Nas europeias perderam… todos!

Comparar o contexto de 2019 com o de 2024 é ignorar alterações sociológicas substanciais que, em política, mudam tudo.

As eleições europeias do passado dia 9 de junho deixaram quase tudo na mesma, sendo que o quase é o diabo, que está sempre nos detalhes.

Como ponto prévio, permitam-me discordar da linha de análise que compara uma eleição europeia com outra eleição europeia.

Qualquer eleição tem uma base estrutural e uma outra conjuntural. Comparar o contexto de 2019 com o de 2024 é ignorar alterações sociológicas substanciais que, em política, mudam tudo. Em 2019 o Chega e a IL eram novidades no rearranjo do campo político do centro-direita/direita. Ambos resultaram de um PSD que encostou muito à direita no tempo da troika, libertando alguns grupos que sempre estiveram no partido. Quando Rui Rio quis recentrar, ‘os demónios não quiseram ser novamente aprisionados’.

Paralelamente, a subida da abstenção, entre as últimas legislativas e as europeias, impede que as análises sejam tão certeiras quando devem ser.

Olhemos, pois, os factos.

O PS ganhou a uma coligação o que é de assinalar (curiosamente Pedro Nuno Santos não o referiu), mas o seu campo de alianças é minoritário, o que impede aventuras de novas eleições – até porque CDU e BE ainda estão na agonia pós-’geringonça’. De certo modo, o trabalho de travessia do deserto do líder do PS sai favorecido, permite-lhe reorganizar o partido e fazer o seu programa. A escolha da candidata foi positiva. Falta densidade a Marta Temido, mas existe experiência e empatia com o Povo.

A AD apostou num candidato jovem, sem experiência ou passado político, arriscando na sua popularidade de comentador. Se a aposta era vencer pelo efeito novidade, saiu furada. Sebastião Bugalho não acrescentou nada. Pior, a campanha revelou uma impreparação e uma ignorância confrangedoras, em temas essenciais para os próximos anos da política europeia. Supostamente, os candidatos são escolhidos pelo seu pensamento, passado ou substância, é sobre a base que se deve construir a imagem do candidato. Apostar em alguém que tem popularidade sem base é um risco. A AD correu o risco e perdeu. Perdeu as eleições com um governo em estado de graça, seja pela novidade, seja pela eficiência governativa que tem revelado – o que apenas acresce na dimensão do erro que foi a escolha deste cabeça de lista.

O Chega tomou um banho de água gelada. Ventura escolheu um embaixador, de modo a dar credibilidade ao seu partido. Escolheu mal: Portugal não tem 20% de radicais e o eleitorado não vê no seu partido uma alternativa credível, apenas um megafone para as suas dores.

A IL teve o melhor e mais credível candidato. Continua, porém, a ser um fenómeno urbano e do litoral. Do seu crescimento resulta a possibilidade de, numa próxima eleição, poder associar-se à AD no Governo, oferecendo uma alternativa mais estável.

A CDU, o BE e o Livre estão em agonia. Os primeiros perderam deputados europeus, votos e percentagem de votos. O último teve um cabeça de lista que começou bem, mas teve pouco ou nenhum apoio da liderança do partido. Rui Tavares continua igual a si mesmo: teve problemas quando foi eleito pelo BE para o Parlamento europeu, teve problemas com Joacine Katar Moreira e teve problemas com o candidato do Livre que não queria. Tavares parece viver no ‘me, me, me: quando não sou eu, tenho problemas’!

Depois das europeias fica uma certeza: não há certezas! Mais do que nunca, os votos não são de ninguém. A base eleitoral dos partidos tradicionais está cada vez mais estreita e os novos partidos não têm ‘ligação à terra’.

A volatilidade do espaço político português pede, cada vez mais, novas soluções.