a um centro terapêutico. Mas voltemos à relação de Danny com Shay.
«Acho piada ao facto de que, à medida que vou envelhecendo, estou cada vez mais parecido com o meu pai. Por exemplo, ele tinha olheiras tal como eu. Alguns dos meus irmãos são parecidos com o meu pai, outros com a minha mãe, mas eu sou uma espécie de mistura perfeita dos dois. Mas quando estou a tocar piano, especialmente quando olho para as minhas mãos, percebo que me assemelho imenso ao meu pai. É reconfortante, sabes, é esquisito e reconfortante ao mesmo tempo», garante Danny, que saiu da Irlanda pela primeira vez quando tinha 17 anos e emigrou para os EUA com Mark Sheehan, um dos seus melhores amigos, com quem também integrou a banda MyTown nos anos 90. Durante dez anos, estiveram em solo norte-americano e este período definiu a vida de Danny, na medida em que estes anos coincidiram com o fim da adolescência e o início da vida adulta. «Estava a tornar-me um homem. Sei que os EUA, agora, são um pouco mal vistos por causa da situação política. Por isso, é difícil lembrarmo-nos de como era antigamente. E quando eu tinha 17 anos, ou seja, há 20 e tal anos, era um lugar como a terra da esperança e da liberdade e todas essas coisas. Na Irlanda, se tivermos um carro muito bom ou se chegarmos a alguma coisa, as outras pessoas olham para nós… Quase que nos olham de cima para baixo e querem riscar o nosso carro com uma chave. Mas, nos Estados Unidos, o que descobri foi que quanto mais bem-sucedido se era, mais elogios se recebia. É diferente», continua Danny, que viveu 17 anos na Irlanda, 10 nos EUA e, atualmente, vive em Londres. «Vivi praticamente um terço da minha vida em cada país. Sou obviamente 100% irlandês, mas como viajei por todo o lado com o Glen e o Mark, viajei pelo mundo quase 10 vezes, sinto-me um cidadão do planeta. Percebes o que quero dizer? Tenho um sotaque irlandês e sou irlandês, mas sim, apanhei alguns traços da América, alguns traços da Europa e, depois, todos os melhores traços da Irlanda», diz Danny que, no fundo, tem o coração em todo o lado mas o sotaque irlandês. «Exatamente, é uma boa maneira de o dizer!», observa, recuando até 2008, o ano em que lançou o primeiro álbum, The Script, tal como o nome da banda, juntamente com Glen Power e Mark, que integra êxitos como Breakeven e The Man Who Can’t Be Moved.
«Continua a ser surpreendente para mim. Tivemos o nosso maior dia de streaming ontem com a Breakeven. Por isso, apesar de ter sido lançada há 16 anos, a canção é hoje mais popular do que era na altura, o que é ainda mais louco! Todos os fracassos, todas as vezes que me disseram ‘não’, as coisas em que pensava e que destroem a alma, quando enviava as minhas demos e não recebia resposta… Ou isto tudo e ainda fazia concertos de merda, este tipo de coisas… Num campo de ‘nãos’, foi o primeiro ‘sim’ que tive! E pensei ‘Merda, temos de passar por todos os ‘nãos’ para chegar a esse ‘sim’. E esse ‘sim’ foi o nosso primeiro álbum’», narra Danny, considerando que The Script foi «quase como uma justificação para toda a dor e todo o sofrimento» que viveu. «Foi a primeira vez que disse às pessoas ‘Olha, eu consigo fazer alguma coisa. Valho alguma coisa’. Porque até essa altura, como toda a gente, sentia-me inútil», adianta, deixando claro: «A única coisa que nos pode levar da linha de partida à linha de chegada é o nosso amor por algo. Se não tivermos amor não conseguiremos ultrapassar os tempos difíceis», continua o vocalista, esclarecendo que alcançar aquilo que desejava uma vez não se afigurava suficiente. «Pensei ‘Agora que provei que pode ser feito, vamos tentar fazê-lo outra vez e outra vez e outra vez e outra vez’. E assim foi!», declara o artista que, depois de The Script, lançou Science & Faith, em 2010, chegando a um público cada vez mais amplo com sucessos como o single homónimo, For The First Time, Nothing ou If You Ever Come Back. A primeira música surgiu quando Mark estava a conversar com a esposa no quintal e, segundo Danny, explicou o mundo baseando-se em factos e ela, à sua vez, questionou-o acerca de coisas como o amor e a esperança, «coisas diferentes que nunca veria no telescópio». Por isso, no dia seguinte, Danny e Mark sentaram-se com as canetas e os papéis à frente e escreveram.
Volvidos dois anos, os The Script lançaram #3, com os singles Hall of Fame, Six Degrees of Separation e If You Could See Me Now. Nessa altura, Danny era jurado no The Voice do Reino Unido e, por isso, colaborou com will.i.am no primeiro single. Já o terceiro aborda a dor que Danny sentiu quando perdeu o pai e que Mark sentiu aquando da perda do pai e da mãe. Mas, voltando aos dias de hoje, ao The Guardian, Danny disse que as pessoas gostam da música dele mas não dele. «A razão pela qual digo isto é porque nem eu sequer gosto de mim. Percebes o que quero dizer? Eu gosto da música. Acho que queremos ser lembrados pela música e não pela personalidade pública ou qualquer coisa do género, porque acho que, por vezes, a música de algumas pessoas pode ser julgada pelo que são como pessoas ou o que quer que seja e eu sinto que é como se fosse uma coisa autónoma. É como se eu fosse um músico. Não sou um político», acrescenta. «Olha, eu sou um tipo porreiro e não estou a dizer que me odeio ou que as pessoas me odeiam: isso não podia estar mais longe da verdade. Mas foi mais uma forma irónica de dizer às pessoas que podem não gostar de mim, pois só quero que gostem da minha música», conta Danny que, em miúdo, entrou nos camarins dos músicos Bryan Adams e Nuno Bettencourt e, em adolescente, conheceu os U2 e caiu ao pé da banda por ter bebido demasiado.
No entanto, apesar de já ter privado com inúmeros artistas, continua a ficar impressionado. «A indústria musical tem vindo a mudar muito. Por isso, sinto que fico mais impressionado com futebolistas ou pugilistas. Pessoas de áreas que não conheço tão bem quanto a música. Mas ainda há pessoas que me fazem pensar ‘Uau, não acredito que estou a conhecê-lo/a!’. Aconteceu-me isso com o Sting. Sou um grande fã dele e achei que seria todo fixe e intelectual e dizer isto e aquilo quando estivesse com ele. Acho que lhe disse uma coisa estúpida e ele respondeu ‘Está bem, amigo, ok, fixe, muito bem’. Mas eu divirto-me sempre com isso porque, no final do dia, sei que eles são exatamente como eu. Percebes o que quero dizer? Estão ali a improvisar. Não sabem o que estão a fazer: quero dizer, alguns sabem e outros não! Quando se chega a esse ponto, o brilho e o glamour desaparecem», confessa Danny, brincando que tem vontade de não lavar as mãos durante uma semana quando conhece um pugilista ou futebolista e lhe dá um passou-bem. É, provavelmente, esta a mesma vontade que os fãs, que compõem a The Script Family, têm quando conhecem a banda. Depois de três álbuns bem-sucedidos, surgiu No Sound Without Silence, em 2014, com os singles Superheroes, No Good in Goodbye e Man on a Wire.
A primeira, como Danny, explicou há dez anos, «é sobre heróis desconhecidos (…) desde mães solteiras a pais, professores», sendo que «às vezes os super-heróis nascem, mas às vezes eles são feitos». Depois deste álbum, seguiu-se Freedom Child, em 2017, com os singles Rain e Arms Open. O segundo foi dedicado a Mark nos concertos que a banda deu após a sua morte. Recentemente, Danny disse, num vídeo publicado nas redes sociais da banda, que gostaria de ter escrito a canção Vincent de DonMcLean. Quais serão as suas maiores inspirações para além do pai? «Apenas músicos que sofreram pela sua arte, suponho. É provavelmente um conceito bizarro hoje em dia, mas os grandes nomes que foram contra a corrente e fizeram o que tinham a fazer. Só posso esperar ou desejar ter nascido nessa época ou nesse tempo. Mas pessoas como o Bob Dylan e o Don McLean, assim como todos os compositores do mundo que estão a tentar escrever aquela canção que, quando morrerem, as pessoas vão dizer: ‘Achas que isso é uma canção? Ouve esta, ouve esta canção’», evidencia. «São pessoas que se arriscam a falar sobre a condição humana. Portanto, pessoas que, como eu disse, adoram a arte de escrever canções e depois fazem alguma coisa. Como a Tears in Heaven do Eric Clapton. É sobre a morte do filho dele. Que coisa trágica que aconteceu, mas que bela maneira de confortar o mundo com isso. Talvez ele próprio se sinta um pouco reconfortado com isso. É mágico ver alguém a transformar a dor num origami e transformá-lo em algo belo. E é uma lição para a vida, para tudo, para qualquer coisa má por que se esteja a passar», afirma, lembrando que, quando estamos chateados, podemos ficar zangados e descarregar em nós mesmos com automutilação, bebida, drogas ou optar por outro caminho.
«Por exemplo, podemos dar murros num saco de boxe e, durante três meses, se fizermos isso, ficaremos em boa forma. Pensamos na pior coisa que alguém nos disse e ficamos furiosos, choramos, mas fazemos aquilo que conseguimos», diz. «Há coisas que as outras pessoas nos fazem sentir, mas elas não as sentem. Tu és o único que sente essa raiva. És o único que sente essa dor. És o único. Por isso, a melhor maneira de a deitar cá para fora é fazer alguma coisa. E com os humanos, é físico. É correr, saltar, dar murros, falar, brincar. Sabes, não é apenas algo agressivo. Pode ser artístico. É mais ou menos por isso que a arte é arte. Os artistas mostram um sentimento e uma emoção que não conseguem manter engarrafado/a», aponta. E será que, mesmo com o otimismo que tenta ter sempre e com a música como escape, Danny lidou bem com a pandemia? Os The Script estavam em tour, para promoverem o álbum Sunsets & Full Moons, lançado no fim de 2019, com os singles The Last Time e Run Through Walls, e tiveram de a interromper. «É difícil de acreditar, mesmo agora, olhando para trás, que todos nós passámos por isso. Acho que passei pelas mesmas emoções que toda a gente passou. Questionava-me se voltaria a sair de casa, se voltaria a cantar. Também tive emoções quase mistas porque passei a maior parte da minha vida longe de casa e esta foi a primeira vez que estive em casa e tive de enfrentar uma série de coisas. Tive de enfrentar muitos demónios, enfrentar coisas das quais andei a fugir durante muito tempo», assume Danny, acreditando que é «privilegiado», mas que trabalhou muito e, enquanto estava a produzir música ou na estrada, estava ocupado e, por isso, não pensava na dor e noutros sentimentos dos quais fugia. Mas quando tem tempo livre ou está sozinho as coisas mudam.
«A covid-19 foi uma situação em que muitas dessas coisas vieram ao de cima. Realmente lutei, toda a gente lutou. Ainda estamos a lutar agora. Com a pandemia, a inteligência artificial, toda a incerteza e tudo o mais… Parece que o mundo virou à esquerda para uma cidade maluca e ainda não voltou a mexer-se!», exclama o artista que lançou com Glen e Mark Tales from the Script: Greatest Hits, em 2021, e estava em estúdio quando falou com a LUZ. Mas, desta vez, sem Mark, pois o guitarrista faleceu aos apenas 46 anos em abril do ano passado. «Estamos a tentar experimentar: em vez de sermos uma banda de três elementos, passarmos para uma banda de quatro elementos. Hum, só para mudar a energia porque, sabes, desde que o Mark faleceu, hum, só estou a tentar perceber o que é e como podemos seguir em frente e para não falharmos. Não o podemos substituir porque isso é impossível, mas estamos a tentar fazer algo diferente e familiar ao mesmo tempo», continua o artista que, no dia 10 de maio, estará na Queima das Fitas do Porto com a banda. «Estamos a chegar ao Porto. Mal posso esperar! Tivemos sempre espectáculos fantásticos em Portugal. Só tenho pena de não vivermos aí porque podíamos dar mais concertos. Mas só podemos fazer uma certa quantidade de espectáculos por ano. Então estamos ansiosos para voltar e tocar nos festivais», diz com entusiasmo, referindo-se igualmente ao Mateus Fest, onde estará a 3 de agosto, em Viseu.