Aeroporto – mão de ferro em luva de veludo

A negociação entre Governo/ANA vai pôr a nu erros do Relatório, colmatar insuficiências e esmiuçar duas lacunas estruturais

A Comissão Técnica Independente propõe ao Governo o Novo Aeroporto de Lisboa no Campo de Tiro da Força Aérea em Benavente, o que se sabia desde o início, e um ‘hub intercontinental’ irrealista. O Governo minoritário está fragilizado, mas, apoiado por grupo técnico competente, conhece o dossier e, com mão de ferro em luva de veludo, cria alternativa ao ‘hub’ da CTI em consenso político.

Como previsto na recente RCM n.º66/2004, o aeroporto realista para cerca de 50 milhões de passageiros desmonta o ‘hub intercontinental’ megalómano e ‘porta das Américas para a Europa’ que não existe. Segundo o contrato, a ANA apresenta proposta com racionalidade da gestão privada em alternativa ao alegado ‘pensar estratégico’ de CTI descolada da realidade, e à insanidade da resolução do contrato entre o Estado/ANA para construir o ‘hub intercontinental’. Obras a cargo da ANA criam mais 7 movimentos/hora e fazem do AHD o ‘aeroporto de transição’, anulando a barreira ao crescimento da procura e enterrando a proposta da CTI, elaborada à margem da relação Estado/ANA. Eliminam ainda a fantasia do aeroporto de duas pistas pronto em 2031 e a começar sem acessibilidade ferroviária.

Cooperação com ANA e apoio do grupo técnico colmatam insuficiências da CTI: i) Ignorância da segmentação do tráfego ponto a ponto das low cost e hub da TAP outras full service; ii) Ausência de consulta às companhias aéreas mais importantes; iii) Arrogância intelectual ao eliminar o modelo dual Portela + Montijo por ineficiente e inadequado, ignorando factos que o justificam; iv) Ligação ferroviária viável à Gare do Oriente.

A cooperação Governo/ANA tem de suprir duas lacunas que destroem o Relatório pela base. A CTI cultiva o ambientalismo radical que apenas considera «a relevância das questões ambientais e de saúde humana no aumento da capacidade aeroportuária na Região de Lisboa», eliminando assim o aeroporto do Montijo e encerrando o Humberto Delgado. Este ambientalismo radical tem de dar lugar a ‘sustentabilidade’ que compatibiliza exigências do Ambiente, da Sociedade e da Economia (Relatório Bruntland, 1987). Manter esta ótica redutora condena/dificulta grandes investimentos fundamentais para o país.

A segunda lacuna é mais grave. A CTI ignora o NAL implicar criação de núcleo urbano de cerca de 25.000 pessoas no descampado de Samora Correia. Este núcleo exige i) Ordenamento do Território, com urgentes Medidas Cautelares que limitem expansão dos perímetros urbanos existentes e criem vasto espaço para a nova urbanização; ii) Relacionar a nova urbe com o modelo da Cidade de Duas Margens e do Arco Ribeirinho Sul; iii) Regime excecional de Mais Valias Imobiliárias, que garanta a sua afetação ao financiamento de também excecionais infraestruturas públicas do Núcleo; iv) Planeamento Urbano e licenciamento de projetos em moldes equivalentes aos da Parque Expo; v) Equacionar desde já a enorme operação logística que a mudança AHD para NAL implica e seus custos para setor público e privado.

A negociação entre Governo/ANA vai pôr a nu erros do Relatório, colmatar insuficiências e esmiuçar duas lacunas estruturais. Neste contexto, não é de excluir revisão da decisão sobre o NAL e Benavente.

Os anos desperdiçados pela CTI serão caso de estudo no divórcio entre Universidade e Economia, na ocorrência IST e transporte aéreo