Nove meses depois de realizada em Lisboa a Jornada Mundial da Juventude, ficámos finalmente a saber que a iniciativa gerou lucros de 31.5 milhões de euro para a instituição, provocou um efeito induzido de um pouco mais de dez vezes esse valor na atividade económica, criou 10 mil postos de trabalho (presumo que temporários); e deixou 48 milhões em infraestruturas e equipamentos.
Não tendo tido acesso a qualquer outro dado que não fosse o montante dos proveitos e dos custos, incluindo despesas com pessoal, sabia-se, desde o início, que Lisboa terá sido das únicas capitais cuja autarquia suportou parte substancial do valor investido (nas anteriores, o financiamento terá sido privado); tendo, entretanto, lido que a Fundação JMJ se propõe aplicar o valor angariado no desenvolvimento de projetos de apoio a jovens, a implementar nos concelhos de Lisboa e Loures.
Aceitando que assim seja – vejamos de que projetos se tratará, quando serão executados e que benefícios gerarão – não creio que ficasse mal à FJMJ que devolvesse algum deste valor à autarquia lisboeta, permitindo-me sugerir que esse montante (e admito que sobrasse bastante!) fosse utilizado, por exemplo:
- Na recolocação das “coroas” que foram removidas, desde junho do ano transato, do topo das colunas no cimo do Parque Eduardo VII. O que poderá ser tão complexo que justifique esta demora de um ano ou será a ideia retirá-las de vez? Ou será que também desapareceram “apesar de não estarem perdidas” (lembram-se)?
- Na pintura da totalidade dos muros exteriores da Penitenciária de Lisboa e zonas adjacentes, intervencionados há não muitos anos pelos próprios reclusos, mas que foram perdendo a cor original (era amarelo, hoje é rosa). Contemplando o edifício, vemos pelo menos três cores diferentes, a maior parte desbotada e gasta. Por que não voltar a utilizar os reclusos, como então sucedeu?
- Na limpeza dos muros que circunscrevem os terrenos e edificações entre a Avenida Conselheiro Fernando de Sousa e as Ruas Marquês de Fronteira e Artilharia Um que, de tanto grafitados com obras de evidente mau gosto e sentido estético duvidoso, dão àquele espaço da capital um aspecto de terceiro mundo;
- Na reposição da relva que tem desaparecido de muitos jardins da capital e na limpeza dos matagais que vivem nas laterais da Avenida Calouste Gulbenkian; um dia Lisboa será lembrada como a cidade da relva amarela;
- Por que não, em iniciativa conjunta com o Metropolitano de Lisboa, retirarem os cacifos para armazenamento de bagagem e/ou as máquinas dispensadoras de bilhetes que estão a cobrir parte do trabalho de artistas como Júlio Pomar? Numa das estações, as ditas máquinas só deixam ver as cabeças de Fernando Pessoa e seus heterónimos…;
- Por que não na limpeza, gradual e progressiva, da estatuária de Lisboa, imensamente afetada pela poluição automóvel e aérea e, de quando em vez, por “intervenções” grafitadas de “artistas incompreendidos”?
Ou será que, para mantermos a cidade como ela merece, teremos que fazer como a Carris, que colocou vigilância junto dos Ascensores da Glória para evitar que os dois veículos fossem repetidamente vandalizados, dando àquela parte tão emblemática da cidade um aspecto de degradação de que ninguém se pode orgulhar?
- Finalmente, volto a um tema que me é caro e envergonha qualquer lisboeta. A impossibilidade de circulação de cidadãos com mobilidade reduzida, ou condicionada de alguma forma, pelos passeios da nossa cidade, devido aos inúmeros buracos na calçada, à ondulação dos ditos passeios causada pelas raízes de algumas árvores, aos automóveis estacionados em cima deles, aos pinos que algumas mentes brilhantes resolveram neles colocar para impedir o estacionamento mas que inviabilizam a passagem de uma cadeira de rodas ou um carrinho de bebé? Que tal investir na criação de acessos especiais para estas pessoas nas mais variadas repartições de atendimento ao público? Ninguém, mesmo ninguém, fruto da sua limitação física, deveria passar por este tormento sempre que precisa de sair de casa!
Caminhem pela cidade, senhores dos gabinetes. E ajam em conformidade!