Quem te avisa…

A IL e o Chega tiveram nas europeias resultados opostos, mostrando que o Chega teve um mau candidato e tem seguido a estratégia errada, enquanto a IL apresentou um bom candidato e tem feito o caminho certo.

Quando o Chega chumbou a eleição de Aguiar-Branco para presidente da Assembleia da República, escrevi um texto ilustrado com uma foto de André Ventura que se chamava Suicídio em direto.                                      Muitos leitores escreveram-me indignados.                                                         Que André Ventura tinha feito muito bem; que o PSD é que obstaculizara um acordo, com a sua teimosia do ‘Não é não’; que o Chega deveria manter a mesma atitude e não ser ‘muleta do Governo’.

Estas eleições mostraram onde estava a verdade.

O Chega foi o partido mais penalizado nas europeias.

Dir-se-á que isso resultou da má qualidade do candidato.

Para quem quer meter a cabeça na areia, a explicação serve.

Mas não chega.

O resultado de umas eleições tem que ver com duas coisas, não sendo possível dizer qual delas pesa mais: com a imagem do partido e com o candidato.

Assim, o resultado do Chega terá com certeza que ver com António Tânger — mas também com o caminho que o Chega tem seguido desde as legislativas.

Quando se pensava, depois de 10 de Março, que poderia contribuir para a maioria de direita que passara a existir no Parlamento, o Chega tornou-se uma força de bloqueio e votou quase sempre ao lado da esquerda.

Tornou-se um partido essencialmente destruidor de qualquer hipótese de governação; e se isso era compreensível quando existia uma maioria socialista, deixou de se perceber quando passou a existir um Governo de centro-direita.

Um partido não pode passar a vida a destruir – e o Chega tem passado a vida a destruir.

Os eleitores não gostam.

O grande desafio do Chega nesta legislatura era dar uma imagem positiva, responsável, credibilizando-se, até para começar a atrair outro tipo de pessoas (o candidato às europeias foi o espelho do tipo de gente que o Chega atrai).

Ora, o partido de Ventura tem dado a imagem oposta, desiludindo muita gente da direita democrática que nele votara na presunção de que assim contribuiria para reforçar a direita – e não para a enfraquecer, como aconteceu.

Julgo que André Ventura se deslumbrou com os 50 deputados que obteve em 10 de Março e entrou em competição direta com o PSD, achando que de eleição para eleição o Chega iria crescendo, até o ultrapassar.

Pode ser que o resultado de domingo faça Ventura regressar à realidade.

Note-se que com a IL passou-se exatamente o oposto.

Enquanto o Chega teve um mau candidato e tem seguido a estratégia errada, a IL teve um bom candidato e tem feito o caminho certo — não se juntando à esquerda para derrotar o Governo, apoiando-o em muitas medidas, e mostrando uma atitude construtiva e responsável.

No Chega aliaram-se os fatores negativos, na IL os positivos.

E isso explica os resultados de ambos.

Este foi o facto mais relevante das eleições europeias, no plano interno.                                 Quanto ao resto, elas não alteraram em nada o quadro político que existia.                                                                O PS ganhou, mas teve uma vitória de Pirro.

Apresentando uma lista de pesos-pesados — Marta Temido, Francisco Assis e Ana Catarina Mendes, quase sempre com o reforço de Pedro Nuno Santos –, fez uma campanha sem grande brilho e não conseguiu a desforra retumbante com que alguns socialistas sonhariam.

E não capitalizou a queda dos partidos à sua esquerda.

A propósito destes, é significativo do estado pré-comatoso em que o BE e o PCP se encontram a festa que fizeram depois de perderem um deputado cada, mostrando que estavam em pânico com a perspetiva de não conseguirem eleger ninguém.

Quanto à AD, diga-se que correu um risco enorme, ao apresentar um cabeça de lista sem experiência política, muitíssimo novo, que poderia desmoronar-se numa campanha em que tinha pela frente vários tubarões.

Ora isso não aconteceu, de todo.

A AD perdeu mas aguentou-se bem, até considerando que tem dois partidos à sua direita que fazem mossa.

Pode dizer-se que Sebastião Bugalho iniciou a sua carreira política ao mais alto nível com uma derrota… saborosa.

De referir ainda a vitória global da direita sobre a esquerda na Europa e a ascensão da extrema-direita em quase todos os Estados, mostrando que se trata de um fenómeno  consolidado e não de um epifenómeno.                                     O retumbante sucesso de Marine Le Pen em França – que arrastou a dissolução do Parlamento –, o 2.º lugar da extrema-direita na Alemanha, e o reforço de Meloni em Itália constituíram avisos para os quais venho a alertar há largo tempo: a política de portas escancaradas da Europa em relação aos imigrantes promoveria necessariamente a ascensão de partidos radicais.

Os líderes europeus não o perceberam, não o quiseram perceber ou não tiveram  coragem para agir.

E hoje, na Europa, o vento mudou.

A ventania de esquerda de há dez anos transformou-se num vento constante de direita… com rajadas de extrema-direita.