Portugal registou em 2023 um agravamento da ameaça ligada aos extremismos políticos, sobretudo de extrema-direita, com a retoma da atividade de organizações neonazis e identitárias. Extorsão, resistência e coação sobre funcionário, roubo por esticão, rapto, sequestro e roubo na via pública foram os crimes violentos e graves que mais subiram em no ano passado.
“No campo dos extremismos políticos, assistiu-se a um agravamento da ameaça representada por estes setores, sobretudo no âmbito da extrema-direita”, indica o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) entregue esta terça-feira na Assembleia da República.
Segundo o documento, elaborado pelo Sistema de Segurança Interna, após um período de estagnação, as organizações tradicionais e os militantes dos setores neonazi e identitário “retomaram a sua atividade, promovendo ações de rua e outras iniciativas com propósitos propagandísticos”.
Este crescimento da extrema-direita, nomeadamente entre as gerações mais jovens, deveu-se, em grande parte, ao “esforço desenvolvido na esfera virtual”, que constituiu o “principal veículo de disseminação de propaganda e motor de radicalização”, refere o RASI.
Este recurso aos meios digitais contribuiu, assim, para a proliferação das narrativas extremistas, que atingem um público mais alargado e diversificado. O meio virtual tem sido também o “principal viveiro dos `aceleracionistas´, radicalizados pela exposição à propaganda, pelo universo violento do `gaming´ ou até pelo contacto com militantes de outras geografias, alguns associados a células ou grupos de cariz terrorista”.
O ‘aceleracionismo’ é uma tendência associada à extrema-direita que defende uma “aceleração” do capitalismo e o caos para “derrubar” a ordem existente.
Extrema-esquerda
Já quanto à extrema-esquerda, o documento indica que também o movimento anarquista e autónomo retomou a atividade de rua em 2023, após um período de estagnação. O movimento associou-se a manifestações de massa em torno de causas transversais à sociedade portuguesa, como o direito à habitação ou a melhoria das condições de vida.
No entanto, estes movimentos imprimiram um “cunho ideológico anticapitalista”, recorrendo a atos de vandalismo e a provocações às forças de segurança que visavam “mobilizar os demais participantes para uma luta contra o sistema”.
À semelhança do que se verificou a nível internacional, foi no movimento ambientalista de matriz anticapitalista que se observou uma maior radicalização, através do recurso reiterado a ações ilegais e a atos de vandalismo, bem como de uma “tentativa de sabotagem de uma infraestrutura crítica”.
“A causa ambientalista continuou a revelar-se fundamental para o recrutamento de jovens para diferentes setores da extrema-esquerda”, realça o RASI.
Ainda que não tenham sido recolhidos indícios concretos sobre o planeamento de ataques terroristas, foram identificados “casos pontuais de apologia do Hamas e dos ataques contra Israel e, igualmente, reações hostis sobre a profanação do Corão”, adianta.
A atual conjuntura internacional “favorece o desenvolvimento de processos de radicalização com propensão para a violência, que poderão resultar na execução de ataques terroristas, não estando Portugal imune a este fenómeno”, alerta o documento.
Crimes violentos e graves
O Relatório Anual de Segurança Interna revela ainda que extorsão, resistência e coação sobre funcionário, roubo por esticão, rapto, sequestro e roubo na via pública foram os crimes violentos e graves que mais subiram em 2023.
O RASI relata que a criminalidade violenta e grave aumentou 5,6%, registando-se 14.022 crimes, mais 741 casos do que em 2022, o valor mais alto desde 2019.
Também a criminalidade geral aumentou 8,2% em 2023, tendo os oito Órgãos de Polícia Criminal (GNR, PSP, PJ, SEF, Polícia Marítima, ASAE, Autoridade Tributárias e Polícia Judiciária Militar) recebido 371.995 queixas, mais 28.150 participações que no período homólogo de 2022, o valor mais elevado desde 2014 (último registo do RASI).
No âmbito da criminalidade geral, a violência doméstica é o crime que continua a apresentar maiores índices de queixas.